Ventos de outono se anunciando

A temperatura melhorou bastante, o outono começa a colocar o nariz na porta, tentando entrar. Por mim, que seja bem vindo!

Do Rio, tive excelentes notícias da parte do meu pai. Resulta que a obstrução era nada além de pedras renais, uma bobagem que ia fazendo seu estrago. Nosso maior medo é que fosse um ou mais tumores, porque nem quero dizer o que isso significaria. Mas não era, e isso é o que importa. A parte chata é que precisou abrir um corte de uns 15 cm e ele ainda está bem dolorido. O fato é que já está em casa e dor é coisa que dá e passa.

Sendo assim, fiquei mais tranquila para ir tocando a vida.

Na sexta-feira, fomos jantar com um casal de amigos que morou aqui em Madrid no ano em que chegamos. Só para variar um pouquinho, fomos no Trifón, é claro! Preciso voltar lá de vez em quando, para confirmar que o mundo segue em seu lugar. Chutamos o pau da barraca com uma garrafa de Calvario e outra de Mauro, reserva especial. Como aperitivo de fim de noite, ganhei uma dose cavalar de Blue Label!

Na sequência, fomos ao El Junco, onde fazia séculos que não íamos em função da cigarrada a ser aspirada. Mas foi legal voltar lá, íamos muito com esses amigos por alí e não foi nada mal relembrar os velhos tempos. Depois resolvemos fazer um pouco da via crucis, de bar em bar, começando pelo Kabocla. O plano era voltar pela Calle Espiritu Santo, parando um pouco nos inferninhos, o que sempre me soa meio contraditório.

O caso é que assim que entramos no Kabocla, encontramos um amigo para lá de Marrakesh e super emotivo, porque acabava de descobrir que o pai faleceu. Putz, foi um baque! Fiquei muito triste por ele e ao mesmo tempo me tocou fundo o pensamento que poderia estar na mesma situação.

O casal de amigos que estávamos resolveu ir embora, já estavam um pouco cansados e obviamente a gente não prosseguiria na noite. Ficamos um pouco mais para dar uma força para esse amigo e logo voltamos para casa.

No sábado, o programa dos amigos era ir ao Patio Maravillas, lugar que vale uma explicação. Aqui há um movimento dos Okupas, que são pessoas que invadem locais desocupados para viver. Mais ou menos como uns sem-terra urbanos, só que não vinculados a um partido político. Normalmente, as invasões são realizadas com o único propósito de moradia e por gente em condições muito precárias. Mas em determinado momento, houve um grupo mais organizado e preparado que acabou transformando o prédio ocupado em um tipo de espaço cultural alternativo auto gestionado. Assim que nesse prédio invadido, encontramos cursos de yoga, classes de idioma ou de dança, ensaios musicais, palestras e uma série de outras atividades.

Eventualmente, também promovem algumas festas. Foi o caso desse último sábado, quando um DJ conhecido nosso estava promovendo uma festa brazuca, um projeto chamado Radio Banana. A entrada foi gratuita e só se pagava o que se consumisse no local. Não que alguém se importasse que você levasse sua própria bebida, tudo muito democrático e civilizado.

Acho que são uns quatro andares, abertos, com aquela cara de obra inacabada. O espaço para a festa foi logo no primeiro andar, um salão de pé direito alto, umas colunas de ferro e vários sofás e cadeiras que, provavelmente, foram recolhidos da rua. Até o banheiro estava funcionando e me pareceu surpreendentemente limpo, o único inconveniente é que era melhor ir acompanhada, pois no local das portas, havia cortinas de plástico.

Resumindo, gostei. É bem perto de casa e devo voltar lá outras vezes. Engraçado que tive a preocupação de sair bem documentada, afinal a polícia anda dando uma dura danada na busca de imigrantes ilegais. Diz a lenda que inclusive tem uma cota de pessoas para pegar por dia, meio sinistro, né? Pensei logo, uma festa de brazucas em um prédio invadido… claro que a polícia vai aparecer por lá. Mas não apareceu, foi tudo bastante normal. Aliás, a maioria nem era de brasileiros.

Infelizmente, outra notícia triste, o pai de mais um amigo também havia falecido. Inacreditável! Fiquei meio comovida, por razões evidentes.

No domingo, nem quis saber de rua. Tinha feito um molho a bolognesa durante a semana, daqueles que ficam horas cozinhando. Na verdade, fiz exatamente no dia que meu pai operou. Não queria sair de casa para ter notícias e acabei caçando coisas para fazer que me tomassem tempo. Ficou saboroso, mas um pouco salgado. Não tem jeito, se não estiver totalmente bem, salgo a comida, é impressionante! Ainda assim, uma amiga trouxe uma pasta fresca deliciosa e ficou para almoçar.

Acabou passando a tarde aqui em casa, acho que não estava com vontade de voltar para a dela. Então, também acabou me ajudando a dar uma limpa no quarto de hóspedes.

Desde que nos mudamos, entulhei o tal quarto com uma série de trabalhos antigos. Não tinha onde colocá-los, mas me dava pena desaparecer com eles. Cheguei a conclusão que precisava abrir espaço para o novo entrar, quando a gente se apega muito ao passado, é difícil chegar a criatividade. E assim foi, alguma coisa essa mesma amiga levou e o resto, desmontei e me desfiz.

Toda primeira terça-feira do mês, a prefeitura promove um tipo de bota fora de móveis ou trastes que você queira se desfazer e não sabe onde. Por exemplo, como você faz para jogar fora um sofá? É mais complicado que parece. Então, nesse dia, a gente faz uma limpa em casa e coloca as coisas na porta. Sempre tem uma galera que passa procurando alguma coisa que precise, algumas furgonetas que recolhem aparelhos elétrico-eletrônicos em qualquer condição ou metais que possam ser derretidos, roupas, enfim, tem de tudo. No início da madrugada, passa um caminhão da prefeitura recolhendo o que sobrou. Acho uma iniciativa bem bacana e ninguém tem vergonha de pegar as coisas que precisa na rua.

Enfim, essa terça-feira foi hoje e era o pretexto que tinha para me livrar do que estava ocupando tanto espaço em casa. Espero que desocupe espaço na minha cabeça também e deixe entrar idéias novas, frescas e melhores.

Agora comecei a escrever um livro, um projeto que venho matutando há um bom tempo, mas não me sentia preparada para escrever uma ficção. Honestamente, não sei se estou pronta, mas resolvi tentar assim mesmo e ver o que acontece. Tem sido complicado eleger uma fórmula, primeiro tentei narrar como espectadora, mas não gostei muito do resultado. Resolvi incorporar uma das personagens e redigir na primeira pessoa, como estou mais acostumada a escrever. Achei bem mais interessante, mas é bizarro ao mesmo tempo, porque não é uma biografia e a personagem que encarnei não corresponde a minha realidade. É estranho entrar em outra pele e ter que pensar e sentir como se fosse outra pessoa. Vamos ver no que dá.

Na segunda-feira, ontem, foi aniversário do Luiz. Portanto, essa semana, cozinho para um batalhão! No próximo sábado será a sua famosa feijoada. Temos menos convidados do que o ano passado, não porque queremos, mas é que o apartamento é bem menor. Não caberia todo mundo, uma pena. De qualquer forma, acho que será animado, sempre é. Eu gosto dessa confusão, mesmo me dando um trabalho danado. Além do mais, temos muitas razões para comemorar.

Final de verão em Madri

Não lembro se aterrizamos na quarta ou na quinta-feira, mas já na sexta, marcamos de sair com os amigos que estavam pela cidade. Por ainda ser agosto, Madri estava vazia e tranquila, gosto assim também, tem suas vantagens. O problema é que é um calor do cão e deixa todo mundo muito preguiçoso.

Demos sorte e na sexta a temperatura estava mais amena. Conseguimos sentar ao ar livre sem grandes problemas, só tivemos que chegar cedo ao local. Bom para por o papo em dia.

Por um momento, achei que poderia ter esquecido o espanhol, considerando que me desligo radicalmente, mas logo voltou. Uma coisa engraçada, porque chegou um ponto que achei haver estacionado no castelhano e que nunca perderei o jeito de gringa. O que é em parte verdade. Mas agora no Rio, ouvindo o portunhol da galera, percebi que já não falo assim. Não que reclame deles, de certa forma, acho bacana esse atrevimento de não saber falar bem, mas não se intimidar e mandar na lata aquele idioma koisistrana. É divirtido escutar.

Não sei se já contei por aqui, mas o ano na espanha começa em setembro e não em janeiro. Porque agosto, o auge do verão, quase tudo e todos entram em férias. Esse ano foi um pouco atípico em função da famosa crise, mesmo assim, ainda é significativo. Então, todos os cursos, aulas e afins iniciam em setembro.

Gosto de ter dois inícios de ano, porque até inconscientemente força a gente a fazer novos planos, rever prioridades e reiniciar ciclos.

Dentro desse contexto, conseguimos fazer nosso primeiro encontro de Lulus do ano! Estava encantado e nem me lembro mais há quanto tempo tentamos fazer um e não conseguimos compatibilizar as agendas. É sempre legal conversar com a mulherada, compartilhar um pouco as emoções. Depois a gente sempre termina se acabando de rir e exorcizando os problemas às gargalhadas.

Já teve aniversário de amiga… já teve via crucis de bar em bar… já teve show de brazucas… e la nave va...

Os restaurantes que gostamos começam a abrir essa semana. Sim, os restaurantes também fecham em agosto! Achei até bom porque precisava segurar a boca um pouco, a gente sempre se passa um pouco no Brasil.

Essa semana entrou uma frente fria, na minha opinião excelente! A temperatura caiu para um nível humano e trouxe bons ventos!

Porque ontem tivemos duas grandes notícias, a primeira delas chegou para mim, meu amigo francês me ligou, acho que conseguirei um estágio em Paris para catering, o que seria fenomenal! Deve ser por novembro ou dezembro, então não quero comemorar muito até se concretizar, mas é um plano e dos bons!

A segunda notícia foi bombástica e chegou minutos depois! A cidadania espanhola do Luiz acaba de ser aprovada! Ainda rola uma burocracia, mas agora sabemos que a resposta é sim! Quanto a minha, ainda está em estudo. Geralmente, minhas respostas saem depois das dele o que me deixa em expectativa e dependência constantes, mas tudo bem, uma coisa de cada vez e começamos por bom caminho.

Hoje, meu pai opera no Rio, a tal da obstrução no ureter. A cirurgia é daqui a pouco e espero ter em breve mais notícias para comemorar. Pulei da cama cedo, como se adiantasse. O Rio está cinco horas atrás e só vou ter alguma informação mais tarde. Mas quem disse que dava para parar de quicar? Enfim, vamos aguardar e esperar que a boa maré permaneça!

Ainda em São Paulo

Passada a exposição, relaxei um pouco com a sensação de missão cumprida. Bom, digo que relaxei, mas não descansei, porque a agenda ainda era longa.

Na sexta-feira, chegou um casal de amigos do Rio e uma amiga de Florianópolis. Então, decidi fazer no sábado pela manhã, outro mini vernissage para quem não conseguiu ir na quarta-feira anterior. Foi também uma amiga de Brasília, mas essa conseguiu ir no dia da inauguração oficial. Muita honra, né?

De maneiras que, no sábado, ainda houve um gostinho a mais de exposição. Foi legal porque além dos amigos de fora de São Paulo, havia os que tinham filhos e era complicado sair à noite, os que ficaram presos no trabalho até mais tarde, enfim, acabou indo mais gente do que imaginava. De lá, almoçamos com alguns amigos na rua da galeria mesmo e seguimos para casa, com nossa amiga de Floripa na tentativa de descansar um pouco antes da noite chegar. Claro que não descansei nada, mas tudo bem, pelo menos conversamos mais um pouco.

Porque no sábado à noite, os amigos paulistas organizaram uma festa para a gente encontrar todo mundo. Sempre é mais legal uma reunião em casa, a gente fica mais à vontade e mesmo que não seja muito tempo, dá para matar um pouco da saudade.

Foi o máximo! Mas para ser sincera, estava um pouco nostálgica. É bacana ver as pessoas bem, seguindo suas vidas, mas em paralelo também dá um pouco a sensação de perda por não estar tão próxima. Sei que não perdi nada, ganhei outras coisas, mas acho que sempre será assim.

Disse tchau, mas não me despedi de ninguém. Não quero mais me despedir de ninguém!

A partir de domingo, tirei o pé um pouco do acelerador, porque Luiz estava exausto e querendo férias das férias. Tudo bem, vai, havíamos encontrado a maioria das pessoas pelo menos uma vez.

E quem não encontramos, paciência! Todos os dias anunciei onde estaríamos para quem pudesse se programar. Fazemos o maior esforço para atravessar o oceano e neguinho não arruma um diazinho que possa sair um pouco mais cedo do trabalho, ou sábado que não precisaria de babá… ou a desculpa que seja, fazer o que? Fatalidades acontecem e entendo, mas fora isso, quem quis nos encontrar, achou tempo, a gente fez o possível!

O período em que estivemos na cidade, tentei viver como se morasse lá novamente. Não temos planos de sair da Espanha, mas tantos amigos e conhecidos voltaram para o Brasil nos últimos meses que é difícil não pensar no tema. E foi estranho olhar a cidade assim.

Achei São Paulo enorme outra vez! Lembro que quando mudei para lá, as distâncias me impressionavam, não cabia tudo na minha cabeça. Logo fui me acostumando até achar normal, inclusive as duas horas diárias dispensadas em engarrafamentos. Agora achei o trânsito ainda pior e tudo parecia tão longe! E para lembrar dos caminhos? Luiz e eu fazíamos uma força danada! E olha que circulávamos muito, mas muito bem pela cidade. Foi frustrante, outra vez a sensação de perda. Tudo bem, não é tão grave, só esquisito. A memória foi voltando gradualmente e, ao final de uma semana, não me sentia tão estrangeira.

Há uma coisa que acredito que estranharia muito se voltasse, que é esse negócio de só andar de carro. Enquanto não conhecia outra alternativa, não sentia falta, mas agora que faço tudo caminhando, seria muito difícil abrir mão da liberdade que os pés te trazem.

Mas enfim, também não tem porque me encucar muito com isso. Como disse, não temos planos de sair da Espanha agora.

No dia 17 de agosto, pegamos o avião de volta para casa. Bom vôo, chegamos bem. Tudo no lugar, sem faltar nenhum pedaço. Cheguei a esquecer o nome da minha rua, putz!

A cabeça é sempre a primeira a viajar e a última a voltar, mas uma hora volta. Já voltou.

Ajuda encontrar um felino gordo e carinhoso, morrendo de saudades! Quem acha que gato não liga para gente, conhece muito pouco dos bichanos. Jack estava bem, não perdeu peso nem parecia estressado, mas me seguiu a primeira semana inteira até para ir ao banheiro! Pelo sim e pelo não, resolvi dar equinácea todos os dias para ele, misturada a um patê de gatos que ele ama, assim aumentamos a resistência do nosso velhinho que fará seus onze anos em breve.

Entramos rápido na vida madrileña, mas isso conto na próxima vez!

Chegando em São Paulo…

Nosso sobrinho foi nos buscar no areroporto. Ficamos na casa da minha cunhada e foi bom e estranho ao mesmo tempo. Porque moramos um ano nessa casa, antes dela reformá-la e mudar para lá. A reforma que ela fez foi bacana, o lugar era o mesmo e se reconhecia nitidamente, mas detalhes como uma parede, uma janela aberta e a dinâmica própria que imprimimos nos nossos lares, fazem parecer contraditoriamente tudo muito diferente, como se fosse outra casa.

Assim como homens se confundem com seus trabalhos, mulheres se mesclam com suas casas, como se casa e corpo fossem parte de uma coisa só.

E o tempo inteiro que estive na cidade essa sensação me acompanhou, um deslocamento de tempo e espaço malucos, como se nunca tivesse saído, tudo se parecia à rotina e, em paralelo, tudo tão diferente. Voltar a uma cidade como outra pessoa, faz a cidade também parecer outra.

Viajei me enganando e buscando o alívio de alguns momentos em que estaria tudo as mil maravilhas, perfeito! Fazendo de conta que não sei que a vida é sempre parte boa e parte ruim, e tudo ao mesmo tempo. Eu tenho problemas, minha família tem problemas e amigos tinham problemas, porque a vida perfeita não existe. A diferença é que já fui menos cética e mais otimista, e isso me faz falta de vez em quando.

No Rio, fomos a um show do Arranco de Varsóvia, uma amiga do Luiz faz parte desse grupo, por sinal, muito bom. O repertório é do Martinho da Vila, que já gostava, mas prestei mais atenção nas letras e fiquei fã. Voltando à apresentação, o Arranco fez um arranjo muito feliz com as músicas: Casa de Bamba e Canta, Canta Minha Gente. Foi a música que me acompanhou o resto da viagem, como um mantra de otimismo.

… na minha casa todo mundo é bamba, todo mundo bebe, todo mundo samba… na minha casa ninguém liga pra intriga, todo mundo xinga, todo mundo briga… se tem alguém aflito, todo mundo chora, todo mundo sofre… mas se tem alguém cantando, todo mundo canta, todo mundo dança, todo mundo samba e ninguém se cansa, pois a minha casa é casa de bamba… canta, canta, minha gente, deixa tristeza pra lá, canta forte, canta alto, que a vida vai melhorar… 

E, às vezes, a gente tem que apostar que vai dar certo ou não faz nada nunca!

Com essa exposição foi assim, não foi a primeira vez que era chamada a expor nessa galeria, acontece que esse negócio de fazer uma produção inteira em outro país, me parecia bastante complicado. Houve uma hora em que vi um mínimo de possibilidade e resolvi que ia fazer e pronto, porque se a gente pensa muito no que pode dar errado, em quanto custa, na trabalheira… ficamos paralizados! Quanto ao Luiz, sabia que me apoiaria no que desse, somos um time muito bom. Então, vamos nessa, precisa dar certo!

E deu, deu tudo certo. Claro que houve os bastidores de suspense, trabalho, problemas, mas isso é assim mesmo, se funciona no final, deu certo.

Entre o dia 8, o domingo que cheguei, até dia 11 de agosto, quando foi o vernissage, fiquei só por conta disso, com Luiz devidamente recrutado a me ajudar. Acabamos a montagem na terça-feira, pelas dez e pouco da noite, assim podia ficar tranquila no dia da inauguração.

Pausa feminina: obviamente na quarta-feira pela manhã, a primeira coisa que fiz foi ligar para minha cabelereira favorita e achar um horário para ela me atender! O que pode dar errado na vida se nosso cabelo estiver perfeito? Praticamente nada! Foi ela quem lembrou de me perguntar se também queria fazer as unhas. Putz! Claro, como pude me esquecer disso? Sim, mão e pé (ainda que o sapato fosse fechado). Fundamental: roupa que emagreça, pareça elegante e alternativa ao mesmo tempo, como que me empenhei em estar bem arrumada, mas não me preocupo tanto assim com a opinião alheia. Maquiagem que dá um trabalho do cão para parecer o mais natural possível, que você acorda assim de manhã, sem nem uma olheira nem manchinhas na pele, só deu uma pintadinha básica nos olhos. Beleza, autoestima revigorada, tô pronta!

Brincadeiras a parte, é difícil explicar a sensação que bate, é uma ansiedade que te deixa eufórica e em pânico ao mesmo tempo. Expor-se é sempre um exercício e tanto, porque é um risco, nunca deixará de ser. Mas é absolutamente viciante a adrenalina gostosa que antecede a chegada na galeria e ver que o resultado me agrada, de chegar o primeiro convidado, de ver o primeiro rosto conhecido, de saber que algum trabalho vendeu e vai para a casa de alguém e outras pessoas verão, de ver gente que nunca conheci e compartilhar um pouco de mim agora através de uma peça. É assim desde a primeira vez que expus. E é por esses momentos que posso acreditar que a vida vai melhorar.

Acho que até fisicamente eu mudo! A pele parece que fica diferente, sei lá, felicidade exala, alegra os generosos e quem te quer bem. Pena que esses momentos voam e passam como em cinco minutos, mas tudo bem, vale a pena. Sorte a nossa de ter a memória e o registro para usar como munição nos tempos mais difíceis.

Houve a época em que acreditei que podia tudo e tenho uma eterna nostalgia por essa sensação, porque a vida só podia melhorar, não havia outra alternativa. Agora sei que as notícias ruins chegarão, é só uma questão de tempo. Na verdade, nem há essa sequência de coisas boas e ruins, é tudo misturado, predominando um ou outro lado da balança. Em compensação, também aprendi a tomar até a última gota do que é bom, para não ficar com tanta sede quando a seca chegar. No saldo de coisas positivas e negativas, no fundo, ainda acho que a vida vai melhorar.

 

PS: Pessoal, na medida do possível, tentei preservar o rosto das pessoas, mas se alguém se incomodar em aparecer, me avise que retiro a foto, ok?

E para quem quiser conhecer a versão do Arranco de Varsóvia das músicas do Martinho da Vila, segue o link Canta Canta de Arranco de Varsóvia.

Fim de férias

E cá estamos novamente! Tem tanto tempo que não escrevo que custa pegar o jeito! Após quase um mês no Brasil, está difícil pegar no tranco. Não digo que estivesse sem internet, mas considerando a frequência com que a utilizo normalmente, estive radicalmente menos conectada. Escrever toma tempo e viver também, nesse caso, escrever poderia ficar para depois. O que é muito mais difícil, porque se perdem os detalhes… e o diabo mora nos detalhes.

Não é apenas uma questão de tempo, é também uma opção por canais de comunicação diferentes. Duas das minhas maneiras de expressão mais importantes são a escrita e a arte, e como já anunciado anteriormente, nos últimos dois ou três meses, priorizei a arte. E sempre é bom lembrar quem somos em essência, ainda que nunca sejamos uma coisa só.

Mas enfim, como é que foi no Brasil? Vou tentar me liberar da ordem cronológica das coisas e me concentrar no que me importava fazer, apoiar a família, realizar uma exposição e rever os amigos. De quebra vieram mais um monte de coisas, mas sempre giraram em torno desses pontos.

A origem da minha ida agora foi a exposição. Claro que iria de qualquer maneira, mas a data teve esse motivo. Porque ir só pela exposição me custaria muito caro, já que o transporte é por minha conta. Portanto, precisava conciliar tudo ao mesmo tempo, o que exige uma certa logística.

Quem acompanhou a saga ainda não terminada em relação à saúde do meu pai, sabe que houve um período em que fui ao Rio quase que de três em três meses, o que não é mole, psicológico nem financeiramente. Esse último ano, com um ou outro susto, sua situação esteve mais estável, e me deu a chance de conseguir me planejar. Bom, na medida do possível que é me planejar, né? Mas o que importa é que funcionou.

No dia 21 de julho, embarquei com uma exposição inteira na mala! Luiz me encontraria no Rio, uma semana depois. Passado o suspense da bagagem chegar, passar pela alfândega e tal, a verdade é que deu tudo certo. Chegaram sem um arranhão os 50 trabalhos emoldurados, 2 esculturas de acrílico e 200 pêndulos de vidro para uma instalação; tudo isso em 3 malas, uma delas negociada com a companhia para não pagar excesso de bagagem.

Fiz escala em São Paulo, onde fica a Galeria, deixei tudo direitinho por lá, resolvi as últimas pendências do vernissage, encontrei a família paulista e, logo no dia seguinte pela manhã, embarquei para o Rio.

É o ideal chegar pelo menos uma semana antes do Luiz, assim tenho um pouco mais de tempo para dar atenção à família e resolver pepinos de médicos ou documentação. Quando Luiz chega, além disso, também quero rever os amigos, ir nos restaurantes favoritos etc etc… e daí já viu, não paro um minuto, juro! Ele reclama um pouco que não dou trégua, mas entende que não tem outro jeito. Depois, quem mandou casar com uma imparável? Até tento segurar um pouco a onda, ou fazer alguma coisa enquanto ele descansa, mas mesmo assim, reconheço que para os seres humanos razoavelmente normais, o pique é meio pauleira!

Capítulo médicos pessoais: fiz check up e fui no mastologista, já que a recomendação espanhola é cultivar cistos e comer muita tortilla para evitar um câncer. A primeira mamografia aqui é recomendada após os 50 anos! Não estou inventando, li isso em um centro de saúde pública! Bom, resumo da ópera, tirei mais 3 cistos para minha coleção, o que dá um total de 8 retirados. Fora a delícia que é cada punção, tudo certo, mas não posso dar mole, porque aparentemente será assim até a menopausa.

Capítulo médico paterno: acompanhei uma consulta do meu pai no seu clínico geral, onde ele dizia que estava perfeito, não sentia nada demais, só uma tossezinha chata que ele queria saber o que podia tomar (porque se dependesse dele, ele se auto medicaria, mas a gente não deixou). Pois é, depois do exame, verificou-se que ele estava com uma pneumonia básica! Agora já está bom da pneumonia, mas o quadro geral é o seguinte, ele está no meio de um tratamento para dissolver um coágulo no pulmão, isso é feito com um anticoagulante pesado, chamado Marevan (eu acho que o nome é esse). Por isso, teve que interromper o tratamento do câncer de bexiga, porque a sonda poderia provocar uma hemorragia. No caminho, descobriu que está com uma obstrução no ureter, o que pode ser algo simples ou outro tumor. Não pode deixar isso assim até acabar o tratamento do coágulo do pulmão, porque um dos rins, o que esse canal obstruído alcança, já diminuiu de tamanho e ele não pode correr o risco de perdê-lo, afinal, toma muita medicação e isso sacrifica os rins. Muito bem, então o que se faz é o seguinte, agora que ele ficou bom da pneumonia, vai parar de tomar o Marevan (que tem larga duração no organismo) e tomar injeções de anticoagulante com duração de 24 horas. Nas vésperas da cirurgia do ureter, ele para de tomar a tal injeção e só volta quando estiver tudo cicatrizado, o que deve ser entre uma e duas semanas. De momento, também apareceu um tal de derrame na pleura (taquiupariu!), mas segundo o médico, isso não é tão grave e está administrado. Ele deve fazer a tal da intervenção no ureter pelo dia 2 ou 3 de setembro. Apesar desse parágrafo imenso, ele aparenta estar bem, juro! Vai ao clube todos os dias, que é logo em frente… faz a feira duas vezes na semana e compra comida para todo um batalhão; parte dessa comida vai para o lixo, parte está tornando sofisticadíssimo o paladar da faxineira e sua filha, afinal elas agora não sabem mais viver sem comer salmão semanalmente… joga na internet e reclama o tempo inteirinho… assiste todos os jornais com as mesmas notícias a todo volume… o de sempre. Daí, quando meus amigos me perguntam como vai meu pai, me dá uma preguiça danada de explicar tudo isso e resumo, ele não está bom, mas está bem!

Compramos um apartamento pequeno, em sociedade com meu irmão, perto da casa dos meus pais. Um sala e quarto bem jeitozinho que meus pais reformaram e, quando viu o resultado final, meu irmão mesmo se animou a ir morar lá. Achei bom, porque pelo menos é um apoio próximo em caso de emergência. Tive vontade de fazer uma textura nas paredes, até levei material para fazer algumas gravuras, mas francamente, não sobrou tempo. De qualquer maneira, foi muito bom ter novamente a sensação de ter um apartamento, alguma referência fixa de casa, ainda que seja um imóvel para investimento.

Quando Luiz chegou, começamos a encontrar os amigos. Brincava dizendo que fazia encontros no atacado, porque no varejo estava complicado. Pelo facebook ou por e-mail, anunciava onde iríamos à noite e quem pudesse se juntava. Foi bem legal e mandei minha relativa abstinência alcóolica para o saco! Se voltasse minha labirintite, pelo menos havia um bom motivo! Não tive nenhuma crise, mas uma tonturinha ou outra me acompanham até hoje, estou aprendendo a me relacionar com elas. Em compensação, pelas últimas saídas em bares com amigos, pós-Belmonte e pós-muita cachaça, o dia seguinte me lembrou que sou resistente, mas não imune! Tudo bem, vamos combinar que em mais de duas semanas chutando o pau da barraca, um diazinho de ressaca, tô no lucro!

O Rio de Janeiro está lindo! É a primeira vez que volto ao Brasil e acho o Rio melhor! Não sei o quanto a violência regrediu, mas a sensação de violência diminuiu radicalmente. A energia da cidade é outra! Podem ser meus olhos, mas acho que não, Luiz teve a mesma opinião. Minha explicação se deve a dois motivos, a pacificação dos morros e a lei seca. A pacificação dos morros melhorou a autoestima dos moradores e trouxe mais segurança para o asfalto. A lei seca fez com que as pessoas passassem a buscar programas noturnos em seus próprios bairros e tem muito mais gente caminhando nas ruas. Acredito que a Copa e a Olimpíada tenham muito a ver com isso também, abriu um leque de oportunidades. Enfim, seja o motivo que for, o Rio está bombando!

No dia 8 de agosto, dia dos pais, almoçamos com os nossos no Clube do Leme. Fiquei feliz que consegui pegar algum dia assim! Difícil saber quando a gente vai conseguir reunir nossos pais e mães outra vez na mesma mesa, espero que em breve. Meu irmão e meu primo também estavam conosco.

As malas já estavam prontas em casa e, assim que o almoço terminou, meu irmão nos levou ao aeroporto e seguimos para São Paulo. Até esse momento, havia desencanado um pouco da exposição, mas a consciência que estava chegando a hora, revirou meu estômago de nervoso novamente.

Mas a continuação dessa história, vai ficar para depois!

Viajando até fim de agosto

Queridos amigos e leitores,

Viajo hoje à noite para o Brasil. Estou quicando de ansiedade e saudade da família e dos amigos, isso sem falar da exposição que foi preparada com muita dedicação e, pela primeira vez, também com carinho.

Seguirei com acesso à internet, mas não sei quando terei tempo e tranquilidade para escrever, assim que pode ser que as coisas andem meio desatualizadas por essas bandas blogueiras. Prometo tentar não ser tão relapsa e ir contando a viagem aos poucos.

Aos que ficam, que tenham um verão revigorante e aproveitem a melhor parte dos dias ensolarados! Aos que estão espalhados pelo mundo, que consigam desconectar um pouco da rotina! E aos amigos brasileiros, que se preparem para uma boa farra!

Fui!

Convite para a exposição em São Paulo: O Papel e a Arte Aceitam Tudo

Convido para minha próxima exposição em São Paulo, na Galeria Area Artis (Rua Normandia, 92). O vernissage será no dia 11 de agosto, às 20:00hs. A exposição vai até o dia 28 de agosto.

Apresento 50 trabalhos em papel, originais e inéditos. A proposta segue abaixo com maiores detalhes.

O Papel, e a Arte, Aceitam Tudo

Sou louca por papéis! Adoro seus cheiros e texturas, entro em lojas especializadas como quem entra em uma confeitaria, me dá vontade de comê-los. Às vezes, gosto tanto de um papel que me custa trabalhar sobre ele, parece sobrar, ele também é interessante vazio.

Diz o ditado popular que o papel aceita tudo. Há alguns anos descobri o prazer da escrita e o que vivo parece mais real depois que registro. Talvez por melhor compreender ou pela possibilidade de compartilhar, quem sabe, mas o fato é que de uma maneira ou de outra, um papel pode ser um pequeno universo pessoal que aceita a verdade que você acreditar ou eleger. Como mágica, a palavra escrita parece valer mais que a falada. O papel é tão generoso quanto ambíguo.

A arte também é uma forma de linguagem, não tão direta quanto a palavra, ainda que dela possa se beneficiar. Portanto, me interessou jogar um pouco com a idéia e testar, literalmente, essa possibilidade. Será mesmo que o papel aceita tudo?

Imediatamente, ganhei liberdade e me senti tranquila revisitando desenhos, técnicas e materiais deixados de lado, por mim mesma, por não parecerem tão especiais. Há algum tempo me empurram goela abaixo o que deve ser considerado genial, geralmente coincidindo com algum discurso de alguma figura importante no meio. Sim, eleva-se a discussão a um patamar superior, mas em um ambiente onde não existe polêmica, portanto, nada floresce nem revoluciona. Não há coragem onde não há risco, e mata um bocado de espontaneidade.

O que me importa nesse momento é jogar com esses pequenos mundos individuais que cada papel permite. E buscar o que há de repetição como forma de identidade e na criação de universos pessoais.

Esse é o convite que faço, que não se busque a explicação correta nem o que se deveria entender. É exatamente o que você vê. Goste ou não goste, entenda ou não entenda, mas sob seus próprios parâmetros. O que proponho é um exercício de liberdade.

E sim, desde o tradicional lápis aos materias considerados incompatíveis ou improváveis, o papel aceitou tudo.

E a vida segue…

Ficaram coisas para contar e admito que nos últimos tempos não tenho dado a devida prioridade ao blog. Às vezes, a gente tem que optar em como ocupar o dia com o que é urgente. Acho que o verão traz também um pouco de preguiça boa e tudo que fazemos parece mais devagar. Sou naturalmente muito acelerada e um freiozinho de mão natural pode me vir bem.

Começo pela nossa apresentação com o coral, que foi no dia 8 de julho. Acredito que tenha sido a mais elaborada e cuidada nos detalhes que fizemos, pelo menos, dentro dos nossos recursos. O repertório foi só de sambas, na verdade, um recorrido histórico iniciado pelo primeiro samba reconhecido, Pelo Telefone do Donga, passando por Chiquinha Gonzaga, Cantoras do Rádio, Pixinguinha, Braguinha, Adoniran Barbosa, Paulinho da Viola, entre outros. Demos um toque teatral e nosso cenário foi um bar no estilo gafieira, onde as canções surgiam naturalmente, como de um bate papo nas mesas. Ficou bonito!

 

Investimos dois meses nesse show e, se por um lado o trabalho desgasta um pouco, por outro traz muita realização na hora que a gente respira fundo e pensa: funcionou! Saí com vontade de mais e nos reunimos cerca de uma semana depois para pensar na possibilidade de levá-lo para algum teatro ou outro espaço.

Para mim foi um pouco difícil, porque a cabeça já tinha mudado de sintonia para a próxima prioridade, que é a exposição no Brasil. Mas achava importante que a gente conversasse enquanto as idéias estavam frescas.

Foi uma boa conversa, onde identificamos uma série de pontos que poderiam ser melhorados. Ao mesmo tempo, começou a me cair a ficha da trabalheira que isso significava e do tempo a ser investido. No final, na hora de estabelecermos uma agenda, a coisa começou a se desencontrar.

Tomei um banho de realidade e cheguei a conclusão que tenho uma série de outros projetos para iniciar. Nesse momento, preciso que a cigarra dê um tempo porque às vezes a formiga também precisa se concentrar para trabalhar em paz. Vou pensar se tenho alguma alternativa quando chegar setembro, mas no momento, não vejo como seguir cantando, ao menos não no grupo. Tenho uma sensação de perda, mas não quero pensar nisso agora.

Enquanto isso, na sala de justiça… a fábrica caseira não parou! Acho que os artistas são bem parecidos nesse sentido, é muito difícil a gente dar um fim a qualquer trabalho ou montagem de exposição. A gente quer usar até o último minuto e nunca acha que é suficiente, portanto, o trabalho não acaba, o que acaba é o tempo. E ontem à noite, meu tempo acabou! Finalizei a 50a peça e gosto de números redondos. Que assim seja! E que a merda me acompanhe!

 

Agora que está perto da viagem ao Brasil, será na semana que vem, o frio na espinha bateu com tudo e por muitos motivos diferentes. Estou uma histérica, oscilando entre a euforia e a irritação, tudo é muito!

Sim, meu pai segue com uma ou outra complicação, mas também aprendendo a administrar com minha mãe seu leão de cada dia, e o principal, tentando melhorar sua qualidade de vida. Continuo no eterno dilema se não deveria estar contribuindo mais nesse apoio, estar mais presente, mas faço o exercício de não me culpar, porque culpas não ajudam ninguém. E o fato de não ir ao Brasil às pressas, correndo do aeroporto para um hospital não tem preço! Ainda que fosse só por isso, eu agradeceria. Mas é por muito mais.

Comecei a agitar os encontros com os amigos brazucas e o carinho que a gente recebe me traz uma mistura de felicidade extrema e nostalgia. Temos amigos desviando sua rota, saindo de suas cidades, mudando sua programação ou simplesmente achando uma brecha na própria agenda complicada. E isso é muita coisa, me emociona.

Parei para pensar em quantas pessoas me despedi na vida e quando a cifra chegou aos três dígitos, não sabia se agradecia o privilégio de conhecer tanta gente boa ou sofria por antecipação da falta das próximas a conhecer (e das mesmas conhecidas). Já me peguei de má vontade em me relacionar com novos amigos com data para ir embora. E também sei que de novo chegará minha vez.

Tudo bem, sei lidar com essa questão, já aprendi e viva a internet que ajuda e muito a encurtar as distâncias. Mas isso não quer dizer que não sinta saudades, que não tenha amigos específicos que quero contar assuntos específicos e pessoalmente, tomando um vinho, um whisky ou uma cachacinha. A proximidade dessa possibilidade faz minha cabeça girar a mil por hora e nem dormir direito consigo mais!

Para culminar a explosão de sentimentos, tem a exposição. O que posso dizer? Minha última no Brasil desmontei com a mudança para Atlanta empacotada, quase um ritual de passagem. Os últimos sete anos fora do país e o impacto que isso teve no meu trabalho, já vim contando ao longo do tempo e nem sei se importa mais. A sensação de voltar e com uma individual agendada em São Paulo, caraca, nem sei como descrever. Mas é forte pacas! E olha o ciclo dos 7 anos outra vez!

Estou pronta para o próximo ciclo.

Entendendo a sensação de pertencer a pátrias

Continuo sem tempo para escrever, ainda que as coisas não parem de acontecer. Hoje resolvi tirar algum momento de qualquer jeito. Vou desobedecer a cronologia e pular alguns acontecimentos que voltarei depois, porque quero falar de uma sensação diferente que aprendi ontem e estou ainda entendendo.

Primeiro, vou deixar muito claro, adoro futebol! Nem sei explicar de onde vem isso, pois não acompanho campeonatos e mal assisto as partidas pela TV. Mas lembro dessa paixão a cada Copa do Mundo e também me lembro porque não assisto jogos normalmente: não levo na esportiva, eu me importo!

Sou flamenguista e só sei torcer pelo flamengo. Quando morava em São Paulo, muita gente perguntava: mas em Sampa, que time você é? Como assim? Sou flamengo no Brasil inteiro! Aqui, até tentei torcer pelo Real Madrid, afinal a distância de um oceano deveria me liberar para outro time não? Pois não. Continuei flamengo. Às vezes, respondia que era Real Madrid, por simpatia, para continuar a conversa, mas nunca me empolguei com os resultados, nem me aborreci com as derrotas. Na verdade, acho que só assisti a uma partida inteira, porque era ao vivo no Santiago Bernabeu e me decepcionou bastante a frieza do público. Que saudade me deu do Maracanã e da emoção de ser parte da torcida mais importante dentro dele.

Quando chega a Copa, abro a exceção naturalmente para algo maior e sou Brasil. Não tem jeito de não me envolver, de não levar para o lado pessoal, porque me emociona, me irrita, me deixa eufórica. Não tem parcimônia, é tudo muito!

De maneira que assistir a uma Copa fora do meu país de origem, e já não é a primeira vez, é algo meio estranho. Porque no início tem um lado que me divide, não por ter dúvidas para quem torcer, é Brasil e acabou, mas por uma segunda preferência. Se moro aqui, e já passa de cinco anos, não deveria também ter algum carinho pelo país local?

Pois no início, achei que não. Era algo meio artificial. Dizia que minha segunda opção era Espanha, mas o som da minha voz era quase para me convencer, porque na hora do jogo me irritava profundamente. Tudo bem que os comentaristas são uns imbecis e a imprensa completamente parcial, o que não ajuda em nada, mas não era só isso.

No jogo de Brasil e Holanda, fiquei muito triste no final. Tirando o Felipe Melo, que espero que daqui para a frente só seja convocado para jogar em algum time de várzea no meio do inferno e do Dunga pela teimosia de, conhecendo sua natureza, não tirá-lo antes; o restante dos jogadores acho que deram o que puderam e jogaram concentrados, sem displicência. E aí, paciência, acontece.

De certa forma, uma vez que Brasil não estava mais no páreo, toda a paixão se converteu em indiferença. Tanto fazia o que acontecesse dali para frente e já nem queria mais assistir jogo nenhum. Os amigos brazucas brincavam que o objetivo então seria torcer contra Argentina. Mas a verdade é que quando Argentina saiu tomando uma lavada, achei bom pelas piadas de sempre, mas honestamente, não me importou grandes coisas, além da justiça de que Maradona não fosse herói de coisa nenhuma.

Foi quando Alemanha jogou contra Espanha que senti algo diferente acontecer. Alguma coisa na minha cabeça mudou. Deu um clic! Comecei a ouvir as declarações dos jogadores espanhóis como mais maduras e corretas. De certa forma, parecia que o país estava entendendo que em uma Copa do Mundo o buraco é mais embaixo e que não existe essa história do já ganhou.

Vi também como começou a melhorar a autoestima das pessoas, que andava bem baixa em função de uma crise econômica complicada e da falta de experiência em lidar com ela. E me alegrou ver os espanhóis mais felizes e os negócios reagindo em função da boa onda. Pensei sinceramente que essa Copa deveria ser “deles”. Era justo e merecido.

Pela primeira vez na vida, virei a casaca mesmo e passei a torcer descaradamente pela Espanha. E me fez bem entender que isso significa que não guardei mágoa. Tenho meus problemas aqui, todo mundo sabe, mas acho que consegui separar bem as coisas. Como tenho problemas no Brasil e também critico meu país de origem.

A final contra Holanda ontem foi definitiva, a prova de fogo do meu sentimento. Posso disfarçar o que digo para os amigos espanhóis, mas não posso mentir para mim mesma e sei o que sinto e o que não sinto de verdade. E eu sei que ontem torci para Espanha com a mesma emoção e intensidade com que torço para o Brasil. Fiquei nervosa, fiquei puta com os holandeses, senti o coração pulsar mais forte e até queimei uma lâmpada! Não sei se já contei aqui, mas quando estou agitada, queimo lâmpadas! Acho que é a energia que sai do corpo sem muito controle, sei lá, mas isso não se falsifica.

Quando o jogo acabou, quis ir para rua e ver a festa, participar dela, ser parte da comemoração e compartilhar o orgulho. Fiquei feliz.

Chegamos em casa e sabia que alguma coisa era diferente, mais leve, queria entender melhor e agora entendo. Finalmente, começo a conhecer o que é ter mais de uma nacionalidade, oficial ou não, falo da sensação de pátria. Tem coisas que a gente sabe na teoria, mas às vezes falta sentir na pele. Ter mais de uma pátria não necessariamente significa eleger entre elas. Porque nós não temos pátria nenhuma, nós somos parte de alguma ou algumas.

E para quem se debateu tanto tentando questionar e entender a própria identidade, foi libertador saber que faço parte da raça em que cabem pátrias no coração. Adoro quando consigo ser no plural.

Casa do Brasil em Madrid

 

Plaza de España, logo após a vitória

 

Plaza de España

 

Callao

Dumbaiê Canta Samba, dia 8 de julho na Casa do Brasil

Aos que vivem pelos Madriles, convido a assistirem uma apresentação sobre Samba, feita pelo coral que participamos. Será no dia 08 de julho, nessa quinta-feira, às 20hs, na Casa do Brasil.

Um show despretencioso e divertido, onde os espanhóis e estrangeiros podem conhecer melhor a história do Samba e os brasileiros podem matar um pouco a saudade.

Estarei por lá cantando e tocando tamborim. Luiz também faz parte do grupo e até canta um solo.

E aos que não puderem comparecer, depois conto como foi! 😉

Às vezes, os comportados são subversivos

Fiquei boa! Minhas tonturas duraram mais ou menos uns 15 dias, na primeira semana bem ruim e na segunda melhorando um pouco diariamente. Nessa segunda-feira, exatamente quando Brasil jogou contra o Chile, acordei zerada e cheia de energia. Estava com saudade da minha lucidez.

Já havia começado a trabalhar, mesmo estando aérea. E como a necessidade é a mãe da invenção, por não conseguir fazer os desenhos que havia planejado, por serem muito delicados e precisos, mudei de técnica e resolvi improvisar com encáustica. Sabe de uma coisa, gostei do resultado e dei um gás nos últimos dias que me garantiram um número razoável de peças prontas. Continuo com coisas para fazer, só que com uma relativa tranquilidade por voltar a estar no prazo.

Na sexta-feira, fomos assistir Brasil x Portugal na casa de um casal de amigos. Aquela partida tão emocionante quanto um joguinho de golf, mas tudo bem.

O fim de semana foi tranquilo. No sábado, fiz uma ressonância magnética só para garantir que está tudo normal. O resultado sai na próxima sexta. De lá, fomos almoçar com um casal de amigos, ela brasileira que mora em Londres e está trabalhando em um projeto em Madri, ele italiano de Turin que veio encontrar com ela. Vinha também uma amiga mexicana, mas não conseguiu acordar a tempo. O mundo continua muito internacional!

O resto do sábado e domingo, ficamos em casa e achei muito bom. Aproveitei para trabalhar e ficar sossegada. Estou tentando me comportar como uma mocinha para não ter maiores problemas, não é hora de arriscar.

Na segunda, acordei ótima e bem descansada. Assim que fui assistir Brasil x Chile com Luiz e amigos na Casa do Brasil. Bem legal, montaram uma boa estrutura nessa Copa. Fizeram na área externa, montaram alguns telões, barraca de churrasco, salgadinhos, bebidas. E lotou! Divertido e sem confusões. Só aquela vuvuzela chatérrima, mas paciência, acho que isso teremos que engolir. Depois, como disse ao Luiz que se arvorava em reclamar bem alto das cornetas, quer assistir sem ser incomodado, fica em casa, né? Deixa o pessoal se divertir e estravazar um pouco!

Enfim, adorei ver o jogo ao ar livre e com amigos, que conseguiram uma mesa bem de frente para o telão, praticamente área VIP. Verdade que o resultado de 3 x 0 ajudou bastante!

E agora uma curiosidade, no dia desse jogo prestei mais atenção na musiquinha da Copa, Waving Flag, que na realidade veio de um comercial da Coca-Cola, mas acabou ganhando proporções bem maiores. Enfim, pessoalmente, havia gostado bastante da música, mas tinha algo que me parecia incoerente e me intrigando, no bom sentido.

É que tenho mania de buscar as histórias por detrás das músicas, quadros, poemas… As histórias me interessam. E o tipo de emoção que essa música em especial me transmitia não parecia apenas espírito esportivo e muito menos comercial.

Daí hoje fui dar uma olhada no Youtube para ouvir melhor a letra, saber quem cantava, essas coisas. Achei um programa de rádio em que o K’naan apresenta uma “nova” versão dessa canção, que ele acabou de gravar. É uma música de protesto, que desconfio que de nova nada, chutaria que é a versão original. Na minha opinião, bem mais interessante. Se é que ele fez de propósito e conseguiu implacar depois, ganhou meu respeito. Viva a subversão!

When I get older, I will be stronger…

Para quem quiser comparar, a música no mundial é cantada assim:

Madri: onde comer melhor e o que?

Faz algum tempo, estou para elaborar uma lista de restaurantes que gosto em Madri. Mas são muitos e às vezes dá até preguiça. Resolvi fazer um pouco diferente e ao invés de pensar primeiro no nome do local, dei prioridade ao prato. Em outras palavras, escolhi alguns pratos que, na minha opinião, se destacam como o melhor da cidade. E a partir daí, onde encontrá-los.

Há desde restaurantes mais sofisticados ao vendedor ambulante da madrugada. Não me concentrei apenas em comida espanhola, até porque gostamos muito de variar. Tudo que indiquei abaixo, já provei, aprovei e recomendo como o melhor que já comi em Madri.

Então, vamos lá, o/a melhor…

–                      Porção de presa e secreto ibéricos (tipos de corte de carne de porco); creme de cogumelos com ovos trufados – El Fogón de Trifón, Calle Ayala 144, 91 402 3794. Tudo que se pede no Trifón é excelente! Não tem erro! A carta de vinhos também é nota 10! É um restaurante pequeno, com meia dúzia de mesas mais a barra (balcão da frente). É elegante, sem perder a informalidade e o atendimento é diferenciado.

–                      Rabo de toro (rabada); merluza rebozada (peixe à milanesa) – Sonia, Calle de Bocángel 35, 91 725 1457. Uma taberna sin mariconadas, restaurante de bairro tradicional e de comida excelente! Possuem um ótimo cardápio, mas sendo cliente e tendo os ingredientes na geladeira, eles fazem o que você quiser! E muito bem feito!

–                      Plancha de mariscos – El Rincón de Jaén, Calle Don Ramón de la Cruz 88, 91 401 6334. Apertadinho, meio esfumaçado e informal. O atendimento é ótimo, educado e simpático! A plancha de mariscos é um escândalo! Recomendo pedir que se adicione os “carabineros” (um tipo de camarão de cor vinho, enorme e muito saboroso).  

–                      Salpicón de frutos do mar; arroz caldoso de bogavante – El Barril, Calle Goya 86, 91 578 3998. O salpicão é delicado e no tempero usam a laranja, o que dá um toque especial. Bogavante é um tipo de lagosta e para meu gosto, o arroz de bogavante é muito mais gostoso que a paella.

–                      Carne – Rubaiyat, Calle Juan Ramón Jimenéz 37, 91 359 5696. Sim, é o restaurante brasileiro e sim, é a melhor carne de Madri. O atendimento também é perfeito!

–                      Jamón Ibérico de Bellota – En Busca del Tiempo, Calle de Barcelona 4, 91 521 9801. É um bar e restaurante no centro da cidade, a porção de jamón é especial. Muito bem cortada e servida com pan tumaca (torrada com molho de tomate fresco triturado).

–                      Tortilla española – Taberna de La Daniela, Calle General Pardiñas 21, 91 575 2329. Durante o almoço, são especializados em Cocido Madrileño e no jantar servem as tapas mais tradicionais. Sou tarada na tortilla de lá! É individual, feita no ponto perfeito, tostadinha por fora e molhadinha por dentro.

–                      Croquetas – Finos y Finas, Calle Don Ramón de la Cruz 49, 91 577 9379. As croquetas espanholas mais tradicionais são de jamón, mas é possível encontrar variações como frango ou bacalhau. Nesse local eles ousam outros sabores e fazem as croquetas menorezinhas e mais delicadas.

–                      Pintxos – Taberna Txakolí, Calle Cava Baja 26, 91 666 4877. Não é um restaurante, é só o balcão com uma infinidade de pintxos (torradas com algo por cima, como lombo com foie gras, salmão defumado com cream cheese etc). O meu favorito é o pintxo de vieira gratinada.

–                      Tajada de Bacalau – Casa Labra, Calle Tetuan 12. É um restaurante tradicional, fundado em 1860, muito próximo à Puerta del Sol. Nunca fui para as mesas do salón comedor, porque o balcão é o máximo! É um local para comer de pé e informalmente, fazer uma boquinha no passeio pelo centro da cidade. A “tajada” é um pedaço de bacalhau fresco empanado e frito no azeite, que só para se ter uma idéia, eu que nem ligo para bacalhau adorei! Para os que conhecem o Rio de Janeiro, faria uma comparação mais ou menos com o Bracarense, onde você passa depois da praia e toma uma cervejinha com bolinho de bacalhau, o conceito é parecido, na versão européia. 

–                      Sashimi – Mono Noke, Calle Hernán Cortés 19, 91 522 9806.  Um restaurante pequeno, que se atreveu a ser não fumador. A qualidade do peixe é diferenciada, fresco e bem cortado.

–                      Brunch – La Tapería, Calle San Bernardo 88, 91 593 0422. Melhor checar antes, porque não servem brunch durante todo o ano, mas foi o único local na cidade que encontrei um brunch de verdade, como dios manda! Para se acordar com preguiça no fim de semana e comer com calma.

–                      Tagliolini (pasta muito fina) com trufa de temporada – La Creazione, Calle Ventura de la Vega 9, 91 429 03 87. Um restaurante italiano normal, em zona razoavelmente turística. Mas essa pasta fininha, que lembra nosso “cabelo de anjo”, com trufas, é uma coisa de loucos!

–                      Bobó de camarão com caipirinha – Kabocla, Calle San Vicente Ferrer 55, 91 532 5966. Servido no almoço de sábado, uma delícia! Atendimento bastante simpático e informal, me sinto em casa.

–                      Ostras com champagne – Mercado de San Miguel, ao lado da Plaza Mayor. Na verdade, no mercado se encontram várias lojas e parece uma praça de alimentação, mas com um certo toque gourmet, bem no coração da cidade.

–                      Crepes – Crêperie Breizh, Calle de la Madera 36, 91 522 7982. Típica casa bretã, onde são servidas galettes (o que conhecemos por crepe, mas utilizando a farinha mais escura, originária do trigo sarraceno). O meu favorito é o “escandinavo”, com salmão defumado, nata e caviar, peço para a dona me adicionar um ovo com gema mal passada.

–                      PF (arroz, feijão, carne e mandioca frita) – Olokun, Calle Fuencarral 105, 91 445 6916. É um restaurante cubano, mas para os brazucas também funciona muito bem. Às vezes, dá aquele desejo de comer uma comida caseira, aquele feijãozinho preto com arroz…

–                      Pastel de carne – Mesob, Calle Manuela de Malasaña 17 91 445 8170. É um restaurante etíope, portanto, não é exatamente o nosso pastel, mas é muito parecido. O local é simples e o atendimento bem simpático.

–                      Mixto Quente – Lanchonete da Casa do Brasil, Av. Arcos de la Victoria s/n. Uma delícia! Crocantinho, no ponto perfeito. A gente sempre come antes do ensaio do coral.

–                      Hamburguer – Mr. Dog, Calle San Bernardo 28, 91 523 5295. Abriu há pouco tempo, mas já me deixou freguesa, inclusive, acho que o dono é brasileiro. Também vendem umas coxinhas e um cachorro quente muito bons, mas o hamburguer é imbatível!

–                      Cachorro Quente (com cebola crocante) – Happy Day, Calle Espíritu Santu 11. É um micro café com uma única mesa e precisa ter sorte para conseguí-la. O lugar é mais indicado para passar e levar. Charmosérrimo, com jeitão de interior dos EUA e com ótimas tortas, como a de maçã e a de chocolate.

–                      Salada Ceasar (com frango) – Home, Calle Espíritu Santu 12, 91 522 9728.  A decoração segue o padrão americano, como se você estivesse em um trailler. Oferece hamburgueres bem honestos, o que é a proposta principal da casa, mas o ponto alto mesmo é a salada.

–                      Salgadinhos (no estilo brasileiro) – Africano que fica na porta do Oba Oba (não é necessário entrar no local), início da Calle Jacometrezo. Do lado de fora, às três da manhã, chega um africano com os salgadinhos quentinhos e bem embrulhados individualmente. O mais cobiçado é o risólis de camarão, mas o espetinho de frango e o risólis de carne também mandam muito bem! Como ele provavelmente seja ilegal, um pouco de cuidado ao divulgá-lo ou procurá-lo. Mas vamos combinar que no meio da madrugada, onde já não há lugares abertos para se comer nada, bate um bolão!

Com o tempo, pretendo ir ampliando ou atualizando a lista. Há outros restaurantes que gostamos e frequentamos, mas dessa vez, o que escolhi como carro chefe foram os pratos. E só para que conste, não ganho um tostão com isso.

Bom apetite!

Competir é legal, mas o importante é ganhar

Passada uma semana, continuo no esquema eles é que bebem e eu que fico tonta, mas vou melhorando. Na sexta-feira que vem, volto ao médico e vamos ver o que ele fala, imagino que vá me pedir alguns exames. Começou a dar para fazer algumas coisinhas e ter algo de independência, mas ainda é bem incômodo. Um saco!

Mas vamos lá, enquanto isso, na sala de justiça…

Na quinta-feira, não consegui ir ao ensaio do coral. Até teria condições de participar, mas Luiz não conseguiu chegar cedo do trabalho e sozinha não me atrevi a ir. Mas na sexta nós fomos. Aliás, a primeira vez que saí de casa, desde que essa porcaria começou.

Foi tudo relativamente normal, só um pouco engraçado andar daquele jeito esquisitona pela rua e não poder virar a cabeça, mas tudo bem. Bom para quebrar o tédio e forçar um pouquinho a voltar à rotina. Depois, faltam só duas semanas para nossa apresentação e ainda estamos limpando algumas coisinhas para sair legal. Pre-ci-so ficar boa já!

No sábado, fizemos algumas comprinhas e almoçamos na rua. Outra vez, meio mais ou menos, mas queria aproveitar o fim de semana que Luiz podia sair comigo. Na verdade, o que mais me preocupa em sair sozinha é que são três lances de escada. Subir não é tão ruim, mas descer é complicado. Depois, acho que qualquer um que olhar para minha cara na rua vai sacar que não estou muito bem e fico insegura. Mas acho que isso vai passar naturalmente e espero que ainda essa semana.

No domingo, combinamos de assistir o jogo do Brasil na casa de amigos. Marcamos às 15:00hs para o aquecimento da torcida com um churrasco. O que não tinha me tocado é que a partida só começaria às 20:30hs (no horário de Madri), achei que fosse mais cedo. Assim, que fomos, comi um churrasquinho ótimo e bebi água, é lógico! Mas também, nem estava no pique de beber nada, fico sem um pingo de vontade. O que acontece é que pelas 18:00hs já estava um pouco cansada de acompanhar a conversa e os ruídos. Achei que até ali estava ótimo, então melhor não abusar e resolvi voltar para casa antes do jogo começar. Também tem outra coisa, acho meio chato você estar em um lugar com todo mundo animado, afim de beber, curtir e você lá, com aquela cara de nádegas, né? Acho que corta um pouco a onda do pessoal. Ninguém merece!

Assistimos o jogo, Luiz e eu, aqui em casa mesmo, relaxada com meu pijamão no sofá! Bom, relaxada é maneira de dizer, porque sempre me prometo que não vou ligar para a Copa, que  não dou bola para futebol etc… Mas na hora que toca o hino do Brasil eu esqueço isso, fico logo nervosa e começo a torcer levando a sério.

Vou contar uma coisa, assistir qualquer jogo com locução espanhola é um horror! Na boa, é muito, mas muito ruim mesmo! São exageradamente tendenciosos e não tem noção do que dizem! Acho legal ser nacionalista e normal dar uma certa protegida no seu país de origem, é emocional, até aí, tudo bem. Mas não dá para um dito profissional da área narrar um jogo diferente do que você está vendo! É falta de conhecimento técnico! O que importa é bola na rede! E até que ficava divertido vendo as bobagens que os locutores falavam e o Brasil indo lá e metendo outro gol!

No final do jogo, meus pais ligaram. Estava com vontade de fazer o mesmo! Saudade de assistir uma Copa no Rio. Mesmo em São Paulo, era bom, mas não era a mesma coisa.

Hoje tem jogo da Espanha e já não sei mais se torço contra ou a favor. No início, sempre sou simpática à seleção espanhola, mas depois sua atitude vai me irritando. Neguinho acha que porque tem uma boa seleção vai chegar dando sempre de goleada em todo mundo, mas isso é uma Copa, ninguém é besta. E mesmo as seleções menos fortes, chegam lá e dão tudo! Tem que respeitar. O melhor é quem ganha, o resto se justifica.

Mas enfim, ainda é muito cedo para conclusões e uma coisa estou gostando dessa Copa, não se pode negar algumas surpresas, o que deixa tudo mais interessante.

E o bicho pegou para o meu lado

Vou logo avisando que não me responsabilizo por qualquer dislexia no texto abaixo, porque mal dá para escrever, que dirá revisar. Mas antes que eu enlouqueça de tédio, melhor ficar um pouco tontinha escrevendo.

O que aconteceu? Acabo de ter minha primeira crise de labirintite! Uma delícia! Parece ressaca de bebida ruim e o pior, dura dias sem dar trégua.

Mais ou menos por fevereiro, tive umas tonturas estranhas por um tempo, mas fiz de conta que nada estava acontecendo. Por um lado, pela minha falta de confiança nos médicos locais e por outro, porque não me impedia de fazer nada.

Desde que mudei para o apartamento novo, elas tinham acabado, o que faz mais ou menos uns três meses. Muito bem, na semana passada, um dia deitei e o mundo deu aquela girada básica, pensei, putz, será que voltou? Mas no dia anterior havia tomado um xarope para tosse e xaropes me deixam meio doidona, então, parei de tomá-lo e resolvi observar. A tontura passou, beleza, deve ter sido o xarope!

Na sexta-feira, fomos ao ensaio do coral que acabou se convertendo um churrasco com amigos. Abusei da cachacinha, mas nada que me comprometesse, também bebi bastante água, comi bem e acordei bem. Um pouco cansada, mas sem ressaca. Fiz almoço e tudo!

Tinha um show para ir no sábado à noite, quando comecei a ter um pouco de tontura. Caramba, será que era ressaca interrompida? Não fazia muito sentido, mas segui sem dar grandes importâncias. Só não tive ânimo de ir ao tal show e achei que uma noite bem dormida resolveria.

Não resolveu. Primeiro, porque não foi bem dormida, o quarto girou a noite toda e acordei pior. Não tinha posição que resolvesse. O máximo que conseguia fazer era ir ao banheiro e mesmo assim, na volta dava uma vomitada básica, glamour total!

Luiz queria me levar a um hospital. Mas não vou nem a pau! Primeiro, porque não tenho condições de me locomover, vou sofrer horrores para sair de casa e chegar em uma emergência qualquer em pleno domingo, onde provavelmente um ortopedista de plantão e com má vontade vai me mandar voltar para casa, tomar muita água e iboprofeno! Tô fora! Só vou a médico indicado por alguém de confiança, caso contrário, não vou perder meu tempo.

Passei o domingo na minha máquina de lavar particular, sem conseguir nem comer direito, porque é mais ou menos como escolher a hora da tempestade no barco para fazer uma boquinha.

Na segunda-feira, acordei melhor, o que quer dizer que o quarto mexia menos e em algumas posições com a cabeça, não ficava totalmente mareada. Pode acreditar, isso era um progresso e tanto!

Mas era óbvio que não estava bem e isso não era normal, tinha que dar meu braço a torcer, precisava ir a um médico. Caraca, tô ferrada! Onde é que vou arrumar um otorrino bom aqui?

Luiz ligou, consegui um otorrino com indicação, é amigo de infância de uma pessoa aqui do meu trabalho e ele me garantiu que o cidadão é fera. Bom, assim já é outra coisa. Então tá, como a gente marca? Já marquei para hoje pela hora do almoço. Mas como assim hoje, não consigo levantar da cama!

Resolvi tentar. Levantei para me arrumar e vomitei como uma louca! Depois imaginei que teria que descer três andares de escada, andar de carro, esperar no médico… e comecei a ficar mais nervosa e, consequentemente, mais tonta! Liguei para o Luiz, esquece, sem condições! Eu vou no médico, me comprometo, mas não consigo chegar na porta de casa! Ele desmarcou.

Um pouco mais tarde, lembrei que enjoava em avião quando era criança e tomava Dramine, que tinha outro no me na época, para viagens internacionais. Liguei para Luiz e pedi para ele trazer para mim quando viesse do trabalho, porque se ao menos conseguisse não enjoar tanto, dava para levantar da cama e ir ao médico.

E assim foi, depois de uns quantos Dramines, consegui levantar, comer um pouco e até dar uma olhadinha na internet. Aproveitei para tomar um banho, porque nem isso dava antes. Beleza, não estou bem, mas pelo menos consigo me locomover mais ou menos.

Na terça-feira, final da tarde, Luiz conseguiu uma brecha na agenda do otorrino para me atender e veio me buscar. Lá fui eu, como um robôzinho dopado, só dava para caminhar com a cabeça bem reta, o mínimo de movimento possível.

Primeiro desafio, trocar de roupa sem mexer a cabeça. Caramba, como é que vou chegar nessa consulta? Tratei de colocar dois saquinhos de compras na bolsa, vai que enjôo no caminho? Cada vez a coisa ficava mais glamourosa, né?

Luiz ligou, você desce ou estaciono e vou te buscar? Amor, são três andares de escada irregular, sem chance! Ele subiu para me buscar e desceu as escadas na minha frente. Eu tinha a expectativa de ir caminhando com ele até o estacionamento, mas perdi essa coragem quando cheguei na portaria. Espero aqui sentada.

O movimento do carro era uma coisa deliciosa! Verdade que tinha tanto Dramine no organismo que nem se fizesse muita força, enjoava. Não passei mal, na verdade, nem vou fazer suspense, fui e voltei mais ou menos sã e salva para casa.

Ainda no caminho para o hospital, estava meio apreensiva e se não fosse labirintite? O que poderia ser? Todo mundo na minha família tem seu tumorzinho particular, só faltava descobrir o meu! Putz! E se o médico não for bom? Minhas experiências aqui nesse sentido são tão horrorosas… bom, uma coisa de cada vez, vamos com calma. E a essa altura, realmente já estava até torcendo para ter labirintite!

Chegando na rua do nosso destino, tem um cemitério imenso, logo depois uma casa funerária, e em seguida o hospital! Super sugestivo, né? Funerária adora abrir perto de hospital, são negócios complementares! Que mal gosto, credo! Relaxa, Bianca, um pouco de bom humor, vai!

Nem demorou muito para eu ter essa oportunidade. Chegamos na clínica, Luiz me deixou na porta e foi estacionar. Salto eu, andando daquele jeito esquisito, com a cabeça reta e meio esverdeada e vou para recepção ver o que tenho que fazer para ser atendida. Afinal, não tinha consulta marcada, o médico ia me encaixar. Como é que falo isso mesmo em espanhol?

Expliquei meio grogue para a atendente, que me perguntou, a senhora tem companhia? E eu respondo, tenho, está estacionando… Não senhora, companhia de seguro para a consulta! Ah, tenho também!

Sentei com vontade de rir, pensando que devia estar parecendo uma bêbada! Logo chegou Luiz e nem demorou muito para o médico me atender.

Olha, vou dar meu braço a torcer, porque justiça seja feita, sempre reclamo pacas dos serviços de saúde, mas o otorrino era ótimo! Além de me passar confiança, foi bastante atencioso e inclusive simpático! Um alívio!

Fez uns exercícios virando minha cabeça, me receitou um remédio para os enjôos e tonturas, recomendou que dormisse as primeiras 72 horas com travesseiro bem alto, me deu um exercício para fazer em casa e que procurasse mover a cabeça o mínimo possível (como seu eu pudesse movimentá-la!). Daqui a uns 10 dias, volto lá para ver como tudo vai correndo. Aqui o que tenho não chama labirintite, não existe esse nome, é não-sei-o-que postural cerebral benígno, mas a descrição se parece bastante à labirintite, então explico assim porque é mais fácil. O importante é que me concentrei no “benígno”. Há muito tempo penso que o que tem solução, tá bom!

Não sei se pelos movimentos que ele fez na minha cabeça, pelo fato de estar mais tranquila por ver um caminho ou pelo alívio que é confiar em um médico, saí de lá melhor. Consegui ir caminhando com Luiz até o carro, de braços dados e andando meio esquisitona, mas tudo bem. Queria forçar um pouquinho também para recuperar mais rápido.

Compramos o remédio indicado aqui perto de casa e subi os três andares melhor do que desci, olhar para cima é sempre mais fácil. Bom, subi com ajuda do Luiz ainda, mas acho que não fui tão mal.

Hoje levantei melhor, foi o dia que melhor dormi também. Porque ainda que só ficasse na cama, a gente não consegue dormir direito com o mundo rodando. Não dá para ver TV, não dá para fazer nada, é bem entediante. Hoje não, consegui levantar, tomar café, ler as mensagens e agora até escrever no blog. Tenho que dar umas paradinhas de vez em quando, mas sigo melhorando.

Estou um pouco preocupada, porque nos últimos dias não consegui trabalhar na exposição. Dá para escrever no computador, porque não preciso digitar olhando as teclas, mas desenhar é impossível. Tenho já bastante coisa pronta, mas não está tudo pronto e fico agoniada. Não dá para sair sozinha, me sinto insegura de descer as escadas e ir pela rua assim. A casa também está uma zona e isso me irrita! Tudo bem, acabei contratando uma amiga para me dar uma força na sexta-feira e não vou morrer se a casa não estiver uma semana organizada, paciência! Se isso passar até o fim da semana, tudo sob controle.

Bom, por hoje, consegui escrever, já é um grande passo, me deixa menos louca! Vamos ver como acordo amanhã e um dia de cada vez.

Sobre a generosidade

A pessoa mais generosa que conheci na vida foi minha avó por parte de mãe.

Veja bem, não venho aqui fazer nenhum discurso familiar, até porque outros familiares tem qualidades e defeitos que posso falar por horas, mas não interessa agora. O ponto que quero abordar é a generosidade, e o maior exemplo que tive nesse ítem foi minha Vó Noca. Da categoria de pessoas que dão a roupa do corpo, literalmente.

A gente achava que era até demais e, às vezes, as pessoas se aproveitavam disso. Ela nem queria saber, respondia o ditado que cresci ouvindo: nasci nua, estou vestida… estou no lucro. Eu não tenho a generosidade por natureza e o que consegui desenvolver, tenho quase certeza que foi graças a seu exemplo. Sorte a minha, porque o ditado que me corresponde é, de onde veio esse, sempre virá mais. Sempre veio. Mas há uma diferença conceitual entre meu desapego e a sua compreensão real de que a vida é finita e efêmera. Muitas vezes, consigo ter essa compreensão e esse já foi um longo caminho, mas minha ambição é que um dia seja algo natural.

Minha mãe não é tão generosa com ela mesma, mas é muito com quem ama, o que me incluiu. Meu pai não abria mão do que tinha, mas sentia um prazer enorme em compartilhar e, nesse sentido, é com quem pareço mais. Na verdade, ele também sempre foi muito mais generoso que eu. Meu irmão não é propriamente generoso, mas comigo é bastante. Luiz tem por objetivo descarado me fazer feliz, eu realmente acredito nisso e acho lindo, me dá vontade de sê-lo.

Posso seguir essa lista, mas me concentrei nos mais próximos. Estar tão protegida assim, me deixa quase na obrigação de ser melhor. É um privilégio e também uma responsabilidade.

E eu persigo essa generosidade, me aproximo das pessoas generosas. Não pelo que elas podem dar, mas pelo que posso aprender. E toda lição de generosidade me emociona.

E por que estou falando nisso? Porque hoje estive cercada de gente generosa e cheguei em casa melhor, é contagiante.

Acabei de chegar de um concerto de música instrumental com um acento brazuca flamenco. Cada vez gosto mais de música instrumental, é uma obra de arte abstrata que estou por um triz de entender os detalhes e os segredos das histórias que estão por detrás e alguém, cheio de generosidade, digeriu em sons.

Altas!

Quando era criança e brincava de pique-pega (que pelo menos naquela época levava hífen), no momento que a gente cansava ou queria falar alguma coisa, pedia algo que soava como, “altas”! Bom, eu falava que estava de altas, mas acredito que houvesse outras possibilidades de palavras que funcionavam como uma licença rápida da brincadeira.

Enfim, depois das últimas intensas semanas, admito que pedi altas! Não é que não quisesse fazer absolutamente nada, mas precisava de um tempinho mais relaxado. Sei que vou dizer algo bastante politicamente incorreto e de encontro ao famoso problema do aquecimento global, mas nesses dias, achei um programaço ficar tomando ar condicionado em casa com Luiz e nosso felino preguiçoso.

Bom, mas alguma coisa fizemos, até porque foi feriado prolongado e Luiz teve uma folguinha. Na quarta-feira, ele pediu o dia livre e fomos resolver alguns pepinos burocráticos. No fim da tarde fui para minha aula de percussão, onde aos poucos vou melhorando, ainda que com um longo caminho pela frente.

Na quinta-feira foi feriado e fizemos um ensaio do coral em casa. Na verdade, serviu mais para detalhar as tarefas para nossa apresentação de julho. Por outro lado, por que não fazer de uma maneira divertida? Tomei meu vinhozinho, fiz um quibe e um cuscuz de frango com legumes. Até que a reunião foi produtiva e conseguimos decidir um monte de coisas. Em breve, começo a fazer propaganda dessa apresentação, que será no dia 8 de julho, aqui em Madri, e cantaremos sambas. Não acabou tão tarde, porque alguns integrantes trabalhavam no dia seguinte.

Na sexta-feira, Luiz trabalhou, mas não até tão tarde. Pelas 15:00hs, chegou em casa com a idéia de que queria porque queria me levar a um outlet em Las Rozas, perto do trabalho dele. Veja bem, honestamente, não sou uma pessoa consumista e uma parte razoável dos meus luxos só diz respeito a gastronomia e bons vinhos, de resto, aproveito se tenho, mas se não tenho não me importa muito, sem traumas. Mesmo assim, vamos combinar, continuo sendo uma mulher e chamar uma mulher para fazer compras com essa vontade toda, exige coragem! Tenho minhas dúvidas se ele sabia onde estava se metendo e não sei se não se arrependeu de haver dito logo na primeira loja: experimenta, vê se fica bom! Digo isso, porque experimentei pacas e um monte de ropichas ficaram ótimas!

Faz tempo que não compro tanto, por um lado, porque como disse antes, não sou tão consumista. Por outro, porque quase sempre aqui me falta a amiga de compras, e as mulheres devem saber do que estou falando. Não digo que Luiz preencheu perfeitamente esse papel, até porque filosoficamente seria contra sua masculinidade, no final ele já não aguentava mais! Mas segurou a onda firme e forte e considerei uma prova de amor.

De maneira, que ao acordar no sábado, ele disse que queria comer o bobó de camarão do Kabocla e nem me atrevi a dar outras possibilidades mais leves. Não me arrependi, estava ótimo, mas comi mais do que deveria. Depois disso, já não fizemos mais nada. Um casal de amigos ligou e convidou para encontrá-los em uma terraza… outro amigo chamou para passar em um bar para o aniversário dele… mas dessa vez, o aconchego do lar estava muito melhor. Altas!

Domingo nem quis almoçar fora! Peixinho com salada fresca e estava muito bom! Passamos o dia enrolando, escolhendo os quadros das paredes e a casa ficou mais bonita. O jantar, havíamos combinado com uma amiga do Rio, que está por essas bandas até a próxima quinta. Ela é nutricionista e também apaixonada por gastronomia, já viu né? Comemos bem, tomamos duas garrafas de vinho tinto, falamos da vontade de abrir um negócio em sociedade nessa área e voltamos para casa na hora da Cinderela.

Hoje, plena segundona e acordei super bem disposta! Por mais que sinta calor, amo a luz do verão em Madri.

Altas fora! Volto para a brincadeira e essa semana, acho que o bicho vai pegar!

E o verão dá as caras

Às vezes, a gente brinca com os alemães, dizendo que eles ficam felizes quando o verão cai no sábado!

Pois esse ano foi quase assim com a primavera na Espanha. Acho que se juntarmos todos os dias de tempo agradável, deu no máximo umas duas semanas. Suficiente para deixar todo mundo alérgico e ir embora.

E em tão pouco tempo, já esqueci a sensação de frio.

O ar que chega agora é de verão e, felizmente, a luz também. Nem vou falar muito, porque a temperatura andou tão maluca, que nunca se sabe, mas acho que daqui para frente já poderemos guardar os casacos.

Maio acabou com uma notícia e tanto! Luiz superou suas metas no trabalho, o que em um ano de bosta, pelo menos por aqui, não é para qualquer mortal. Difícil dizer se chegou em casa mais cansado ou mais feliz, mas fiquei bastante orgulhosa. Sempre acho bonito esforços sendo compensados, no que quer que seja, traz um senso de justiça que é complicado da gente não se esquecer de vez em quando.

Vou tentando reorganizar a casa e a cabeça junto. Acho que mulheres constantemente tratam a casa e o corpo de maneira tão parecida que às vezes é até confuso. Já fui assim com os carros que tive também, e talvez essa relação seja mais fácil para os homens compreenderem, a proximidade era tanta que o volante parecia atado aos braços. Muito maluco ter a consciência de que quando não temos essas coisas, parece que temos mais ainda. Perdendo a relação com um carro, cuidei melhor dos meus pés, descobri que posso usar as pernas para atravessar países; não tendo casa, o planeta passou a sê-lo, qualquer lugar é lugar.

Não prego a pobreza, nem a abstinência, gosto muito do que é bom e de conforto. Só digo que é importante a gente saber do que gosta e do que precisa, é o que dá a confiança em assumir riscos. O que cada um será capaz no limite é sempre uma surpresa, mas é bom ter uma idéia das suas possibilidades. A crença que tenho o signo de Fênix, sempre me fez acreditar que poderia ressurgir das cinzas e tenho quase certeza que foi essa crença, menos que a própria capacidade em si, o que me deu o poder de recomeçar.

Continuo trabalhando na exposição de agosto e o tempo parece ter acelerado. Começou a me dar aquele friozinho na espinha. Vai para uns sete anos que não faço uma individual e até o número é cabalístico, o tempo dos meus ciclos. O instinto já começou a juntar peças, fragmentos de memória, acontecimentos. Em breve, minhas somatórias tão pessoais e um pouco absurdas darão algum resultado de quebra-cabeças.

Que o verão seja bem vindo e que traga o próximo ciclo.

Toca Afonso!

Olha só, eu tô velha, dane-se! Sei que tenho uma reputação festeira imparável a zelar, mas já não dou conta! Sério, mais um dia de festa e vou acabar a noite em um hospital!

Como venho contando, um casal de amigos vai embora de Madri, e desde a sexta-feira passada, começamos com uma sequência interminável de festas de despedida.

Pois então, na quarta e na quinta-feira, ainda segurei um pouco minha onda, sabendo que a agenda estava atribulada. Mas na sexta-feira, pensei, já estamos na reta final, portanto, ferrada, ferrada e meia, tudo bem!

Final da tarde, tivemos ensaio do coral e de lá já emendamos para o Pub onde seria o show do nosso amigo, o que vai embora. O lugar era bem legal, atendimento simpático, espaço para dançar, beleza. No dia seguinte, Luiz me contou que depois de determinada hora havia, digamos, mais serviços sendo prestados no local por mocinhas também simpáticas e coroas mais do que suspeitos. Honestamente, não notei, nem me preocupou. E nem adianta me perguntar quantas doses de whisky tomei, porque nem quis saber, foram várias.

Não vi o tempo passar e queria que tivesse demorado mais. É bom estar entre amigos, continuaremos amigos, mas os momentos não voltam e prefiro curtir os que tenho até a última gota. A vida é uma só e, infelizmente, o fígado também! Vou logo avisando que nem chorei, mas não tenho culpa da quantidade de fumo do local e os olhos às vezes lacrimejaram sozinhos.

Chegamos em casa quase de manhã e ainda tive a pachorra de fazer bife acebolado, na tentativa inútil de acordar melhor. Deveria ter feito isso no início da noite e amenizado as coisas para o lado do meu estômago. Não fiz e paguei o preço na manhã seguinte. A cabeça ia bem, obrigada, mas uma azia do cão! Botei o mundo para fora, inclusive o tal do bife. Paciência! Depois de uma semana seguida de festas, em algum momento haveria consequências.

Não, não me arrependi, mas foi um esforço herculano para ficar boa o mais rápido possível. Porque no sábado à noite era a despedida oficial, the ultimate! Me arrastei para fora da cama bem umas oito da noite e lá fomos, Luiz e eu, para o Kabocla.

Putz! Não estava passando nem um pouco bem, e acho que era porque também estava um pouco triste porque eles iam embora, sempre faz diferença em como seu corpo recebe o teor alcóolico, bom, comigo faz muita diferença.

Aviso que o mais próximo que tomei a whisky nessa noite foi guaraná com gelo! Pelo menos a cor parece, né? Enfim, o açucar foi fazendo seu papel, a atitude sempre ajuda e fui melhorando.

Levamos alguns instrumentos e já me posicionei na lateral da banda com meu tamborim. Isso, com algum custo, ainda aguentava e sei lá quando terei outra oportunidade. Não fui a única, um monte de gente se revezou em instrumentos que trocavam de mão de vez em quando. Para ser sincera, achei que toquei mal pacas nessa noite, mas a verdade é que estava todo mundo meio descompensado e sorumbático. Ou então, era eu que estava sorumbática e ouvindo meus próprios pensamentos.

Não quero passar a impressão errada, porque não foi triste, era só a consciência que mais um ciclo havia fechado. Ainda que o protagonismo da mudança se devesse ao casal, somos um grupo. El último camello de la fila camina a la misma velocidad que el primero. O que toca a um, toca a todos, só não sei quando será minha vez, mas sei que é feliz quem vai com saudade, quem fica também.

Pelas tantas, consegui ingerir uma única caipirinha, na tentativa de puxar o último fôlego, um sprint meia boca. Mas tudo bem, até que ainda deu para dar uma dançadinha de vez em quando.

Pela madrugada, quando acabou o show, eu que tinha passado mal o dia todo e consequentemente não aguentei comer, estava com uma fome alucinante! E aí, onde vamos? Uma amiga lembrou de um africano que vende salgadinhos à moda brasileira na frente de uma boite de prostitutas no centro da cidade. Isso dá samba, né? Mas sem problemas, os salgadinhos eram de muito melhor procedência que o interior da tal boite e lá fomos nós, em 6 amigos. Talvez isso no Brasil fosse perigoso, aqui não, a rua está sempre cheia e existe um considerável respeito entre as pessoas. Vou contar que me atraquei com um espetinho de frango e um risólis de carne moída divinos! Quentinhos! O mocinho ainda tinha refrigerante gelado, guardanapos, ketchup picante… serviço completo! Adorei a dica e fiquei freguesa! Qualquer dia voltaremos lá para provar o tal risólis de camarão, que segundo minhas amigas que conheciam o africano, é imperdível!

No domingo, acordei cansada, mas passando bem. Está pensando que acabou? Nada, ainda tinha a feijoada do Kabocla! Chegamos pelas duas da tarde e falei para o casal que vai embora: gente, não leva a mal não, mas não aguento mais me despedir de vocês! Almoçamos em quatro casais, todos com cara de zumbis! Disse para a outra imparável, por favor, vamos combinar de não fazer mais nada essa semana!

E assim, oficialmente estavam terminadas as despedidas.

Por costume, não falo o nome das pessoas normalmente, mas acho que, nesse caso, cabe bem. Artistas merecem divulgação e reconhecimento. Vai embora de Madri Afonso Rodrigues e a música brasileira do lado de cá do oceano perde bastante. Não é todo mundo que faz diferença no ambiente que convive, tenho a sorte e o privilégio de conhecer algumas pessoas assim, que deixam legados. Da minha parte, posso dizer que nos últimos anos, cantei bem mais alto do que de costume, dancei curtindo sozinha no meu planeta e acompanhada também, batuquei no canto ou me atrevi tocando mais forte quando já não tinha importância se estava no tom certo. Mas para isso tudo acontecer, alguém tinha que puxar e esse cidadão puxava, segundo Luiz, e o que concordo plenamente, ele faz o palco crescer, quem está em volta fica melhor. E ele é melhor ainda ao lado dela, amigona, mãe, profissional e tá bom, liga para a gente de madrugada e é meio mandona. Mas vamos combinar que o show é muito mais divertido quando a gente escuta aquela voz no fundo: toca Afonso!

Maratona das despedidas iniciada

Vou logo avisando que o fim de semana começou na quarta-feira. Como é que isso pode dar certo, né? Mas vai dar, o importante é a atitude.

Na terça-feira, liga um amigo, marcamos em uma terraza amanhã, vocês vão? Ah, não sei, não prometo nada, tem milhões de coisas para fazer, acho que não vai dar.

Falei com Luiz já avisando os motivos pelos quais não dava para a gente ir, afinal, a semana ainda estava no meio… estávamos ocupados… uma alergia do cão e o bar é em um parque, ou seja, nevava pólen… tenho que preservar a voz para quinta… minha garganta está um lixo… é longe de casa… estou com dor de cabeça… a gente vai se encontrar depois mesmo… blá, blá, blá… Na quarta, quando chegou do trabalho, ele me perguntou, e aí, nós vamos? Minha resposta foi a mais lógica e coerente possível: claro que sim.

Aspirina, ginseng, aerosol nasal para alergia e vamos nessa! E assim foi, quarta-feira e a gente no bar. Tudo bem, não exageramos, como contei antes, tenho tentado preservar um pouco de fôlego – e o fígado – para o final da maratona.

Quinta-feira, show de reagge no Siroco, mistura de aniversário e de despedida. Passei o dia me alternando entre desenhar e fazer trancinhas rasta. Em paralelo, a música que cantaríamos rolava no computador. Não vou negar que estava meio ansiosa, essas coisas são diferentes para mim, às vezes nem eu acredito que tenho coragem de subir em um palco e cantar. E dessa vez, com um microfone só para mim, que mêda! Uma das lavadeiras, que expliquei o porquê do nome no post anterior, avisou que estava afônica. Ah, nem vem que não tem! Entre cházinhos, água e sei lá mais o que, no final, também deu conta de ir.

Contando assim, parece até que éramos a atração principal da noite, coisa que está longe da verdade. Entretanto, como sempre conto minha versão da história, essa foi a parte que vivi. Não me importava se era uma, dez ou vinte músicas, o negócio era subir no palco, encarar o microfone e mandar ver da melhor maneira possível.

Chegamos bem cedo no local, Luiz conseguiu chegar a tempo do trabalho para ir antes comigo. E chegar cedo foi a melhor coisa, fazia isso em apresentações de negócio também. Sempre gostei de chegar antes, checar os equipamentos, ver os participantes entrando… você coloca as coisas em perspectiva, do tamanho que realmente são.

Encurtando o suspense, deu tudo certo. Quando o show começou, já estava mais relaxada, dançando e curtindo a noite. Gosto de dançar reagge e estava no clima. Além do mais, a casa estava cheia de amigos e conhecidos, o que sempre nos deixa mais à vontade. Quando chegou nossa vez, deu um pouquinho de nervoso para começar. Durante a música, de vez em quando dava um branco da letra, mas como éramos três, felizmente, os brancos se alternavam e, para quem não sabia, poderia até achar que era de propósito. Foi uma adrenalina gostosa e quando acabou deu até vontade de mais. Pensando bem, considero um privilégio poder dividir palco com músicos tão bons de verdade, em uma casa conhecida e respeitada. Um luxo!

A noite seguiu até pouco mais da hora da Cinderela voltar, mas foi bem aproveitada e parecia que era mais tarde. Não bebi muito, duas doses de single malt, bebida que infelizmente não encontro em todos os bares. Tudo bem que a segunda dose foi mais caprichada, eu amo as doses madrilenhas, são sempre muito bem servidas. Enfim, antes de vir para casa, passamos em uma lanchonete e comi um hamburguer para não ter risco de ressaca.

Acordei bem e daqui a pouco tem mais. Afinal é sexta-feira, não preciso mais cuidar tanto da garganta e da voz, amanhã Luiz não trabalha…

Lá vamos nós e outra vez, vê se isso pode dar certo?