Meu prazo médio para arrumar toda a casa após uma mudança é de três dias. Não é que fique tudo impecável, mas nesse período tenho praticamente todas as caixas abertas e a casa funcionando.
Faço compras normalmente pela internet e já havia agendado compras básicas programadas para chegar em casa na quarta-feira, 16, dia seguinte à mudança. Assim que não houve nem respiro, já acordei botando para quebrar!
Dessa vez, como temos algo de espaço em um tipo de depósito no final do jardim, não nos desfizemos das caixas. Desmontei tudo, envolvi em plásticos para proteger e Luiz guardou lá atrás. Não parece nada, mas as caixas são um custo razoável na hora da mudança e a torcida do flamengo inteira já imagina que esse não será nosso último endereço, então, melhor guardá-las.
Na sexta-feira, era feriado. Nosso amigo que sempre dorme por aqui e tem carro, nos deu uma carona para buscar a escultura no apartamento antigo. Luiz deixou as chaves dele por lá e fiquei eu encarregada de voltar para entregar o apartamento depois. Ele também foi conosco ao Ikea, que é uma mão na roda para comprar as coisas para casa.
Precisávamos de armários, o espaço é bom, mas tinha pouco lugar para armazenamento e isso atrapalha bastante a arrumação. Compramos uns provisórios baratinhos e fáceis de montar. Aproveitamos e compramos também alguns móveis para o jardim, nada muito complicado ou caro, mas queremos aproveitar a área externa. Luiz é ótimo churrasqueiro!
A gente deveria aproveitar o resto do fim de semana para terminar de montar e arrumar tudo, mas depois de tanto trabalho, resolvemos relaxar e fomos tomar vinho com nosso amigo no jardim.
Ao longo da semana, corri tudo o que pude para deixar a casa pronta, porque meu irmão e minha cunhada estavam pela Europa e queria encontrá-los. Na verdade, havia combinado de ir na sexta-feira 25 para Berlin encontrar meu irmão, mas minha cunhada não estaria mais. Assim que tinha o plano malévolo de resolver tudo e ir antes para a Bélgica fazer uma surpresa.
Mas não deu certo e nem foi pela arrumação da casa, o problema é que precisava renovar meu passaporte brasileiro e minha data para entregá-lo ao consulado era exatamente no meio da semana, na quarta-feira 23. Dia em que descobri que meu agendamento havia sido feito errado, e perdi tempo indo ao consulado! Caraca, mil coisas para resolver e fui para o centro à toa!
Não foi de todo perdido, me informaram que poderia voltar no dia seguinte, para tirar minhas digitais e enviar a documentação pelo correio. Achei engraçado aquele negócio de ir até lá e ao invés de entregar os documentos, enviar pelo correio para o mesmo lugar que estava! Eu devo ter entendido isso errado! Não tem problema, vou assim mesmo e tento entregar os documentos pessoalmente.
Na saída, ameacei me aborrecer, afinal perdi o maior tempo à toa e ainda estava preocupada se conseguiria resolver no dia seguinte mesmo. Esse negócio de documentação é um perrengue para quem mora fora do seu país de origem. Ainda tentei aproveitar e ir para o trabalho do Luiz almoçar com ele, mas justo naquele dia, ele estava em um evento. Putz! Não é meu dia… Mas quer saber de uma coisa, dane-se! Vai se resolver e já que estou no centro, vou aproveitar! Sentei em um restaurante que adoro, especializado em ostras, tomei um vinhozinho ótimo e ainda usei o wi-fi para atualizar minhas mensagens. Afinal, levamos 3 semanas para ter internet em casa após a mudança, mas essa é outra história. Dessa maneira, apesar de não haver resolvido ainda, pelo menos meu humor estava melhor.
Dia seguinte, acordo eu bem cedo e toca para o consulado brazuca outra vez! Fui atendida, nem demorou muito e achei o atendente até bem simpático e com paciência para explicar tudo. Realmente, naquele dia só poderia tirar minhas digitais, os documentos (passaporte antigo, identidade, certidão de casamento, atestado que estava quite com a justiça eleitoral, foto, formulário do consulado e comprovante de pagamento da taxa) precisavam ser enviados pelo correio. Mas como assim, eu tenho que enviar para cá? Mas eu estou aqui! Eu trouxe um envelope, não posso colocar tudo bonitinho no envelope e entregar na recepção, igualzinho ao correio?
Não podia. É meio maluco, mas enfim, expliquei para ele a situação, que poderia precisar viajar ao Brasil a qualquer momento e blá, blá, blá… Ele me disse que era rápido, levava no máximo 5 dias úteis depois que os documentos chegavam. Como não havia outro jeito, pedi que ele checasse se eu tinha tudo certinho, ele checou tudo para mim e me entregou exatamente como eu deveria por no correio. Tirei minhas digitais e saí dali diretamente para uma agência, para não perder mais tempo.
Volto para casa, pensando em arrumar as malas para o dia seguinte. Felizmente, para Berlin não havia problema viajar, porque iria com meu passaporte espanhol.
Muito bem, chega à noite, minha sogra é internada e o estado parecia grave. E agora, o que a gente faz?
Caminhamos para onze anos fora do Brasil, a quantidade de vezes que já escutamos que alguém da família não estava bem e logo se reverteu é incontável! Mas sabe como é, essas coisas você nunca tem certeza. E ainda por cima, havia acabado de enviar meu passaporte brasileiro! Em princípio, não tinha nem como viajar para o Brasil! Há alguns procedimentos de emergência, mas como acabei de dizer, a gente nunca tem certeza se é realmente uma emergência até que realmente aconteça.
Bom, queria encontrar meu irmão, também temos poucas oportunidades assim. As passagens pagas, o hotel pago, inclusive por ele que queria nossa companhia. Quer saber Luiz, para ficarmos preocupados aqui, fico lá!
Assim que resolvemos manter o plano de ir na sexta-feira de manhã, mas Luiz estava agoniado e, por via das dúvidas, foi com uma mala maior e com os dois passaportes, caso precisasse ir direto para o Rio.
Não deu em outra! Chegamos em Berlin ainda cedo no Brasil, pelo fuso horário, e tivemos tempo de dar uma volta pela cidade, junto com meu irmão. Mas logo que o dia amanheceu pelo outro lado do oceano, as mensagens começaram a pipocar no seu celular e ele resolveu não arriscar. Não conseguiu comprar passagem para o mesmo dia, mas achou um vôo no sábado pela manhã. Fiquei com meu irmão até domingo, acompanhando por telefone o que estava acontecendo.
Domingo à noite, cheguei em casa, em Londres, na dúvida do que fazer. O momento era complicado, sem passaporte, acabávamos de mudar e tínhamos ainda algumas pendências para resolver, encomendas para receber, internet para instalar, chave de apartamento para devolver, eu tinha trabalho para entregar… mas ao mesmo tempo, preocupada com Luiz no Rio.
Honestamente, achei que tudo fosse durar mais tempo. Sabia que Luiz não poderia ficar direto por lá e pensei que o melhor era terminar de resolver as coisas por Londres, afinal tinham pendências que alguém precisava fazer e, se fosse necessário, ao invés de estarmos nós dois no Rio, me revezaria com Luiz na semana seguinte.
Não deu tempo. A situação foi se agravando progressivamente e a mãe dele faleceu no dia 29 de abril. Eu deveria estar preparada, não posso dizer que foi uma surpresa, mas francamente, não esperava que fosse tão rápido. Não havia perdido a esperança que ela melhorasse, ainda que soubesse que boa ela não ficaria.
Foi duro e mais dolorido por não estar ao lado do Luiz, mesmo sabendo que juntos estávamos.
Até hoje não estou totalmente bem, é uma mistura de sentimentos muito grande, por ela, por Luiz, pelos meus… De algum modo diferente mexeu comigo, abriu alguns canais, dúvidas, sei lá. Quase fui de toda maneira agora em maio, para ajudar Luiz a resolver qualquer pendência e, francamente, talvez fosse mais por minha causa mesmo, bateu saudade.
Acontece que não há muito o que fazer agora. Logo vem a malfadada Copa e tudo fica absurdo, além de nada se resolver. E, finalmente, meu pai deve fazer uma cirurgia em julho, então, o mais razoável é esperar.
Por outro lado, também não estou totalmente mal, me recuso a ficar. A gente segue tocando a vida. Semana passada tinha trabalho vazando pelas orelhas, nem sempre o mais agradável, mas é importante para mim voltar a ser “produtiva”, ou melhor, ganhar algum dinheiro pelo que produzo, né?
A casa nova é uma graça! Tem vários defeitos que nem ligo, em pouco tempo estou aprendendo a não vê-los. Com o passar dos dias, vem ganhando outra energia, cores, aromas… vida! Já recebemos os primeiros visitantes, fizemos churrasco, plantei ervas, colhi flores e começo a reconhecer uma meia dúzia de gatos que se alternam em turnos passeando sem a menor cerimônia pelo meu quintal temporário, sem me dar a menor bola, mas me arrancando sorrisos e alimentando a vontade de acolher o meu novo felino, arrumar nossa própria casa, algum dia, em algum lugar.