Hoje, 03 de março, embarco de volta a Madri, o avião sai às 22:25hs em direção a Londres, onde faço conexão para Espanha. Chegarei no meu destino final amanhã por volta dàs 18:00, hora local. Ou seja, uma longa viagem, afe!
Até breve!
Hoje, 03 de março, embarco de volta a Madri, o avião sai às 22:25hs em direção a Londres, onde faço conexão para Espanha. Chegarei no meu destino final amanhã por volta dàs 18:00, hora local. Ou seja, uma longa viagem, afe!
Até breve!
Na segunda-feira, o dia finalmente amanheceu lindo! O que permanece até hoje e espero que se prolongue. Faz calor, mas não reclamo. Acordar de cara para o mar é um privilégio ímpar, e com sol então, é correr para o abraço!
Iniciei a semana resolvendo os pepinos, que nem eram tão graves assim, mas queria ficar tranquila depois. Meu título de eleitor estava cancelado, precisei tirar outro porque esse ano renovo o passaporte. Foi relativamente simples e na própria segunda já tinha um novo documento em mãos. Na terça fui ao dentista e a partir de quarta comecei a procurar os amigos.
Pela manhã, caminho na praia com minha mãe, o que já me rendeu ombros vermelhos e ardidos. Tudo bem, tomei vergonha, assumi que sou branquela e voltei a usar protetor 50.
O aniversário do meu pai é uma história à parte. Em princípio, ele disse que não queria nada, que não estava assim tão bem, as pessoas iam viajar no carnaval, não teria ninguém aqui e tal. Então tá, fazemos um jantar só para a família, afinal de contas, vim de tão longe…
Encurtando o assunto, o tal jantarzinho básico já está em uma festa para 50 convidados confirmados, podendo aparecer mais alguns! Juro que nem fui eu que toquei o barata voa, só acendi o pavio… de um barril de pólvora! Porque estou careca de saber em que casa nasci e que levamos mais ou menos 15 minutos para montar uma bagunça. Sei que estão todos alvoroçados, sem saber onde vai caber tanta gente, mas no fundo, conheço esse filme e vai dar tudo certo.
E é assim que deve ser, a vida é para ser celebrada. Quando perguntam a minha mãe uma sugestão de presente para trazer ao meu pai, ela responde, acho que ele só quer amigos, o resto ele tem. Entendo perfeitamente e essa lição tive a sorte de aprender bem cedo.
Então, entre uma coisa e outra, estou ajudando a organizar a festa. Compramos fantasias, decoração, bebidas, comidinhas, enfim, o circo está armado. Amanhã chega minha tia, irmã dele, que faz aniversário exatamente no mesmo dia, 23 de fevereiro.
Hoje jantei com amigos muito queridos no Artigiano, meu amigão do Caminho de Santiago, amigos que ele me apresentou e outro amigo espanhol apresentado por eles. Amizades contagiosas! Cheguei em casa feliz por encontrá-los e morrendo de rir sozinha, lembrando das histórias que meu amigo do Caminho contou para o maître. Sim, porque fui apresentada como assessora do rei de Marraquech, que chegaria na semana que vem ao Rio. Vim antes para preparar todo o esquema da visita. A propósito, também fui treinada pelo Mossad e, apesar dessa minha frágil aparência, posso matar calmamente com minha écharpe! Asseguro que fomos levados a sério e ao final da noite, ganhei um cartão da casa para fazer a reserva de um eventual jantar do rei. Se lembrar de algum amigo com pinta de brimo, juro que levo lá na semana que vem!
Agora é madrugada, um dos poucos momentos que o computador está livre para escrever. Aqui a disputa é acirrada! Entre meus pais e eu, ficamos esperando uma brecha para ocupar o espaço internético.
Amanhã a programação também promete ser intensa, do jeito que gosto. No fim das contas, não é que estou curtindo a viagem?
A viagem foi confortável, apesar de longa. Acordei às 4 da matina, peguei um avião para Londres, que saiu pontualmente às 7:00hs. Por volta do meio dia, saí de Londres em direção ao Rio, quase 12 horas de vôo. Balançou um pouco, mas nada tão grave. Aterrizei com chuva. Meus pais foram de taxi me esperar no aeroporto. Esperava pela minha mãe, mas meu pai foi junto, bom sinal.
Não queria viajar no dia 12, não gosto desse número, mas era o que dava. Depois fiquei sabendo que no mesmo dia houve dois acidentes de avião, sendo um em Londres, e um terceiro avião bambeou ao pousar em Madri. Enfim, desses me livrei.
Ainda no taxi, soube de uma notícia triste, um enterro logo pela manhã. Uma amiga jovem e viúva, palavra que soa pesado como seu significado. Infelizmente, nem sempre a vida é justa.
No dia seguinte, não acordei tão tarde e fui fazer compras com meu pai. Achei que ele estava caminhando bem, na verdade, achei ele muito bem de modo geral. A idade chega e as limitações continuam, mas não se pode reclamar.
Na saída do elevador, cumprimentamos o porteiro mais simpático, em seguida o jornaleiro. Atravessamos a feira e desviamos do caminhão mal estacionado no caminho, afinal de contas, o motorista estava conversando com o feirante. Desviamos das pedras portuguesas meio onduladas pelas raízes das árvores. Passamos pelo boteco da esquina, quando nos ultrapassou o Biriba, o vira lata de um barraqueiro da praia, que naquele dia não foi trabalhar porque chovia. Não tem problema, os guardadores de carro e pinguços do bairro o cuidam, ou vice versa. O Biriba é muito independente, branco com manchas pretas nos olhos, às vezes também passeia com outro cão todo negro, mas esse não sei como chama, ainda. Na farmácia, um amigo do meu pai do clube, na calçada outra amiga. Já quase na esquina de casa, um policial barrigudinho. Definitivamente, havia chegado ao Rio.
Para o aniversário do meu pai, trouxe o que acredito ser o que mais goste: comida. Dessa vez, não foi a pata inteira, mas quebrei o galho e trouxe algumas embalagens de jamón ibérico de bellota, o melhor.
Passei o dia combinando de ir ao teatro com minha mãe, para furarmos à noite. Preferimos assistir o DVD do Ensaio Sobre a Cegueira. Quer dizer, meu irmão e eu, porque ela desistiu logo depois dos primeiros cegos aparecerem.
Hoje almoçamos no Zozô. Como é bom comer carne com gosto de carne!
Voltamos para casa e acompanhamos a formação do bloco Cutucano Atrás, bem na frente da nossa janela. Pensamos em descer, mas o chovisco desanimou. De qualquer maneira, por mais que estivessem empolgados, não era tanta gente assim. O hilário foi o desfile, que se restringiu a atravessar a rua e voltar! Juro!Parecia piada. Ainda estão tocando, com alguns foliões insistentes.
Agora mesmo começo a escutar uma batucada mais forte, deve ser o Boca Seca chegando, será que passarão aqui na frente? Daqui a pouco descubro!
… embarcarei para o Brasil. Sempre acho que vai dar tempo de escrever um texto antes da viagem, mas me enrolo com mala, mensagens etc. Então, mais fácil escrever de lá mesmo. Provavelmente, estarei em ritmo de carnaval, ou seja, só deus sabe quando publicarei novamente, mas vou tentar deixar o blog em dia (até porque, quando demoro muito a escrever, começo a esquecer as coisas. Não posso faltar tanto tempo à minha terapia, né?).
Meu vôo sai cedinho, às 7 da matina. Faço escala em Londres e sigo para o Rio. Isso quer dizer que pelas 21:30 do dia 12/02 pousarei na Cidade Maravilhosa! Imagino que zonza de sono, pois nunca durmo em avião, mas tudo bem.
Pelo que tenho acompanhado à distância, com a saúde da minha família, céu claro, algumas nuvens, mas tempo bom! Portanto, dessa vez espero aproveitar!
Besitos e até breve!
Na sexta-feira, nossas camisetas-abadás ficaram prontas. Fizemos uma reuniãozinha para distribuí-las, decidida em última hora como sempre. Seria complicado levar no dia seguinte, porque todo mundo já queria chegar vestido.
Não dava tempo para preparar grandes coisas, porque além do mais, estou esvaziando a geladeira e deixando as comidas prontas no congelador para o Luiz. Então, pedimos pizza e estamos conversados.
No sábado, o dia finalmente amanheceu ensolarado, o que instantaneamente me deixa de bom humor. Por volta dàs 13:00hs, veio a proprietária com mais um casal de vizinhos e fomos ajudá-la a terminar a mudança dos móveis que estavam no nosso apartamento. Todo mundo ajudou um pouco e foi rápido, ainda que meio pesado, principalmente para os dois homens. Aproveitamos o bom tempo e resolvemos arrumar nossa terraza também. Agora tínhamos espaço para a cama, que estava literalmente mofando no telhado! Desmonta daqui, lixa dalí, carrega para cá, encosta para lá… Nos deu algumas horas de trabalho não muito leve, mas conseguimos restaurar razoavelmente o tatami quase perdido e a estrutura de madeira úmida. Mas preferimos deixar para montar no domingo, afim de que tudo secasse um pouco mais.
Descansadinha básica no fim de tarde, para aguentar uma noite que prometia. Tratei de comer bem no jantar e tomar bastante líquido. Roupa confortável, contas do ilê e minhas inseparáveis botas de trekking velhas de guerra!
Pouco antes das 23:00hs, encontramos a galera imparável na Plaza de España. Seguimos em mais ou menos umas 40 pessoas, num ônibus fretado pelo El Doblón, local da festa. Metade dessas pessoas era o nosso grupo. E ali mesmo já começamos a bagunça.
Uma das amigas levou uma tesoura e deu uma de estilista para a ala feminina. No início, fiquei meio preocupada de não dar certo e esperei para ver os modelitos que iam surgindo com os cortes nos nossos abadás. Depois me animei e, realmente, ficou muito melhor.

Outro amigo levou pão e jamón para fazer sanduíches no fim da noite. Imagina isso? Um ônibus fretado, abadás e comida! Farofa total! Só faltou o franguinho!
Engraçado que no Brasil, há alguns anos atrás, acho que morreria de vergonha de fazer algo assim e agora acho tudo natural. Não sei, em parte, o fato de estar fora do meu país me faz importar menos com as opiniões alheias. Mas acredito que tenha também um componente de idade e da maturidade que teoricamente vem com ela. Gosto dessa sensação de liberdade em não me importar, de me sentir confiante em situações que antes me pareceriam bizarras; me interessa poder navegar em mundos e gostos distintos. E quanto mais relaxo, mais disfruto e mais entendo que não faz diferença o que fazemos, vale a intenção e a companhia. Importa um olhar mais atento, de preferência em um ângulo que não estejam prestando atenção, e a capacidade de extrair conhecimento de cada experiência.
Chegamos ao local e fomos muito bem recebidos. O lugar era enorme, o que me fez pensar que seria difícil enchê-lo. Felizmente, estava enganada, ao longo da noite lotou, mas sem ficar desconfortável.


Na verdade, não estávamos nada desconfortáveis! Chegamos cedo, ocupamos os melhores lugares e, por ser um grupo grande, parecia que estávamos na sala de casa, pelo menos, para mim parecia. Como sempre, tratei logo de acionar minha bolha pessoal de proteção, que me deixa imune e invisível a qualquer mal do universo.
O show dos nossos amigos foi 10, eles capricharam e acho que as outras pessoas também gostaram. Pequeno detalhe, ganhamos um agradecimento especial pelo microfone, juro! Algo como, agradecemos a presença dos Imparáveis que vieram de Madri prestigiar o evento! Isso com minha amiga atrás se acabando de rir e dizendo, ainda vamos fazer história! Sem falar do pessoal que perguntava onde poderia comprar nossa camiseta. Dava vontade de tirar onda e dizer, esse abadá não se compra, você tem que merecer!
E, definitivamente, honramos a camiseta imparável!
O pior é o seguinte, sempre tomo muita água enquanto bebo álcool, e muitas vezes Luiz me ajuda a lembrar disso. Acontece que dessa vez, ao invés de comprar água, ele comprava Red Bull, para ele claro, só que eu bebia. Ou seja, se já sou naturalmente elétrica, parecia que fui ligada em uma tomada 220W.
Enfim, pelas 5 da matina, nossa condução estava pronta para nos levar de volta a Madri. Óbvio que um cidadão do nosso grupo precisou sair literalmente carregado e não conto nem que me cortem a cabeça quem foi. Mas em caso de micos extremos, nada melhor do que ter amigos. Verdade que somos uns amigos meio sacanas, porque primeiro a gente fotografa, depois a gente ajuda, mas tudo bem.
A viagem de volta foi peculiar. Uns dormindo, uns enjoando, uns fotografando e eu de rodomoça ajudando a distribuir os sanduíches que nossos amigos levaram. E não é que bateram um bolão? Viva a farofada! Da próxima vez, deveríamos vender!
No ônibus mesmo, Luiz percebendo que ainda não estava exatamente cansada, foi logo avisando enfático: eu não vou voltar para casa caminhando, entendeu? Na Plaza de España pegamos um taxi! Achei que ele estava falando sério e me conformei, porque na prática eu e minha hiperatividade crônica voltaríamos para casa pulando em um pé só e assoviando. Quem mandou me dar Red Bull?
Ainda esperamos um pouco na praça, apoiando a operação resgate do amigo borracho, mas o importante é que tudo deu certo. Chegamos todos quase sãos e salvos. E felizes.
Pensa que acabou? Nada! Domingo nos restava uma cama japonesa com tatami pesadíssimo para montar. Queria deixar tudo arrumado antes de viajar, porque senão sobraria para Luiz sozinho. Deu um pouco de trabalho, mas melhor do que imaginava. O problema é que a pressa em resolver deixou um pouco de cheiro de umidade, e passo o dia colocando aromatizador no quarto. Tenho deixado a janela um pouco aberta, mas não dá para ser muito tempo, estamos no inverno. Vamos ver se resolve, espero que sim, porque apesar da nossa cama ser meio trambolho, gosto dela.
E assim, dei por encerrado o pré-carnaval. Agora a cabeça já embarcou na próxima viagem. Embarco na quinta-feira, com destino à cidade maravilhosa e, se tudo der certo, uma ligeira aterrizada em Sampa. Amigos do outro lado do oceano, dia 12 estou chegando!
Será que em algum momento o sol vai raiar novamente?
E não, não é um lamento poético! É que parece que mudei para Londres! Cadê o sol?
E os imparáveis continuam sem parar…
No próximo sábado, 07 de fevereiro, haverá uma festa brasileira, que pelo que entendi, será pré-carnaval. Nosso amigo músico vai tocar lá e os imparáveis já garantiram presença, é claro!
Modéstia às favas, quase todo bar adora que a gente compareça, porque as pessoas são muito divertidas e, ao mesmo tempo, todos adultos e ninguém quer confusão. Ou seja, gente feliz, consumindo, animando o ambiente e ainda por cima sem provocar problemas! É o sonho dos donos dos locais, pelo menos dos inteligentes. Resultado, várias vezes nós ganhamos drinks, convites etc.
Dessa vez, o lugar em questão parece que é bom, ainda não conheci, mas me deram boas indicações. Entretanto é longe pacas! Daí, nosso amigo músico e sua esposa conseguiram negociar com o dono que contratasse um ônibus para nos levar. Isso mesmo, um ônibus!
Bom, já que é garantido que vamos chutar o pau da barraca e chegaremos todos juntos, por que não um abadá? E isso é o legal desse grupo, porque não importa o absurdo sugerido, todo mundo topa na hora!
A outra imparável fez logo o desenho das camisetas, que ficarão prontas amanhã.

Acontece que a história foi espalhando e agora temos um monte de gente querendo entrar para a comunidade no orkut ou pedindo para comprar a camiseta! Segundo minha amiga do logotipo acima, já podemos começar a vender camisetas, calendário, chaverinho… quem sabe seja uma alternativa para burlar a crise! Tá aí, quem sabe? Na volta do Brasil vou pensar no caso, porque isso dá muito trabalho.
Voltando à próxima festa, para mim será legal, porque não estarei no carnaval em Madri com esses amigos e é uma maneira de aproveitar um pouco também.
Por incrível que pareça, não fiz grandes planos para o carnaval no Rio. Porque juro de pé junto que só vou agora porque é o aniversário do meu pai. Quer dizer, isso era pelo menos até ontem, quando descobri que quem está num fogo danado é nada mais nada menos que minha mãe! Deve ser genético. Sim, minha mãezinha me convenceu a ir assistir ao Bola Preta! Daí perguntei se ela topava ir no ensaio da Portela também e ela foi investigar com meu irmão. Ai, ai, ai… que mêda!
Mas uma coisa de cada vez, e por enquanto, o carnaval que tenho garantido é o do dia 07 e com abadá e tudo!
Para quem mora em Madri e quiser participar da bagunça, segue a propaganda:
Grupo Kabesamba, com o melhor da música brasileira, sábado dia 07. Local: El Doblon (www.doblon.es), Avenida Príncipe de Asturias, 94, Villaviciosa de Odón. Quem quiser ir no ônibus, se ainda houver lugar, sai da Plaza de España às 23:00hs por 15€, incluindo entrada e 3 copas.
Muita gente continua me perguntando se não é chato o fato do Luiz viajar frequentemente a trabalho. Para mim, chega a ser uma pergunta engraçada, porque na prática, mesmo que quisesse, nem teria com o que comparar. Sempre foi assim.
Casei na ponte aérea, e nesse caso, quem viajava era eu, foi minha opção sair do Rio. Lembro na festa de casamento as pessoas me perguntando, e quando você volta para o Rio? E eu, não volto. Então, quando Luiz vai para São Paulo? Não sei. Respondia isso com muita naturalidade, e confesso que tinha um prazer meio malvado e irônico em perceber o ar de interrogação do outro lado. Gente que não conseguia entender como aquela equação funcionaria. E eu é que não ia explicar. Resulta que aí já havia entendido que nossa decisão estava tomada, o resto era circunstancial.
Quando finalmente Luiz mudou para São Paulo, nós dois trabalhávamos com consultoria e ambos viajávamos. Talvez por isso tenha sido mais fácil compreendermos que era desgastante e cansativo o suficiente estar constantemente fora de casa, para ainda ter que administrar crises de carência, insegurança ou cobranças. Era assim porque era assim.
Hoje em dia, na verdade, já há algum tempo, não viajo mais por obrigação, mas ele sim. E há anos a cada vez que Luiz viaja, minha mãe me pergunta preocupada, que chato, você não se sente sozinha? E minha resposta é sempre a mesma: não. Não tenho nenhuma dificuldade em ocupar meu tempo, então para que ficar enchendo o saco? Melhor guardar a saudade para a volta e pronto, resolvido.
E falando em ocupar o tempo, essa semana começou animada. Na segunda-feira, chegou em Madri uma amiga que conhecemos em Atlanta e mantivemos contato desde então. Às vezes, nos encontramos pelo mundo para aproveitar algum evento. Ela decidiu, às pressas, vir à Espanha, esquiar no fim de semana em Formigal. Na volta, dormiu uma noite em Madri e seguiu viagem para os EUA. Portanto, só tínhamos aquela noite para nos encontrar. Foi pena Luiz não estar, porque somos todos amigos, mas para mim foi ótimo ter um programa inesperado para uma segunda-feira.
Fomos a um restaurante chamado Aldaba, indicado por uma amiga dela espanhola. Muito bom, ótima comida e atendimento bastante educado e atencioso, eles possuem uma excelente carta de vinhos e um sommelier considerado entre os melhores no país. Claro que isso era apenas o contexto, fui mesmo para encontrar com ela, mas se o ambiente era agradável, a comida era boa e o vinho corretíssimo, ficou perfeito.
É curioso ver como as distâncias pelo mundo se tornam cada vez mais relativas. Há 15 anos, em São Paulo, Luiz ainda não havia mudado para lá, fui designada para um projeto em Osasco. Lembrando que nesse momento, não havia internet e pouquíssimas pessoas possuiam um celular, nós não tínhamos. Desculpe o francês, mas pensei… fodeu! Se casar na ponte aérea já era considerado uma ousadia, como é que vou morar em São Paulo, trabalhar em Osasco e ir todo fim de semana para o Rio? Ainda por cima meio dura, não tinha mais que 25 anos e mantínhamos duas casas. Não era tão impossível como soava na época, tanto que aqui estamos, muito bem, obrigada. A questão é que agora janto em Madri, com uma amiga de Atlanta, falando ao telefone com Luiz na Alemanha. E é normal.
Ao mesmo tempo, se alguém nos chama para sair nos arredores da cidade, achamos longe. Afinal, o que é perto ou longe? O que nos interessa classificar como longe? Quanto custa ser perto? Entender as distâncias e ampliar a capacidade de percorrê-las também amplia nossa capacidade de pensar?
Acho que essa será uma daquelas crônicas que conta tudo de uma vez! Nada demais, a rotina básica imparável.
Na quarta-feira, dia que jantei com a princesa, cheguei em casa por volta da uma da manhã. Luiz chegaria do Cairo pelas 3:30 ou 4:00hs, resolvi esperar acordada escrevendo. Já estava querendo clarear quando fomos deitar.
Por outro lado, dormimos até quase meio dia e Luiz trabalhou à tarde de casa. Assim que à noite, logo depois do coral, ainda tinha disposição de dar uma passadinha no Kabocla. É que nosso amigo músico foi tocar por lá, em uma festa brega. Isso mesmo, uma autêntica festa brega brasileira, com todas as músicas cafonas de direito. No final, o palco foi aberto ao público, que disputou os troféus banana de prata e abacaxi de ouro. Foi engraçado!
Pela meia noite, ele ficou com sono e teria que acordar cedo na sexta, então fomos embora.
Na sexta, preparei uma feijuca para sábado à noite. Deixei tudo organizado porque no sábado à tarde tínhamos uma despedida de um amigo que voltava para o Brasil, ele acabou seu doutorado aqui.
Sábado à tarde, caipirinha, pão de queijo e blá blá blá até umas 19:00hs, quando corremos de volta para casa. Nossos amigos, do clã dos imparáveis, chegariam pelas 21:30hs para encarar a feijoada. Para o jantar ficar um pouco mais light, uma das amigas trouxe uma picanhazinha ligeira com farofa para a entrada. Fora as sobremesas que também vieram.
Nós não pegamos muito pesado porque fui logo avisando que, primeiro, os vizinhos tem limite, né? Segundo e mais importante, no dia seguinte pela manhã a proprietária do apartamento vinha buscar alguns móveis. Já imaginou ela encontrando o povo dormindo pela sala? Ia logo pensar que estava sublocando o imóvel! Esses imigrantes, viu?
A verdade é que todos estavam muito comportados, porém não menos animados. E logo depois da feijuca, começamos a jogar Desafino. Para quem não conhece, é um jogo de dicas para o grupo acertar uma música. Admito que não tenho paciência para nenhum jogo, a não ser que seja exigida fisicamente. Fora isso, fico completamente entediada e me distraio. Então, fiquei mais ou menos de juíza café com leite. Resultado, roubei um pouco, mas para os dois lados! E quer saber, não fiquei nem um pouquinho entediada, porque me acabei de rir com as pérolas que saiam uma atrás da outra.
O curioso é que, entre tantas bobagens, veio à tona o tal do pagodão (afe!) que fomos no último domingo e a história do mini amigo que ninguém sabia quem era. Chegaram a conclusão que ele não existia, foi nossa imaginação. Isso foi crescendo de uma maneira, que agora a mini pessoa, little people para os íntimos, se converteu na nossa própria entidade fake, com direito a personagem, biografia e até data de aniversário.
Tudo muito bom, tudo muito bem, umas três e meia da matina eles foram embora. O que para as pessoas em questão, é bem cedo.
Luiz e eu ainda demos um jeitinho na casa, afinal a proprietária viria pela manhã. Acontece que no domingo nevou para burro! Ela acabou desistindo de vir cedo, uma pena que já havia acordado quando descobri isso, mas sem problemas.
Nosso condomínio é um conjunto de dois prédios e ela alugou um apartamento no mesmo condomínio, no outro prédio. Ou seja, somos praticamente vizinhas. Não sei se isso é bom ou mau, mas acho que pode facilitar algumas coisas.
Primeiro, o fato dela ter alugado um apartamento demonstra que realmente não pretende que a gente saia agora. E se der algum pau por causa do marido, encaminho logo o assunto e pronto. Aliás, trocamos de telefone fixo e espero que a uruca se vá com o número antigo.
Lá pelas 19:30, ela veio aqui para ver os móveis que levaria e tal. O problema é que os amigos dela só poderiam ajudar durante a semana, que tenho toda tomada. Então, a gente se ofereceu para ajudar a levar o que era mais importante. Lá fomos nós com mesa, colchão, almofadas etc. Talvez ela volte amanhã pela manhã para pegar o resto, mas com isso o apartamento dela já fica habitável. E o nosso ganha espaço. Como adoro espaço!
Hoje, Luiz foi para Alemanha e volta na quinta. Chato, porque uma amiga nossa americana de Atlanta dorme em Madri só essa noite, vamos jantar mais tarde.
Amanhã é dia de encontro de Lulus, oba! Jantamos aqui em casa mesmo e a fofoca da irmandade das perucas coloridas está garantida!
A viagem para o Brasil se aproxima a passos largos, nem acredito que já será na semana que vem! Dia 12 embarco e vamos que vamos!
Não mudei de time, não é um elogio a uma mocinha bonita, muito menos uma ironia a um cidadão afetado, é um título de nobreza mesmo, a princesa. Não que ela se lembre ou tenha percebido, mas isso é menos importante. Aliás, ignorei o protocolo e ainda cheguei depois dela! Quem pode, pode; e quem não pode, tira onda.
Foi assim, tenho uma amiga consultora que morou aqui em Madri e depois saiu rodando o mundo. Agora ela está novamente em um projeto de uns cinco meses por essas bandas, acabou de chegar e ligou para a gente fazer alguma coisa. Luiz ainda estava no Cairo, então marquei com ela e outra amiga em comum de jantar fora ontem, quarta-feira.
A nossa amiga em comum é mexicana e nos reservou mesa em um restaurante da mesma nacionalidade que ela considera entre os melhores da cidade, o Tepic. Não é que seja chiquerrésimo, mas é bem charmoso, tem uma boa relação custo/benefício e a comida é realmente acima da média.
Nos sentamos e ela me mostrou um painel no fundo do restaurante que era uma foto do metrô na cidade do México em tamanho natural e tal. Na frente, notei que havia duas mulheres, mas não reparei muito, estava olhando a foto. Quando volto a olhar minha amiga, ela me pergunta, você viu quem está ali? Ali onde? Na frente do painel, é a princesa!
Claro que não tinha reconhecido, até porque ela estava sem maquiagem nenhuma. Depois foram chegando outras amigas dela, todas mulheres, acho que umas oito, por aí. Não olhei muito, porque afinal de contas, sou carioca. Portanto, adestrada a ver gente famosa na rua e nem ligar, tá? Vê se uma carioca vai dar essa bandeira, nem morta!
É verdade que estávamos bem mais interessadas nas nossas próprias conversas, mas tirar uma ondazinha pode, né? Pois então, o restaurante tem duas salas pequenas. Nessa sala, onde estávamos, elas se sentaram bem do nosso ladinho e na mesa de trás ficavam os seguranças. E mais ninguém.
Ai, ai, como é duro ser VIP! É verdade que voltei para casa de metrô. Devia ter pego um taxi, pelo menos mantinha um pouco do glamour!
Faz já algum tempo, nem me lembro mais quanto, Luiz me chama de “Bianca, a Imparável”. Concordo que tenho uma certa energia meio exagerada, mas é até melhor que a gaste em atividades, caso contrário, saio pifando relógios, queimando lâmpadas, uma coisa meio poltergeist. É bizarro, o que posso fazer? Eu nasci assim, eu cresci assim, eu sou mesmo assim, vou ser sempre assim…
Mas o fato é que o apelido acabou pegando. Temos um casal de amigos que saímos sempre e também são muito animados, daí, passamos a ser o clã dos imparáveis. A coisa foi crescendo, amigos se agregando, e vamos combinar, ninguém para! Inclusive, exercemos uns nos outros um efeito catalizador de bobagens e tudo ganha uma dimensão despropositada e muito divertida.
Então tá, acontecia o seguinte, saíamos no fim de semana e chutávamos o pau da barraca. Na segunda-feira, começavam os e-mails de um sacaneando o outro. Pior, aos poucos a gente começava a lembrar das histórias e isso rendia trocentos e-mails. Imagina como o trabalho da galera estava produtivo, né?
Até que a outra chica imparável resolveu abrir uma comunidade no orkut só para a gente. Primeira providência para sexta-feira: uma festa para inaugurar a comunidade, claro! O marido dela ofereceu a casa e lá fomos nós!
Não sou dedo duro (que segundo as novas regras do português, não tem hífen) , então não vou contar o que aconteceu. Afinal de contas, temos um pacto de silêncio! Só vou contar que alguém resolveu me acompanhar no whisky… Não estou tirando onda, mas tenho uma resistência anormal à bebida, aviso e ninguém presta atenção! Não é que fique 100% sóbria, simplesmente é muito difícil me derrubar – além de beber litros de água em paralelo, não misturar, beber devagar, me alimentar, não dirigir etc. Resumindo: não tentem fazer em casa sem uma injeção de glicose muito próxima ou um marido deveras paciente! Adoro companhia, é agradabilíssima, mas não é seguro!
A questão é que até isso vira piada no dia seguinte. Na nossa comunidade, já há um tópico reservado para as desculpas de segunda-feira. O fato que alguém pagará um micão é garantido, nos resta saber quem será a bola da vez. E quem mesmo está preocupado?
Complicado foi acordar no sábado, porque tínhamos um almoço na casa de amigos não imparáveis, mas também muito legais. Felizmente, foi tudo light, bem tranquilo, porque estávamos o pó! Eles tem um casal de filhos adolescentes surpreendentemente agradáveis, daqueles raros que sentam à mesa, conversam com naturalidade, você entende o que eles falam. Impressionante, há esperança na humanidade!
Bom, à noite dei uma folguinha para o Luiz, a verdade é que também estava meio cansada. Depois, no domingo à tarde ele tinha que ir para o Cairo, a trabalho.
Em princípio, ficaria em casa mesmo. Acontece que no domingo à noite tinha show do amigo-músico-imparável, que a propósito, estava tomando suquinho de goiaba, ainda de ressaca da sexta! Acho meio chato sair sem Luiz, mas é mais chato ainda ficar em casa, não tenho paciência para televisão. Uma amiga ofereceu carona e lá fomos para o show, era cedo, começava às 20:00hs. Beleza, então vamos.
Tudo muito bom, tudo muito bem, encontrei alguns amigos dos imparáveis, outros rostos conhecidos, lá pela meia noite acabou. Legal, dentro do planejado.
E desde quando a gente consegue seguir alguma coisa planejada?
Bem no finalzinho, chega um conhecido que é músico e amigo de quem me dava carona. Ele tocava aquela noite em uma boite que é o seguinte, algum tempo atrás, os jogadores do Real Madrid começaram a frequentar. Diz a lenda que o Robinho organizava um pagode ou algo assim… o Casillas vivia lá depois dos jogos… essas coisas que devem ser verdade, mas não sei bem, porque nem pagodão nem jogador de futebol faz parte dos meus interesses. Entretanto, sim que faz parte do interesse de muitas meninas de vida não tão fácil. Imagina o quadro! Pois é, porém, aparentemente, os músicos eram realmente bons, inclusive chegaram a abrir o show do Seu Jorge, quando ele veio a Madri.
Minha carona disse que morria de curiosidade de escutá-los tocar e conhecer o tal lugar, mas podia me deixar antes em casa se me incomodasse. Fiquei naquele dilema do onde-é-que-estou-amarrando-minha-égua e não-tô-fazendo-nada-mesmo. Estávamos em três meninas, mais o músico que tocava lá e um mini amigo dele. A gente não pagaria nada para entrar. Outras pessoas conhecidas que estavam no primeiro bar também se animaram. Bom, se havia um dia seguro para ir, era aquele. Então vamos, se a barra pesar a gente vai embora.
Acho que a melhor descrição da noite é que foi uma experiência. No local havia gente normal também, alguns bem estranhos, nada demais, nada agressivo ou que nos ameaçasse. Mas também havia muitas meninas, digamos, trabalhando. Então, melhor não relaxar, ainda que nos divertíssemos. Umas mulatas estratosféricas, enormes e que sambavam para caramba! Confesso, era intimidador. Logo agora que estava começando a acreditar que sambava um pouquinho. E a propósito, mesmo não sendo uma fã de pagodes, reconheço que a banda era boa.
Melhor que nos intervalos, quando tocava funk carioca, um monte de músicas que não conhecia. Minhas amigas e eu nos acabamos de rir das letras, o que era aquilo? Puxa, não me considero uma pessoa puritana, mas fico com vergonha de repetir os refrões. É um tal de rala isso aqui, esfrega aquilo ali, pega não sei onde, que raio de letra é essa? Não levanto bandeiras contra o funk, até vejo um movimento social bastante interessante, é que às vezes me passa a sensação que se perdeu a mão. Mas enfim, essa é outra discussão.
De repente, se formou um trenzinho que foi crescendo e se transformando em uma roda de esquisitos. À medida que crescia, minhas amigas e eu íamos nos afastantando na mesma proporção, quando a água bateu no joelho, voamos as três para o fundo do local, quase em uma coreografia combinada. Já protegidas, buscamos a mini pessoa que nos acompanhava e descobrimos que ele havia sido tragado pela roda esquisita. Não que parecesse muito insatisfeito. Viramos para o lado e havia um telão gigantesco com umas imagens mais eróticas do que me deixariam tranquila. Olhamos uma para outra, ok, vamos brincar de outra coisa, né? E tratamos de puxar nosso carro!
Vim brincando com minhas amigas que ninguém falou comigo, não me propuseram nada indecoroso, não me ofereceram nem cafézinho! Isso abala o ego feminino, devo estar velha! Brincadeiras à parte, na prática, nada de mau nos aconteceu porque nem demos abertura para isso. Não vou negar que foi uma noite divertida. Mas havia uma sensação intrigante e incômoda que depois fiquei pensando.
Ainda que em nenhum momento tenha visto alguma cena explícita ou tido nenhum contato alheio ao nosso grupo, podia notar um ar pesado no ambiente. Não pelo risco, que não havia, mas as pessoas me pareciam em uma busca frenética e cega. Uma necessidade de prazer por alívio, nada muito pensado. Com o samba, esse clima se dispersava um pouco, a batida é mais alegre. No funk, a batida é de sexo, puro e duro, não falo das letras, é que soa como um mantra hipnótico. Não julgo, é uma opção e totalmente contemporânea, mas não é a minha opção e ali só vi solidão.
Cheguei em casa e foi bom saber que tinha uma, foi bom pensar que amo alguém e agarrei meu gato. Mas me senti solitária. Estranho, porque isso não é normal, a solidão raramente me incomoda, é que naquela noite me contagiou.
Depois passou. Tenho mais o que fazer, os dias seguem e sou parte dos imparáveis.
Pois é, a novela mexicana do nosso apartamento continuou. Agora temos o privilégio de assistir de camarote uma briga de casais se divorciando! Que delícia, né?
A pergunta seria: e o que mesmo nós temos com isso?
Pois temos o fato de viver em um apartamento alugado, cujo contrato está em nome dos dois. Só que tem um pequeno detalhe, eles não se falam, aliás, estão proibidos legalmente de se falar diretamente. Por aí se imagina como vai bem a coisa. Daí para onde o marido liga? Para onde a sogra liga?
Eu, que já amo um telefone, nem quero mais atender nada! Olho o número no identificador de chamadas, se é Luiz pego, caso contrário, que entre na secretária eletrônica. Mas isso é péssimo, porque afinal de contas, não podemos ficar de reféns na nossa própria casa.
A princípio, acho que o marido foi um belíssimo sacana, mas a verdade é que só ouvi um lado da história. O caso é o seguinte, também não tenho o menor interesse em ouvir o outro lado, não quero contato com ele, não gosto de gente negativa. Quero pagar meu aluguel, cumprir nossa parte e acabou.
O tragicômico é que deixamos nosso último apartamento justamente porque não aguentava mais ouvir as brigas do casal baixaria de vizinhos. E agora, nos vemos em pleno olho do furacão, porque o maior objeto de disputa dos proprietários é exatamente o lugar onde moramos.
Na prática, acredito que nenhum dos dois queira que a gente deixe o imóvel, porque o processo ainda deve levar um tempo correndo. Para ela não compensa estar com todas as despesas de morar aqui e para ele não interessa o imóvel vazio para ela entrar. Só que definitivamente, eles não nos conhecem tão bem e não sabem que não leva muito mais que cinco minutos para me enfezar, pôr a casa nas costas e partir para o endereço número 33, mais um, menos um…
Não tenho vontade de sair daqui, principalmente pela questão da nossa documentação que está correndo, e porque o apartamento é legal também, mas acho que já temos nossos problemas e não são poucos. Não vou ficar estressando Luiz e me aborrecendo, problema a gente resolve.
Hoje, Luiz optou por trocar nosso telefone, não é a situação ideal, mas acho que pode nos dar um pouco de sossego. Se isso solucionar, bem, caso contrário, lá vamos nós!
E ponto astrofe!
Durante minha vida, não me lembro de outro momento na história em que tanta gente tão diferente pelo mundo sentiu esperança ao mesmo tempo. E por que não? De vez em quando, é fantástico ter a sensação que o universo guarda um pouco de justiça, que o bem pode vencer o mal e que sonhos são possíveis.
Tá vendo? A gente fala as coisas, a vida vai lá e diz, ah é? Não fez ainda, fica dizendo que quer tentar? Então toma!
Ontem fomos a um bar brasileiro escutar um grupo de amigos que tocava nessa noite e, claro, encontrar mais um monte de amigos e conhecidos. Porque mesmo quem não se conhece, acaba entrando na dança.
Vou logo esclarecendo que não passei da segunda caipirinha, o que para quem me conhece, sabe que isso não me faz nem rir mais alto. Quer dizer, se pago mico é porque não ligo ou vacilei, e não pela influência etílica. Não tem desculpa!
Tudo muito bom, tudo muito bem, não demora muito para a gente começar a se acabar! Nós gostamos para caramba desse músico, porque além de ser realmente bom, ele é versátil e faz concessões para a galera se divertir. Sua mulher também é animadíssima e ambos se tornaram amigos queridos. Eles estiveram conosco na festa de reveillon, e portanto, presenciaram minha performance com tantam.
Em determinado momento, estava dançando um pouco mais no fundo com Luiz e escutei meu nome. Achei que estavam me chamando para dançar com as meninas que estavam mais à frente e fui no impulso. Quando já estava de cara para o palco é que entendi que o percussionista tinha ido ao banheiro ou beber alguma coisa, e o posto estava livre! Estavam me chamando para tocar com eles! Como assim?
Sabe aqueles momentos em que você tem certeza absoluta que se pensar por mais de três segundos, vai amarelar? Pois é, nesses casos, o melhor é não pensar e se jogar. No meio daquele vai, vai, vai… fui! Olhei com cara de assustada para o músico e perguntei, o que faço? Ele fez o som do pá pá pá que eu tinha que batucar e repeti a frase no tantam como um papagaio. E saiu! Sou suspeita para dizer se saiu bom ou mau, mas saiu alguma coisa, e isso para mim já foi um grande passo!
O percussionista voltou e no que tentei devolver seu instrumento, recebi de volta uma baqueta, estava batucando com as mãos antes. E assim ainda toquei uma segunda música, repetindo as instruções na base do pá pá pá. Percebi que a minha mão suava tanto que achei que a baqueta ia voar longe, mas não voou. Honestamente, não consigo nem me lembrar quais foram as duas músicas que participei, de tão concentrada que estava na batida! Foi como se estivesse tocando matemática, eram números ritmados em um compasso de tempo.
E agora, já posso colocar no meu currículo que também toquei percussão em um bar!
… eu não quero tudo de uma vez, não, eu só tenho um simples desejo, hoje eu só quero que o dia termine bem, hoje eu só quero que o dia termine muito bem…
O clip é apenas ilustrativo, não estou nele 🙂 É uma interpretação da música da Luciana Melo, Simples Desejo.
Passagem para o Brasil marcada! Vou para o Rio em 12 de fevereiro e volto em 3 de março. Tentarei passar por São Paulo, nunca é muita coisa, mas queria estar por lá pelo menos uns 3 ou 4 dias, vamos ver se consigo. Agora, até a data da viagem, sei que o tempo vai voar.
Ontem, voltamos ao coral, depois das férias de fim de ano. Faremos uma apresentação em março e terei que me virar para ensaiar sozinha do Brasil mesmo. A novidade é que vou tocar o tantam, ai que mêda! Não tenho mais vergonha de fazer apresentações cantando, bate um friozinho na barriga, mas é gostoso. Entretanto, tocando, será a primeira vez e acabarei chamando atenção porque acho que será o único instrumento grave e o que fará a marcação. Isso quer dizer que se errar qualquer coisinha, haverá uma seta vermelha apontando para minha testa, e ainda atrapalho o grupo.
Uma coisa é tocar aqui dentro de casa para amigos levemente alcoolizados. Outra totalmente diferente é estar em um palco fazendo isso! Mas tudo bem, mesmo dando um pouco de preocupação, no fundo estou achando o máximo. Quem não arrisca…
Hoje já dei uma treinadinha, batuquei junto com clips no youtube. O meu termômetro em relação aos vizinhos foi o Jack. Ele não suporta barulho e ficou deitado bem próximo, sem se assustar ou fugir. Isso dever querer dizer que realmente toquei suave.
Quero ver se também consigo montar um portfólio para levar para São Paulo e tentar agendar alguma exposição por lá. Está me batendo os cinco minutos de fazer alguma coisa nessa área e sei que pela Espanha é mais complicado para mim.
Ando meio chateada de estar morando aqui, no apartamento. Depois de saber que é alvo de disputa e de infelicidade, fiquei sensível e o aproveito menos. Em teoria, nós não temos nada com isso, mas é difícil ficar totalmente fora. Ontem mesmo, o ex-marido da proprietária ligou para cá, pressionando com algumas perguntas. Por mais que não entre no jogo, é bem desagradável, me sinto mal. Ao mesmo tempo, não é o momento de sairmos, a não ser que sejamos realmente obrigados, então é melhor enfiar minha viola no saco e deixar isso para lá.
Acontece que mais uma vez estou nas mãos dos do-cu-meeeenn-tos, esses fantasmas que me atormentam desde que deixamos o Brasil. Agora temos um fantasma novo, a criiiiiiiiise! Não aguento mais as pessoas conversando em tom baixo e grave sobre seus possíveis efeitos, como se falassem de uma epidemia fatal que vem se aproximando. Em ambos os casos, mais que os efeitos colaterais, me preocupa a baixa da moral, o desânimo. E me irrita sentir as mãos atadas, talvez não estejam, mas sinto assim.
Minha vontade de ser mãe diminui proporcionalmente às possibilidades. Natural, essa opção sempre implica em uma crença no futuro e nas pessoas. Não estou evitando, mas me peguei mais de uma vez torcendo para o acaso negativo, o que não me parece um bom sinal. Alguma coisa em mim mudou por esses tempos e talvez o corpo tenha entendido a mensagem antes da cabeça. De uma maneira ou de outra, é bom saber que não carregarei mais o peso da dúvida ou o da falta de coragem. É possível que seja a primeira vez que faço um real exercício de perda de controle e não enlouqueço, essa experiência me servirá.
Pero, bueno, um dia de cada vez. Hoje é sexta-feira, mais tarde sairemos com amigos. Sei que vou cantar, sorrir, conversar, pagar algum mico e pensarei que, no fundo, até que a vida é divertida.
Sobrou coisa para burro do reveillon, principalmente bebida alcóolica. Isso não é nem de longe uma reclamação, nossos amigos todos queriam colaborar com a festa e somos uns exagerados na filosofia que é melhor sobrar do que faltar.
A questão é que espaço é algo restrito e já não tinha mais onde colocar garrafas. Por sorte, estava bem frio do lado de fora na varanda, lugar de onde as cervejas não sairam desde então, uma geladeira natural e ao ar livre. Sem contar com as travessas, tupperware, panos, pratos, formas e outro monte de coisas que ficaram esquecidas.
Pois então, marcamos o enterro dos ossos, com o objetivo de tomar ou levar tudo que sobrou. Dessa vez, ficou claro que seria uma reunião light, primeiro porque estava todo mundo morto, segundo porque não acredito que os vizinhos fossem tão condescentendes uma segunda vez, sem ser a noite de ano novo.
Primeiro tentamos marcar para o dia de Reis, mas ninguém aguentava, marcamos então para sexta-feira, 9 de janeiro.
O que aconteceu é que durante essa semana os convidados foram baixando e divulgando as fotos da festa. Fomos nos dando conta que chutamos todos os baldes possíveis e imagináveis! Cada um lembrava uma parte dos acontecimentos e juntamos aquele quebra-cabeças bizarro que era tão engraçado quanto assustador.
Não vou contar as histórias, porque não são só minhas, mas valeu assunto para centenas de e-mails de um grupo de adultos que mais pareciam adolescentes que fizeram festa quando os pais viajaram. Uma cumplicidade quase infantil. Chegamos a conclusão que nas próximas festas deveríamos proibir a entrada de pessoas com máquinas fotográficas, filmadoras e boa memória! Melhor valer a velha máxima se-não-lembro-não-fiz, pronto.
De qualquer forma, ainda nos restava um arsenal etílico para dar conta.
Na sexta-feira, nevou em Madri como não acontecia nos últimos dez anos! A cidade parou em uma mistura de caos e alegria pela novidade. Na Espanha neva com frequência no inverno, mas na cidade de Madri é raro. Costuma nevar um ou dois dias ao ano e naquele esquema que quando toca o chão derrete. Dessa vez, nós tínhamos pelo menos 10cm de neve só na nossa varanda, bom para a cerveja que ficou lá.
Muito bem, pois então, melhor transferir a festinha para sábado. Infelizmente, muita gente já tinha outro compromisso e nosso grupo foi menor, porém não menos divertido. Tratamos de tirar fotos bem comportadas logo no início, sem copos de bebida alcoólica na mão, tomando água, performance conservadora total.
Nem tudo foi representação. O fato é que por mais que nos comportemos como adolescentes alucinados de vez em quando, falo por mim, o corpo nos recorda que isso não é de todo verdade. Ainda dou conta de farras homéricas, mas não sequenciais, coisa que meu marido discordaria. Resumindo, foi realmente tranquilo e tomamos muita água não apenas para fotografia.
No final, de uma mesa cheia de bebidas, algumas fechadas outras não, distribuímos o que restou de acordo com as preferências. Ainda há algumas coisas esquecidas, mas já não atrapalham para arrumar a casa. Umas três da matina demos a noite por encerrada, o que pode acreditar, para nós é bem cedo.
No dia seguinte, recebi outra hóspede, uma amiga desde os tempos de solteira no Rio de Janeiro, que hoje em dia mora em Munich. Em um vôo que veio do Brasil, seu marido seguiu para Alemanha e ela aproveitou a conexão para dormir aqui. Falamos até a língua ficar dormente e tenho dúvidas se atualizamos tudo. Acabou adiando a volta por um dia e ganhamos um tempinho a mais para fofocar.
Ao adiar a viagem, acabou me fazendo companhia para ir buscar minha carta de autorização de regresso a Espanha. Durante a renovação do meu documento espanhol, preciso dessa carta para deixar o país. É burocrático, mas felizmente deu tudo certo e não demorou nada. Eles estão mais organizados. Agora estou autorizada a viajar tranquilamente até meados de abril, quando espero estar prestes a receber meu documento renovado. Tenho planos de ir ao Brasil em fevereiro, quando meu pai fará 70 anos. Agora estamos correndo atrás das passagens, espero que dê tudo certo.
Nesses dois dias que minha amiga brazuca-alemã esteve aqui, caminhamos bastante, o que tenho sentido muita falta nos últimos tempos. Estou muito parada esportivamente falando e tenho me prometido com frequência que retornarei ao meu ritmo de caminhada. O frio atrapalha muito, mas definitivamente, notei que a falta de companhia talvez atrapalhe mais. Não dependo de ninguém para caminhar, mas sempre é mais estimulante ter uma meta ou alguém com você. Enfim, foi um começo, depende agora de mim tentar retornar.
Como ela conhece minha família, entramos no MSN com a webcam ligada para falar com meus pais. Primeiro falamos com minha mãe, que havia aprendido a fazer um monte de bobagens on line e estava se divertindo em nos mostrar os novos recursos que aprendeu. O pior é que era engraçado mesmo. Até que meu pai acordou, ele sempre faz a siesta à tarde, e se juntou a conversa. Ele estava impressionantemente bem! Para a gente, os mais próximos, que sabemos como ele é, como ficou e todo o problema, é mais fácil para perceber sutilezas, pequenas ou grandes melhoras.
Logo na semana seguinte ao AVC, ele teve um grande degrau de melhora, depois tudo foi muito devagar. Agora, é como se tivesse subido outro degrau, ele talvez não tenha notado, mas foi um grande passo. A única coisa que está muito difícil de voltar é a visão, os dois lados direitos de cada olho estão comprometidos. Como acho que devemos comemorar cada etapa, fiquei realmente muito feliz.
E assim encerramos a temporada de fim e reinício de ano, acho e gosto de acreditar que é um bom presságio. Sei que vem muita pedreira pela frente, mas prefiro pensar que o copo está meio cheio do que meio vazio.
Nosso primeiro dia do ano foi meio de recuperação, precisávamos descansar para repor as energias. Depois, quase tudo está fechado mesmo e não tem muito o que fazer na rua. Mas logo no segundo, nossos hóspedes queriam viajar para algum lugar próximo e fomos com eles a Córdoba, de trem rápido, o tal AVE.
Adoro viajar de trem, não acho nada cansativo. A única coisa é que só topava se não fosse tão cedo. Acho que ninguém queria acordar cedo mesmo, então saímos às 11:30, chegamos lá na hora do almoço.
Córdoba é uma gracinha e sua principal atração é uma gigantesca mesquita, para onde nos dirigimos assim que chegamos. É realmente fantástica e impressionante! Não sei oficialmente, mas pelo meus olhos, devem haver pouco mais que 500 colunas e arcos sobrepostos, com diferentes perspectivas, iluminações, mosaicos, portas, um caos bastante harmônico e rico. Ainda que seja um legado muçulmano, após a reconquista espanhola foi transformada em uma igreja e no seu interior há uma catedral cristã com elementos góticos e barrocos.



Visitamos também o Alcazar e caminhamos pelas ruas cheias de laranjeiras, com frutos maduros mesmo no inverno. Chovia um pouco e às vezes a gente precisava se abrigar em algum lugar, mas nada que atrapalhasse significativamente o passeio.


Uma coisa achei interessante, almoçamos e jantamos na cidade e ambos os lugares eram totalmente não fumantes. Sendo que no almoço era um restaurante bem tradicional e no jantar um restaurante e bar, o que é até mais surpreendente. Isso na Espanha é algo quase inacreditável! Os dois lugares estavam bem cheios e de espanhóis. Fico na esperança que a moda pegue!

Retornamos a Madri no trem de 22:30hs, mortos de cansados. Os meninos ainda se animaram a passar no Trifón, mas seria inútil, porque a hora que chegamos, a cozinha já estaria fechada.
No dia seguinte, nossos amigos iriam embora à noite, com uma conexão em Frankfurt. A idéia era fazer algumas comprinhas durante a tarde, jamón, vinhos, essas coisas. Entretanto, logo que Luiz acordou, foi se informar na internet e descobriu que havia se instalado um verdadeiro caos no aeroporto de Barajas e todos os vôos estavam atrasados. Uma mistura de greve dos pilotos da Ibéria e de controladores de vôo. Oficialmente, não estavam em greve, mas resolveram que ficariam todos doentes ao mesmo tempo.
Diante do quadro, Luiz acordou nossos amigos meio às pressas e resolveram ir direto para o aeroporto tentar pegar um vôo anterior para Zurich, mesmo que estivesse atrasado, o que aconteceu, tinham maior probabilidade de chegar a tempo para a conexão ao Brasil. Foi bastante tumultuado, mas conseguiram.
Os dias seguintes foram de faxinão, para entrar com a casa limpa, um dia só não foi suficiente. Com a sequência de festas, viagens e visitas, Maria aqui deixou o serviço acumular! Tudo bem, estávamos prontos para a próxima festa, que não demorou a chegar. Afinal de contas, e o clássico enterro dos ossos? Como é que ficava?



Nossa terraza


O que mais duas pessoas adultas, maduras e sensatas poderiam fazer em um dia como esse?



O importante é agir naturalmente



Nem sei por onde começar, as últimas duas semanas foram daquelas que parece haver passado todo um ano, o que não é de todo mentira.
No Natal, fizemos ceia em casa para alguns amigos, poucos. Foi bastante tranquilo e me senti muito bem. Não fiquei melancólica. Falei com minha família pelo MSN e, através da câmera, participei um pouco do jantar brasileiro do outro lado do oceano. Do lado de cá, as comidas deram certo, sinal que estava em equilíbrio. Quem me conhece sabe que quando não vou bem, salgo a comida e se estou dispersa, queimo. Até a casquinha de siri funcionou!
Muito curioso, o fato de ter vindo uma amiga que estudou comigo no primário, em Brasília! Ela mora em Turin e de vez em quando, passeia por essas bandas. Tantos anos depois, é bizarro e legal passarmos o Natal juntas em Madri. Voltas que o mundo dá.
Fizemos amigo ladrão, na minha opinião bem mais interessante que o chatérrimo amigo oculto. Comemos bem, brindamos com cava, tomamos um bom vinho e conversamos sem grandes compromissos. Na saída, precisei distribuir quentinhas, porque como exagerei só um pouquinho nas comidas, nem espaço na geladeira tinha mais! Ótimo, porque no dia seguinte, todos tínhamos alguma mordomia.
Dia 26, morgação total e última oportunidade de deixar as coisas em casa encaminhadas para a maratona que se aproximava.
Dia 27, chegaram dois casais de amigos hóspedes, não se conheciam, um casal chegou de Natal (a cidade) e só dormiria uma noite, o outro veio de São Paulo, para passar o Reveillon. Passamos a tarde toda tomando vinho e beliscando coisinhas até a hora do jantar, agendado no Trifón. Uma delícia como sempre!
Por volta de meia noite, nossos hóspedes estavam caindo pelas tabelas, muito razoável após uma viagem internacional e toda a programação em seguida. Os acomodamos em casa e partimos para a próxima etapa.
Claro, ainda tínhamos uma festa de aniversário para ir. Afinal de contas, somos sócios-fundadores do clã dos imparáveis! Temos uma reputação a zelar. Uma noite de sábado em Madri, dificilmente se encerra depois do jantar. O pessoal da festa ainda seguiu para uma boite no fim da madrugada, mas essa parte nós pulamos. Voltamos para casa por volta das 3 da matina.
Às 9:30h já estávamos de pé, um dos casais partiria para Marrocos, queria me despedir e Luiz os levou ao aeroporto. Mais tarde, seguimos com o outro casal para o Vale de los Caidos e Segóvia. Jantamos tarde, no El Barril.
Dia 29, passeio a pé pelo centro da cidade. Sempre digo que Madri deve ser conhecida caminhando. À noite, nos acabamos de comer no El Rincón de Jaén. Digo os restaurantes, porque estão entre nossos favoritos. Come-se divinamente, vinhos corretíssimos e atendimento gentil e profissional.
Acho que para conhecer qualquer lugar é fundamental experimentar sua gastronomia, é uma maneira literal de digerir parte da cultura. Acredito que seja na mesa um dos lugares que mais se aprenda sobre as pessoas. Foi nas tabernas e restaurantes madrileños onde mais aprendi sobre o melhor lado dos espanhóis, à sua maneira, são generosos, informais, gostam de gente e da sua proximidade. Tem defeitos também, o que os faz tão humanos quanto o restante do planeta, mas se existe um momento em que me sinta mais integrada nesse país, é na mesa.
Nos dias 30 e 31, tinha muito o que fazer em casa. Dispensei a rua e tratei de organizar a farra que se aproximava. Muita coisa havia adiantado, mas sempre há o que só se pode fazer no dia ou na véspera, para que esteja tudo fresco. Um rocambolíssimus enormous de carne recheado, antepasto de beringela assada, tender no mel, pernil no suco de limão, farofa com bacon, salada de batata com cream cheese, frutos secos, salpicão de frutos do mar e algumas outras coisas que devo estar esquecendo agora. Nossos amigos trouxeram mais, torta salgada, folhados deliciosos, arroz com lentilha, frios ibéricos, salgadinhos e por aí vai. Sem falar das sobremesas, tiramisú, pudim, chocolate, tortas, tudo de bom!
Um dos amigos disse que não andava muito bem e trouxe sua sopinha em um tupperware. Confesso que lhe dei uma recomendação irresponsável, deixa isso para lá, se a comida não te fizer bem para o corpo, te fará para a alma e você ficará muito mais feliz! Não sei como ele passou no dia seguinte, mas a sopa ficou intocada na nossa geladeira.
Recebi as pessoas portando asas de anjo, para deixar claro que estávamos em outra dimensão. Pelas minhas contas, éramos pouco mais que quarenta pessoas e todos trouxeram bebidas. Isso quer dizer que tínhamos um arsenal suficiente para abrir um bar! Adicione a essa equação o fato de sermos muito amigos, estarmos à vontade, após a grande maioria passar um anozinho dos infernos e ser noite de Ano Novo. Bombástico, né? Após uma semana, ainda seguimos tentando nos lembrar de acontecimentos inexplicáveis durante a festa!
O fato é que estávamos em uma boa onda total! A noite de reveillon, para mim, é a mais importante do ano, a única que tenho fé. É uma noite de esperança mundial e de alguma maneira, essa energia deve circular pela terra. Os problemas não são resolvidos em um passe de mágica, Gaza está aí para nos lembrar, mas é um momento em que acredito no fundo do coração que eles podem ser resolvidos. E essa crença me deixa poderosa e feliz. Não sou porta voz das outras pessoas, mas tinha essa sensação que era geral, todos conhecíamos os problemas alheios e não me lembro de tocar ou ouvir esses assuntos, porque nesse momento não importava mais, estávamos imunes, protegidos.
Na verdade, é possível que tenhamos acreditado que essa proteção era também sonora, porque tenho quase certeza que fizemos o edifício tremer! Veja bem, a possibilidade da polícia estar ocupada era bem grande, então, quem é que ia se preocupar com o ruído de uma festa particular? Contamos com isso e botamos para quebrar! Tínhamos música ao vivo! Dois músicos que sabiam o que estavam fazendo, ou quase, nas cordas, e um monte de curiosos na percussão com instrumentos diversos.
Pois me acabei de tocar o tamtam! Nunca toquei tão bem na vida, ou nisso acreditei naquela noite. Realmente espero que ninguém tenha gravado, assim poderei manter minhas ilusões. A verdade é que na manhã seguinte, havia esfolado a pele do meu dedo indicador direito, o que dá alguma indicação da suavidade com que estava batucando. Não era a única alucinada, pois o cajón do meu amigo também se partiu. Ou seja, se nessa intensidade estávamos tocando, imagina como esse som se propagava pela vizinhança. O problema é que as pessoas tiram fotos, assim não podemos negar coisas que nos parecem absurdas. Por exemplo, havia algumas onde apareciam Luiz e eu tocando… violão! Desconfio, porque certeza ninguém tem, que ocupávamos o cargo a cada vez que eles levantavam para beber alguma coisa. Outra vez, realmente espero que ninguém tenha gravado!
A essa altura, minhas asas já tinham circulado e estavam em minha amiga imparável, que por algum motivo, não conseguia abrir os olhos de jeito nenhum! Mas o sorriso seguia, assim como seguiu em todos.
Meia noite, estávamos no terraço, taças de cava na mão, 12 uvas na outra, e fogos de artifício estourados pelo Luiz. Entre gente querida, pensamento dividido aqui, no Rio e em tantos lugares por onde passamos, recebemos 2009. E já nem achava 2008 tão ruim, não me cabia mais rancor nem tristeza, seria até injusto.
A festa seguiu madrugada afora e pelas 6:00hs da manhã, comecei a assar o pão caseiro divino, que uma das convidadas trouxe. Foi servido com café, frios e manteiga Aviação. Ninguém deu muita bola para os frios, todo mundo matando a saudade de casa com pão quentinho e manteiga derretendo.
Pelas 7:30, de vassoura em punhos, pedi arrego! Jack, que ficou preso no quarto tranquilo, estava miando, doido para sair. Era dia claro, o que indica que passava das 8:00hs, quando fomos dormir.
Quando levantei, pelas 14:00hs, me dei conta que não tinha só metido o pé na jaca, como pisado fundo até o joelho! É verdade que estava cansada, acho que não parei muito por toda a festa e não desci do salto. Mas não me lembro em nenhum momento de ser um fardo, pelo contrário, era divertido voar de lá para cá, com minhas asas de anjo ou de abelha ocupada, como gosto de estar. Devo ter pago meia dúzia de micos, espero que sim, e não importa porque estava entre amigos. O whisky não me subiu à cabeça, parou no coração, e não tinha um pingo de ressaca.
Levou alguns dias para por a casa em ordem, também aproveitei para fazer o mesmo com as idéias. Foi tudo lavado, roupas de cama, chão, forro do sofá. Agora começo a fazer limpeza de papéis e coisas que não usamos. Sempre gosto de começar o ano zerada, mas esse ano foi um pouco diferente.
O começo de um ano é também a quebra de um ciclo, onde costumo ter essa sensação de recomeçar, de deixar para trás o que passou. Dessa vez, não tenho vontade deixar mais nada para trás, porque já ficou, já passou e o que levo é a experiência, que ninguém nos toma. São só figuras de linguagem, maneiras diferentes de dizer ou ver a mesma abstração, porém traz uma nova atitude. E talvez, seja esse meu recomeço.
Hoje, posso falar sobre quarenta pessoas, todas diferentes, e que não consigo imaginar a mesma festa sem a contribuição de cada uma, individualmente. Temos outros amigos, com e sem problemas pelo mundo, mas tenho a confiança que encontrarão os melhores caminhos. Luiz, Jack e eu, seguimos juntos e com saúde. Nossas famílias estão envelhecendo, é parte da vida e ainda há muita energia para tocar o barco, eu sei que vai chegar o dia em que não haverá, mas não será hoje. Chegou 2009 e sobrevivemos, fomos capazes de sorrir e comemorar, algo de certo fizemos.
Sei que estou devendo histórias desde o Natal, mas é que ainda não parei um minuto, o que estou achando ótimo!
Passei só para dizer que está tudo bem e todos com saúde! Natal foi tranquilo e Ano Novo um festão, como deve ser.
Prometo contar tudinho em breve!
Besitos, Bianca