77 – Fim de semana mais ou menos light e ponto astrofe!

Eu me prometi, jurei de pé junto que esse seria um fim de semana light! Meus pais chegam na terça-feira pela manhã e quero estar descansada porque a agenda é selvagem.

 

Bom, mentira também não foi, porque ao menos estamos tentando chegar um pouco mais cedo em casa. O que quer dizer, antes do amanhecer.

 

Na sexta, fomos ao Picasso’s assistir a um amigo tocar. Em paralelo, havia um festival de paellas, infelizmente, deliciosas. Digo infelizmente, porque como sempre, estou tentando emagrecer. No sábado que vem, tenho um casamento e preciso caber no vestido! Aliás, esse negócio já está virando lenda.

 

Mas voltando ao Picasso’s, o lugar é uma mescla de confeitaria, bar e restaurante, bem bonitinho. Ali começou a trabalhar uma garçonete brasileira, o dono gostou da energia e acabou contratando outros conterrâneos, mas a comida é espanhola.

 

Estávamos em um grupo de umas dez pessoas. Como era um jantar, foi tudo mais tranquilo. Mas claro que no final, quando tínhamos basicamente só nós no recinto e o vinho havia subido em algumas cabeças, levantamos para cantar e dançar.

 

A essa altura, uma das amigas, que nem me lembro mais o que estava contando, quis dizer algo como fim de assunto ou ponto final e saiu nada menos do que um embolado e etílico “ponto astrofe”.

 

Hein? Ponto astrofe? E que raios quer dizer ponto astrofe?

 

Houve uma tentativa daquele momento negação, do tipo não-foi-isso-que-falei, mas falou e éramos duas testemunhas. Bom, eu não presto mesmo e a verdade é que achei a nova expressão muito criativa e sonora. Quer encerrar um tema? É definitivo: ponto astrofe!

 

Pois bem, no fim da noite, voltamos de taxi Luiz, eu e a amiga-astrofe. Os outros, de carona com uma amiga que conduzia. O engraçado e asqueroso da história é que na sexta-feira passada, essa amiga-motorista passou mal nesse mesmíssimo carro. Ficou toda sem graça, porque geralmente é a mais comportada desse grupo, mas sabe como é, às vezes as pessoas não estão em um bom dia para beber. Nessa noite, ela estava absolutamente sóbria, até porque seu filho estava no carro. Muito bem, mas ela levou outra amiga convidada, também super comportada e que falava pouquíssimo. Mal informada sobre a resistência das pessoas, nos acompanhou no vinho. E pela segunda sexta-feira seguida, o carro foi batizado! Já está parecendo maldição! Estamos sugerindo que os bancos sejam plastificados, ou que eles andem com aquele saquinho de enjôo de avião.

 

No dia seguinte, acordei bem e Luiz querendo gripar. Fomos fazer um dos seus programas favoritos, compras de supermercado no sábado! Tudo bem, também não gosto, mas não tinha jeito e precisava ser das compras grandes, quando me faz falta que ele vá de carro comigo.

 

À noite, fomos na casa de um casal que não podia sair, era o fim de semana de ficar com o filho dele. Achei ótimo! Programação calminha. Tomei um pouco de cava com suco de laranja, com uma certa caprichada no suco. Luiz nem bebeu porque estava dirigindo e, quem nos conhece, sabe que seguimos à risca a filosofia do se conduzir não beba, se beber, me chame. Enfim, comidinhas gostosinhas, papo bom, dvd de bandas brasileiras, tranquilo. A única coisa é que ele foi arriando da gripe e não ficamos muito mais do que a Cinderela.

 

Hoje vem uma amiga almoçar em casa, chegou de Brasília. Já deixei a comida pronta ontem, assim pude acordar sem pressa. Espero fofocar bastante e colocar a conversa em dia.

 

Mas meu narizinho que é bom, não pretendo por nem na janela. E ponto astrofe!

 

76 – Reggae night

Ontem, conheci mais um lugar, a Sala Siroco. É uma casa de shows pequena, mas interessante. Fomos assistir um grupo chamado The Mad Sensi Band, que fez uma homenagem a Bob Marley.

 

Bom, eu gosto de reggae e também da companhia em questão, mas estava meio cansada. Então, fui com o Luiz só para uma passadinha, conhecer, bater um papo e ouvir um pouco de música.

 

Acho engraçado essa capacidade que a música tem para reunir tribos específicas. Havia a maior concentração de cabelos, tranças e drads que já vi em Madri. Eu com a cara mais limpa impossível e Luiz com a roupa que saiu do trabalho. Ele me disse algo como, acho que estou destoando um pouco da galera. E eu, bobagem, devemos estar entre os únicos com idade para ouvir Bob Marley quando ainda estava vivo! Se há alguém na praia certa, somos nós, relaxa!

 

Relaxar inclusive não era difícil. Digamos que a maresia era contagiante. Pelo menos para mim, que não consigo deixar de respirar mais que alguns segundos. Mas tudo muito tranquilo, não vi confusão mesmo com a sala lotada. Aliás, essa é uma das características dos shows de reggae. Rastas grandes, cabeludos e pacíficos.

 

Infelizmente, não demos conta de ficar até o final. Plena quinta-feira fica meio complicado e nossa agenda já é bem agitada. Aqui, se você não presta atenção, acaba saindo todos os dias da semana e daí, haja energia e dinheiro. Estou tentando ser um pouco mais razoável e segurar a onda.

 

De qualquer maneira, gostei do lugar, tem um jeitão de clube londrino, ficarei atenta aos próximos eventos. Funcionam com concertos todos os finais de semana, de quinta a domingo. Tocam diferentes estilos e na sequência entra o DJ.

 

Hoje, vamos conhecer o Café Picasso’s, com show do Afonso Rodrigues, brazuca. Depois conto como foi.

 

 

75 – ¡Estoy cagando!

Hein?

 

Essa falta de privacidade espanhola ainda me surpreende!

 

Estava calmamente checando meus e-mails para começar o dia, o tenor da Renaut nem tinha começado a cantar. Aliás, acho que ele anda num mau humor de cão, não canta mais todos os dias e mudou o repertório para algo espanhol que não sei definir, talvez uma zarzuela.

 

De repente, não mais que de repente, escuto um berro aborrecido entrando pela minha janela: ¡que estoy cagando!

 

Jack seguiu o som com as orelhas, depois nos olhamos com nossa comunicação imaginária telepática, e a gente com isso?

 

Bom, lógico que me parti de rir sozinha e fiquei imaginando a cena. Alguém deveria estar procurando o cidadão insistentemente, até que o indivíduo, interrompido algumas vezes em sua função, gritou irritado o motivo de sua ausência.

 

Agora, se eu no prédio da frente escutei, que dirá quem estava mais próximo. Imagina a cara do cliente, que provavelmente deveria estar invocado exigindo uma resposta ao seu problema e não entendendo porque afinal de contas, ninguém lhe dava atenção! Até que escuta aquela frase definitiva e esclarecedora cortando o ar. Daí chega o assistente, com aquela cara amarela e diz, um minutinho senhor, ele está um pouco ocupado, mas já vem.

 

E quando o cagão terminar e vier cumprimentar o cliente com um aperto de mãos? Surgirá aquele momento constrangedor? Ou talvez essa seja uma preocupação feminina. Provavelmente, os homens se olhem com uma certa cumplicidade, tudo bem companheiro, também passo por isso todos os dias, desculpe interromper... o tempo mudou, não é mesmo? Será que vai chover?

 

74 – Outono

Setembro passou voando, mal peguei uma corzinha de verão e o outono chegou. Já estou branquela outra vez, mas menos manchada do que imaginei.

 

Da temperatura, não me queixo, bem mais agradável. Hoje começo a esvaziar a piscina e aproveitarei a água para limpar a terraza. A gente não lava as áreas externas aqui, é um desperdício grande, mas se a água já está ali mesmo, vou aproveitando para limpeza e plantas.

 

Meus pais se animaram a vir nos visitar e quero deixar a casa nos trinques. Chegam em 7 de outubro, foi uma viagem decidida meio na última hora, o que para eles é uma enorme quebra de paradigma. Também iremos a Roma e Barcelona e tenho absolutamente tudo reservado.

 

Até o taxi para nos buscar em Roma está acertado, é que, vamos combinar, o povo por lá não é o mais honesto do mundo. Acho que é uma coisa mais com turistas, não é considerado desonesto se aproveitar o máximo possível de um gringo. E isso, verdade seja dita, noto menos por aqui na Espanha. O espanhol pode não ser exatamente a criatura mais simpática do planeta, mas não costumam ser aproveitadores.

 

Engraçado que Luiz e eu normalmente viajamos no improviso e assim nos viramos muito bem, porque temos mais flexibilidade. Mas com meus pais, não quero arriscar, eles gostam de tudo certinho. E o curioso é que estou mais nervosa com tudo tão planejado do que fico nas nossas viagens porra-louca. Como sei que nenhum plano dá 100% certo, provavelmente precisaremos mudar alguma coisa, tudo bem.

 

Barcelona não me preocupa, é mais simples de percorrer. E o pior é que acho que eles estão curtindo mais viajar no trem de alta velocidade, do que os passeios por lá.

 

Em Madri, tenho algumas coisas em mente, dessa vez conhecemos bem melhor a cidade. Acho até que vou encarar um show de flamenco na Casa Patas. Nossos visitantes sempre querem ir, nós indicamos, mas tratamos de fugir da raia. Gosto de flamenco, mas acho que o proporcional no Brasil seria você gostar de samba, mas não ter saco de ir todos os meses assistir um show das mulatas do Sargentelli.

 

Enfim, estou me preparando para vestir o chapéu de turista. Às vezes, pode ser divertido, principalmente quando a gente relaxa.

 

O fundamental é a parte gastronômica, minha família, eu incluída, se ganha pelo estômago. Não pode faltar jamón Pata Negra, fuet, azeitonas, azeite de oliva, mariscos, cochinillo etc. A churrasqueira está a ponto. Luiz descobriu um brasileiro que corta carne galega como no Brasil, vamos ver se o negócio é sério.

 

E, obviamente, chega um novo carregamento de carne seca, paio e cachaça. Agora é torcer para passar tudo na alfândega.

 

Além dos meus pais, também chega uma amiga de infância para passar o mês, além de outra que chegou em setembro. Ou seja, outubro promete um certo movimento.

 

Depois, começam a ir embora um por um, e outros e outras mais. Família vem e vai, amigos vem e vão. Novembro será duro, mas é parte da nossa história. Poder sentir saudades também é um privilégio, é apenas a consequência.

 

73 – A primeira mamografia a gente nunca esquece

E o que tenho com isso? Acho que todos temos, ou pelo menos, todas. Sou do time das que adiaram até o último minuto para fazer a tal da mamografia. Hoje, me pergunto, por que demorei tanto?

 

É recomendado que se faça após os 35 anos e fundamental após os 40. Sou razoavelmente preocupada com minha saúde e me prometi realizá-la assim que fizesse 35. Muito bem, nessa idade fui à ginecologista e pedi o exame. Mas você fez? Porque eu não. Levei quase 4 anos até tomar coragem de verdade, fiz agora, com quase 39.

 

Por que adiei tanto? Difícil dizer, mas acredito que era um misto de nervoso e vergonha. Eu sei que é bobagem. Na verdade, sei que é bobagem para os outros, mas comigo, cada vez que imaginava um ser desconhecido pegando meu peito e fazendo um sanduíche em duas placas de metal, me dava calafrios. Arg!

 

Bom, da última vez que fui a médica, nem precisei pedir, ela mesmo já me passou a lista de exames, entre eles, uma mamografia e uma ecografia de mamas. Putz! Pensei, não tem mais como adiar, preciso fazer essa porcaria, vamos lá. Estava também desconfiada de um quisto no seio direito, mas não tinha certeza, melhor confirmar essa história.

 

Da consulta, fui direto agendar os exames. Para minha surpresa, havia vaga no mesmo dia para fazer a mamografia. Quer saber, se é para fazer, melhor que seja de uma vez. Lá fui eu arrastando uma tromba.

 

Veio uma mocinha, bastante simpática e eu como uma jeca fui logo dizendo, olha é a primeira vez que faço isso, dói muito? E ela, não, é um pouco incômodo, mas é rápido. E foi exatamente assim, não vou mentir, é incômodo, dá um certo nervoso porque você tem a sensação que aquilo vai te apertar sem controle, o que não é verdade. Dói um pouco, mas nada intolerável e é bem rápido. Honestamente, nenhum bicho de sete cabeças.

 

Muito bem, ainda faltava a ecografia mamária, que marquei para outro dia. Dessa vez, fui um pouco mais confiante, na pior das hipóteses, seria constrangedor, mas não doloroso. Fui em uma mistura de preocupação porque receberia os resultados e alívio por ter resolvido fazer tudo.

 

Na sala de espera, minha confiança diminuiu quando vi que era um rapaz que faria o exame. Ai, que mico! E por que raios preciso de dois exames mamários? Será que alguém viu alguma coisa? Por que não fiz essa bosta antes!

 

Como de costume, o problema imaginado é muito maior do que o real. Na prática, o médico que me atendeu não podia ser mais profissional. O exame foi rápido e absolutamente indolor. Outra vez, pensei no motivo de fazer tanto drama para uma coisa tão simples.

 

O quisto que estava desconfiada existe. Felizmente, sem suspeitas de malignidade, só preciso acompanhar. Mas o fato é que está lá e podia ser pior. E se fosse pior, os quatro anos que adiei o exame não teriam ajudado em nada.

 

Mas pior mesmo é saber que as mulheres ainda são muito mais atentas à sua saúde que os homens. Querendo ou não, é bastante normal que uma mulher esclarecida visite sua ginecologista todos os anos. Mas quantos homens conhecemos que vão a um urologista ou proctologista em sua vida inteira? Quantas piadinhas homofóbicas e ignorantes mais irão surgir enquanto o câncer da próstata cresce firme e forte?

 

Quem não tem tempo para ir ao médico, mais cedo ou mais tarde precisará encontrá-lo para ficar doente, e quem tem vergonha de se cuidar pode descobrir da pior maneira que o pudor não tem nenhuma prioridade quando se quer sobreviver.

 

Portanto, o mínimo que posso fazer é um alerta. Prevenir não custa. Os exames são bem mais simples do que parecem, não tem nada demais. E por que não, aproveito para divulgar o website do http://www.cancerdemama.com.br/ ,  onde se pode contribuir com a Campanha da Mamografia Digital Gratuita e do INCA (Instituto Nacional do Câncer) http://www.inca.gov.br/ .

 

Meninos e meninas, se cuidem! Saúde!

 

72 – Utilidade pública: cidadania espanhola

Muita gente tem curiosidade ou interesse em saber como funciona o processo de pedido de cidadania espanhola. Não saberia citar todas as informações técnicas e legais a respeito, não sou advogada, mas não custa contar nossa experiência de maneira mais didática possível. Porque de burocrático, já basta o processo!

 

Quem tem direito a pedir a cidadania?

 

Pessoas casadas com um cidadão(ã) espanhol(a); filhos de espanhóis; netos de espanhóis, desde que comprovem um ano de residência no país; estrangeiros íbero-americanos residentes legalmente na espanha há mais de dois anos.

 

O visto de estudante não se enquadra nesse procedimento. Os interessados necessariamente devem possuir o visto de trabalho e/ou residência por, no mínimo, dois anos.

 

O que um estudante, ou outro residente, pode fazer é, após viver três anos no país, pedir o visto de trabalho por arraigo. A diferença desse visto em relação ao visto de trabalho normal é que, para conseguí-lo, a pessoa não precisa mais provar que não existe um espanhol que possa ocupar seu cargo. E sim, um estrangeiro para vir morar na Espanha com um visto de trabalho, precisa provar legalmente antes que não há um espanhol para o seu cargo. Depois de conseguir esse visto de trabalho, igualmente são necessários mais dois anos de residência no país.

 

Nosso caso, em particular, é o pedido de cidadania espanhola por residência, ou seja, após morar mais de dois anos no país e sendo cidadãos íbero-americanos. Luiz tem visto de residência e trabalho, eu tenho visto de residência como reagrupante familiar (esposa). Meu visto não me permite trabalhar, mas me dá residência legal e o direito a pedir cidadania.

 

O primeiro passo é ir até o Registro Civil, que em Madri fica na Calle Pradillo 66, e pedir uma cita. Cita em castelhano é uma consulta, reunião ou encontro. Para pedir essa cita é necessário apenas levar seu NIE, que é o documento de identidade espanhol para estrangeiros. Não é possível que algum portador peça sua cita, você precisa ir pessoalmente. Se é um casal, precisam comparecer marido e mulher com ambos os NIE’s.

 

Daí, no mesmo dia, você recebe um protocolo com a data e horário que deve comparecer para levar seus documentos. O tempo de espera para essa cita é muito variável, depende diretamente do número de pessoas que estão tentando o mesmo processo. Nossa cita levou nove meses de espera, no momento, está levando em torno de um ano e quatro meses de espera.

 

A documentação a ser entregue possui um prazo de validade de até 3 meses. Isso quer dizer que não adianta você pedir sua documentação com mais de 3 meses antes da data marcada para sua cita. Entretanto, é recomendável que se inicie a busca dessa documentação com pelo menos uns dois meses de antecedência, porque alguns desses documentos precisam vir do Brasil traduzidos e legalizados (já explico).

 

Abaixo a lista de documentos que precisam ser aportados. Eventualmente, isso pode mudar e convém conferir se a lista permanece a mesma no dia em que marcar sua cita.

 

1 – Escrito de solicitud normalizado y aprovado por el Ministerio de Justicia (é um formulário que se entrega no próprio edifício do Registro Civil ou através do website www.justicia.es)

2 – Original e fotocopia de la tarjeta de residencia (NIE)

3 – Original e fotocopia del pasaporte completo (cópia de todas as folhas, inclusive das em branco e com todos os carimbos que constam no passaporte original até esse dia)

4 – Certificado de empadronamiento (especificar no Ayuntamiento que é para o pedido de cidadania, pois deve estar assinado)

5 – Certificado literal de nacimiento del interesado/a. Apostillado, legalizado y traducido en su caso. *1

6 – Si está casado/a con español/a, aportará:

  • certificado de matrimonio expedido por el Registro Civil español correspondiente,
  • certificado literal de nacimiento del cónyuge español
  • DNI original y fotocopia de éste, así como ele certificado municipal de convivencia que se obtiente en Ayuntamiento donde se encuentren empadronados

6.1 – Si está casado/a con no español/a, certificado de matrimonio legalizado y traducido. *1

7 – Certificado de nacimento de los hijos menores de edad.

8 – Certificado de antecedentes penales del país de origen o certificado consular de buena conducta, debidamente legalizado.*1

9 – Certificado consular de nacionalidad (se obtém no consulado brasileiro em Madri)

10 – Medios de vida:*2

  • Copia de las 3 últimas nóminas y copia de contrato de trabajo
  • Copia del I.R.P.F. (declaración de la renta)
  • Certificado bancario (fotocopia cartilla bancaria)
  • Copia del contrato de alquiler o escritura de vivenda (levamos a cópia do contrato de aluguel, mas não foi necessário entregar)

11 – La documentación acreditativa de cualquier otra circustancia especial que se alegue como fundamento para adquirir la nacionalidad o reducir los plazos de residencia legal exigidos en el Código Civil.

 

> *1 – Toda documentação que vem do Brasil (certidão de nascimento, certidão de casamento e antecedentes penais) deve ser original. Não adianta cópia autenticada, precisa constar a data de emissão com menos de 3 meses da data da sua cita. A documentação também deve ser legalizada, ou seja, passar pelo consulado espanhol e pelo Ministério das Relações exteriores. Depois devem ser traduzidos por tradutor juramentado, ou como se diz em castelhano, intérprete jurado. Há empresas de despachantes que fazem esse processo, mas dificilmente se leva menos de um mês e é caro. Sai por uma ordem de grandeza de 500 euros por pessoa, mas se tiver alguém no Brasil que faça por você (pedido das certidões e legalização), esse custo reduz significativamente. Ainda assim, você precisará pagar pelas certidões, pela tradução juramentada e pelo correio.

> * 2 – Luiz e eu temos dois processos diferentes, que correm em paralelo. Como não tenho visto de trabalho, só o de residência, apresentei os “medios de vida” do marido.

 

Muito bem, com esses documentos em mãos, você volta ao Registro Civil no dia da sua cita e entrega tudo. No caso de você não conseguir todos os documentos a tempo, compareça assim mesmo à cita, com o que você tiver, e te dão mais três meses de prazo para entregar qualquer documento que falte. Recomendo fortemente que não falte documentação. Imagina a quantidade de gente que eles atendem todos os dias, você realmente quer voltar para o fim da fila e correr o risco que essa papelada não se encontre? Se não tiver jeito, paciência, no final das contas deve dar certo, me pareceram organizados, mas acho uma complicação a mais.

 

Bom, depois de entregar seus documentos, entre 3 e 4 meses você deve receber uma correspondência dizendo que a documentação está correta ou se falta algum papel. Daí também marcam uma entrevista. Acredito que passaremos por essa entrevista entre dezembro e janeiro de 2009 (isola!). Portanto, ainda não tenho certeza se esses prazos serão cumpridos ou se nos pedirão algo diferente.

 

Se estiver tudo certo, todo esse processo, desde a entrega dos documentos até o juramento da bandeira (sim, se você for aprovado, tem que literalmente jurar a bandeira espanhola), leva entre um e três anos.

 

A cidadania espanhola, nesse caso, não elimina a cidadania brasileira. Você passa a possuir dupla cidadania.

 

Difícil saber quais são as chances de sermos aprovados. Escuto muita gente dizer que estão negando a maioria dos pedidos, é possível, não há garantias. Por outro lado, também não sei se essas pessoas que estão sendo negadas conseguiram apresentar toda a documentação em ordem. Além do mais, também depende da situação econômica e social do país no momento, por exemplo, que tipo de mão-de-obra ou perfil de cidadãos estão buscando.

 

De qualquer maneira, estou otimista, fizemos nosso papel e agora é esperar cada passo a seu tempo.

Obs1: Se alguém leu e lembrou de algum passo que não comentei, fique à vontade em descrever nos comentários. São muitos detalhes e posso ter passado algum.

Obs2: Vou repetir, não sou advogada e não ganho nada com isso. Tudo que sabia está escrito no texto acima. 

Obs3: Nesse outro post há mais informações a respeito https://buracodafechadura.com/2011/05/25/nacionalidade-espanhola-perguntas-frequentes-texto-em-espanhol/

71 – Semi histérica

Estou quase surtando! Achei que estava sob controle, mas hoje me bateu uma ansiedade monstra.

 

Amanhã a gente entrega os documentos para pedir a cidadania espanhola. Está marcado desde dezembro, 9 meses de espera, sugestivo não? É realmente um parto e as filas estão cada vez mais gigantescas.

 

Os últimos documentos, traduzidos e legalizados, acabei de receber. Daí fui montar uma pastinha com tudo bem organizado, passando pente fino mesmo, e percebi que em uma das traduções faltava um carimbo. Quase tive um filho pelas orelhas! Liguei correndo para a pessoa responsável e acredito que daqui a algumas horas já tenha esse documento em mãos. Enfim, só para ir no suspense até os 45 minutos do segundo tempo.

 

É burocrático, caro e estressante! Mas se der certo vai ser tão bom e é nisso que estou tentando pensar.

 

Agora é cruzar os dedos. Fizemos nosso papel e está tudo redondinho, não custa dar uma ajuda à sorte. Amanhã bem cedo estaremos por lá.

 

Já vi que essa noite não prego os olhos.

 

 

70 – La noche en blanco

Em Madri, pela terceira vez, se celebrou La Noche en Blanco. Essa expressão em espanhol significa noite às claras, sem dormir. Uma vez ao ano, de sábado às 21 hs até domingo pelas 7 da matina, se realizam uma série de eventos por toda a cidade. São espetáculos e intervenções artísticas abertas e gratuítas para a população. Os museus e teatros abrem suas portas, o transporte público funciona sem interrupção, muitas casas de show não cobram ingresso e até alguns restaurantes e lanchonetes entram no jogo.

 

Veja bem, o que se consome é obviamente cobrado, mas o fato de tudo estar aberto, atrelado a cultura de sair à rua que o madrileño já possui em seu DNA, faz com que a cidade pulse uma noite inteira com gente passeando e disfrutando. Honestamente, chego a considerar um ato de cidadania.

 

E o fato de inverter o horário das atividades me parece genial. O mesmo evento realizado durante o dia, seria divertido. Mas realizá-lo durante toda a madrugada é quase subversivo. Altera imediatamente nosso olhar, vejo como arte.

 

Os eventos são divulgados com antecedência, porque participar de tudo é impossível, portanto você acaba elegendo seus pontos de interesse. Independente do que se escolha, a rua fica ótima para caminhar. É uma congregação que, conceitualmente, me lembra o reveillon na praia.

 

Nós optamos por um show de bossa nova na sala Clamores. Aliás, gostei muito do lugar, foi a primeira vez que estive lá. Tem um jeitão underground de jazz club. Temos uns amigos que iam tocar e nos reunimos em um grupo de umas quinze pessoas, nem todas no mesmo momento.

 

Foi legal rever alguns amigos que estavam fora de Madri e acabaram de voltar. Depois do show, viemos para casa, junto com mais três casais para continuar a beber e comer alguma coisa. Até havia o que comer na rua esse dia, mas não sabia. Normalmente, no mais tardar pelas duas da manhã, você só consegue beber. Acho um saco esse negócio de beber sem beliscar nada, me dá fome. Por volta das cinco e alguma coisa, todos se foram.

 

Por mim, teria caminhado mais pelas ruas, mas paciência. Minhas botas andam reclamando da ociosidade. Com a melhora da temperatura, espero voltar a ativa em breve. Além do mais, meus pais decidiram nos fazer uma visita, chegarão no início de outubro e estou bem animada por isso.

 

Enfim, no domingo não dormimos tanto, queria montar a churrasqueira nova. Nos animamos e compramos uma a carvão. A elétrica não estava dando vazão e com a temperatura esfriando, ficaria impraticável.

 

De domingo para segunda, ficamos sossegaditos. Luiz ainda está gripado e essa semana promete ser bem corrida.

 

69 – O superacelerador de partículas

Aguém prestou atenção na notícia do acelerador de partículas? A máquina mais poderosa do mundo.

 

Não me lembro mais onde li algo como, a melhor maneira de guardar um segredo é que todos o conheçam. Eu sei que sou a rainha da conspiração, mas por favor, outros neuróticos se manifestem!

 

Não sou contra, nem faço parte da ala profética que acredita que o mundo vai acabar através de um imenso buraco negro por causa isso. Aliás, essa historinha do teórico buraco negro me parece muito mais cortina de fumaça. Só acho que um evento dessa proporção está passando quase despercebido. Fico na dúvida se a imprensa não entendeu, se o público não entendeu ou se tem gente querendo muito que não seja entendido mesmo. Provavelmente, um conjunto de tudo isso.

 

Pelo menos por essas bandas, as notícias na TV foram quase patéticas e mais preocupadas em ridicularizar o tal do buraco negro do que explicar do que se tratava o assunto. Só consegui me informar melhor pela internet e mesmo assim mais ou menos. Ou seja, a informação é pública, mas passa no mesmo nível de importância das previsões metereológicas para a próxima semana.

 

Estamos simplesmente falando da possibilidade de recriar as condições no universo pouco depois do “Big Bang”, o que por si só é algo fantástico, quase ficção científica. Mas para os céticos, como eu, que não acreditam que se invista pura e simplesmente para o conhecimento e evolução humana, sejamos práticos, ninguém gasta mais de 10 bilhões de dólares em algo experimental se a contrapartida não puder compensar. Então, de que raios (ou Hádrons) estamos falando afinal?

 

Sou do tempo da guerra fria, do famoso botão vermelho que poderia acabar com o planeta, do filme “The day afther”. O tempo passou, até o muro de Berlin caiu e eu, besta, imaginava que a essa altura do campeonato estaríamos livres das guerras. Não sou tão ingênua, via outros problemas crescentes, mas novas guerras? Para meu constante espanto, elas só trocaram de nome, agora os exércitos se chamam forças para a manutenção da paz e as guerras, esforços para garantir a liberdade. Viva os americanos, os reis do marketing e das guerras. Mas vamos combinar que o resto do mundo aprendeu direitinho. E é aí que a vaca tosse, me preocupa se esse negócio de desvendar segredos do universo também não será transformado em uma metáfora de mal gosto.

 

Vou deixar meu ponto de vista mais claro, sou a favor. Do que consegui entender, acho essa parafernália show! Porém também acho que deveríamos estar, no mínimo, mais atentos e críticos ao que isso possa gerar.

 

68 – Somos o que decidimos ser

Então, tá. Acabou agosto e com ele a boa vida. Esse ano me despeço do verão meio nostálgica, como se o mês paralizado me protegesse do que está por vir. Não faço previsões pessimistas, mas sinto que por aí podem chegar mudanças importantes e mudança é sempre estressante, mesmo para quem não vive sem ela.

 

Engraçado isso, custei muito a entender que as mudanças também me assustavam. Não me lembro na vida quando tive uma rotina razoavelmente fixa e gosto de viver assim. Ou talvez não conheça outra maneira de ser. Mas ainda me bate uma certa ansiedade que custei a decifrar ser um pouco de medo. Para mim era muito duro admitir me acomodar em qualquer zona de conforto. A diferença é que há certos medos que te fazem não prosseguir, no meu caso, me fazem realizar mais depressa. Porque acho muito mais simples lidar com as consequências de algo concreto do que com os fantasmas do quase.

 

Na semana que vem, entraremos com o pedido de cidadania espanhola. Não sei realisticamente nossas chances de conseguí-la, o processo está cada vez mais fechado, mas me parece viável. Ao mesmo tempo, as coisas para a gente não chegam tão fáceis, me preocupa o que passaremos até essa situação se resolver.

 

Um papel deveria ser só um papel, mas na prática não é. É difícil saber que não tenho as mesmas oportunidades e talvez fosse uma lição que precisasse aprender. No Brasil, sempre tive a sorte dos caminhos abertos. Pode ser que tenha sido eu mesma quem os abriu, por acreditar que era justo. Aqui, tudo que vou fazer sei que começo em desvantagem. O problema não é a auto-estima, humildade nunca foi meu forte, mas o cansaço antecipado. Às vezes, me dá medo que algum dia não queira mais nem tentar. Gostaria de ser uma cigarra com menos consciência que o inverno chegará. Mas um dia ele chega e me cabe a responsabilidade de continuar cantando.

 

Decidi tentar engravidar. Eu disse a vida inteira que não, mas agora resolvi que sim. Foda-se! Outra vez, não sei as chances de conseguir e não me arrependo de haver esperado tanto, porque nunca esperei, simplesmente mudei de idéia. Nesse aspecto, acho a natureza incrivelmente burra ou serei eu terrivelmente lenta, porque não havia a menor possibilidade de pensar como hoje aos vinte e poucos anos.

 

De repente, me dei conta que nunca me encaixaria nos padrões de uma mãe considerada tradicional. Acontece que pela primeira vez isso não me parece um impedimento. Por que deveria sê-lo? Se todo mundo erra, por que não poderia errar nas minhas próprias bases?

 

Escutei a vida inteira que uma criança precisava de estabilidade, de rotina. Isso me soava muito razoável e verdadeiro. Em paralelo, inviabilizava qualquer possibilidade de termos uma criança conosco. Acontece que, por princípio, adoro questionar as verdades absolutas e buscar paralelos na vida. Finalmente, compreendi que quem precisa de toda essa estabilidade nem sempre são as crianças e sim seus pais, porque é muito mais fácil. E tem desculpa melhor do que deixar de fazer por amor?

 

Tenho um gato há nove anos. A sabedoria popular, ou falta dela, diz que gatos detestam mudanças, se apegam à casa e precisam de uma rotina. Sim, alguma rotina de segurança ele precisa, mas já mudamos com ele uma dezena de vezes e, se estamos bem, ele também. Ronronante e feliz.

 

E se eu já não puder mais? Paciência. Vou sofrer, chorar três dias, espero que pelo menos emagreça um pouco. Depois dou uma festa e busco outra coisa para pensar. Mas cada passo a seu tempo e ainda demoro muito em cada um desses. Minhas chances são remotas. Eu sei a cumbuca que estou metendo a mão e estou bastante realista. De qualquer maneira, me sinto aliviada por conseguir tentar, me deixou mais forte e tudo parece menos complicado. E se der certo?

 

Não há garantias na vida que sejamos felizes. O que é estabilidade? Qual é o limite de uma rotina? O que é uma relação de dependência? Chega um momento em que todos decidimos o que somos ou deixamos que alguém decida por nós. No final, somos sempre o resultado de uma decisão tomada. Prefiro tomar as minhas.

 

67 – E como foi a famosa feijoada?

 

 

Como podia ser? Vamos começar pelo final, fazendo um ligeiro balanço, foram 150 latas de cerveja, 4 garrafas de cachaça, 2 garrafas de vinho (até vinho!), whisky, vodka, um batalhão de refrigerante, 5 kg de feijão, 4 sacos de farofa… enfim, foi bom pacas!

 

Durante a semana, deixei tudo organizado. De maneira que, no sábado, estava tranquila para aproveitar a festa. Sempre sobra alguma coisinha para o dia, mas nada que sobrecarregasse. O feijão, fiz a fogo lento no dia anterior, cada carne ao seu tempo. As carnes, desalguei em três dias, preferi deixar quase tudo com um ponto menos de sal, porque dessa vez havia mais estrangeiros que o habitual. Aqui não se encontra a nossa couve, mas foi substituída quase que perfeitamente por folhas de acelga. Foram seis braçadas de folhas, picadas fininhas e refogadas com bacon e alho. A farofa, relaxei e servi a pronta de saquinho. Uma tonelada de laranjas picadinhas para equilibrar o paladar. Enquanto o pessoal chegava, servimos bolinho de bacalhau, linguiça, vinagrete, pão de queijo, azeitonas, batatinhas e torresmo.

 

Aqui em casa não se anda de sapato, mas costumava ignorar essa regra nos dias de festa. Ficava sem graça de pedir as pessoas, ainda que Luiz insistisse que ninguém ia se importar. Quer saber, dessa vez, não me fiz de rogada, vamos facilitar a vida da Bianquinha, né? Festa descalça!

 

 

Além do mais, fizemos camisetas, os abadás, distribuídas logo na chegada. Todo mundo entrou no clima e acho que isso também acaba deixando os convidados mais à vontade. E com tanta gente legal junta, só podia dar certo.

 

Aliás, só tem figura viu? Coloquei na mesa uma pimenta, daquelas enfurecidas. Mais prudente escrever do que se tratava e avisei em um bilhetinho “pica mucho”. É claro que não deu 3 minutos para alguém conseguir uma caneta e inverter a ordem dos fatores. Para os espanhóis, não fez nenhum sentido porque a gente achava isso tão engraçado.

 

 

Nosso amigo músico caprichou, não só trouxe instrumento, mas também um amplificador. Profissional mesmo, um privilégio. O percussionista trouxe seu pandeiro e o resto temos por aqui. Sabe que o negócio ficou bom? Outros convidados e convidadas se animaram a tocar. Eu mesma bem que me atrevi ao mico no tam tam, mas só um pouquinho, porque o povo sabia o que estava fazendo. Eles me aturam porque faço feijoada. Tudo bem, vou praticar, me aguardem! Luiz ainda tocou mais tempo, fui cuidar da sobremesa.

 

Uma amiga ficou encarregada dos doces e, exagerada, fez um bolo de aniversário, dois pavês de chocolate, um pudim e um mousse de limão. Pois ainda bem que exagerou, porque foi tudo! Isso depois de uma baixa importante de feijuca!

 

Cantamos parabéns em ritmo de samba. Felizmente, havia outros dois aniversariantes na festa, assim Luiz pode compartilhar o momento.

 

 

 

A caipirinha não faltou, nem pode faltar. Fizemos um cartaz com instruções, fotos, ingredientes e cada um ficou encarregado de fazer a sua. Nas primeiras festas o Luiz preparava todas, algumas vezes, amigos se oferecem para mestres caipireiros, mas a verdade é que ninguém merece ficar a festa inteira espremendo limão. E depois, descobrimos que, principalmente os estrangeiros, estavam loucos para aprender como se fazia. Então, pronto, daí por diante foi caipirinha self service!

 

Pessoalmente, continuo fiel à purinha envelhecida, Luiz igual, e já convertemos vários discípulos da cachaça. O divertido é que, no início, eles sempre acham que podem me acompanhar. Aviso aos navegantes que não tentem sem a supervisão de um adulto! Se bem, que dessa vez ninguém saiu torto, acho que o feijão segurou bem a onda. Ou será que sou eu que não lembro?

 

Os últimos convidados se foram por volta das duas da manhã. Já falei que se alguma festa aqui durar menos de dez horas, vou começar a ficar preocupada achando que foi fraquinha.

 

Luiz só ganhou presente legal e, porque não, vários poderei disfrutar. É verdade que antes meu telefone não parou de tocar para consultorias secretas sobre o que dar ou não dar. Vamos combinar que presente para homem é difícil para burro, mas olha que o pessoal se esmerou.

 

Cozinhar para umas 50 pessoas… uma semana de trabalho; conseguir carne seca e linguiça defumada em Madri… meses de contrabando; cerveja na temperatura correta… 15 sacos de gelo; Luiz achar um aniversário divertido… não tem preço!

 

 

66 – La feixoada

Não, essa palavra não existe, mas é como os espanhóis costumam pronunciar nossa feijoada.

 

É difícil comer uma feijoada legítima por essas bandas, porque não se encontra carne seca nem paio. Os outros ingredientes, como feijão preto e carnes de porco salgadas, são mais fáceis. Conheço gente que faz ao estilo ibérico, com os embutidos da região, o que quebra o galho, mas é outro prato, una fabada a la bestía! Fica tudo com gosto de páprika.

 

Bom, eu não sou uma pessoa se não comer feijão de vez em quando! Sem preconceito, preparo de todas as cores e sabores, com bastante alho e cebola. Agora, se tiver uma carninha seca e um paio… é correr para o abraço! Já estou ficando com fome!

 

Daí chego na Espanha e não encontro o raio da carne seca nem do paio, e agora? Converso com meus pais, porque claro, comida é assunto seríssimo na minha família e do outro lado do oceano meu pai fica indócil. Instaurada uma crise diplomática, assim não é possível! Como eu poderia so-bre-vi-ver sem esses ingredientes!

 

Poucos dias depois, bate o correio aqui em casa. Recebi na minha porta carne seca, embalada à vácuo, por sedex! Considerando que não devem ter pago menos de 40 euros pela entrega, acho que foi a carne seca mais cara do mundo! Quase Kobe. Ainda correram o risco de nunca chegar, porque é proibido enviar qualquer tipo de carne. Aceitei como uma declaração de amor, mas não me pareceu razoável que isso se tornasse frequente.

 

Buscamos e encontramos nossas alternativas, que um dia conto a história. Importa que nosso congelador vive com estoque para uma boa feijuca! Não dá para fazer sempre, vou controlando para não ficar sem nada, mas não passamos vontade.

 

Acontece que há um dia do ano que ela, a feijoada, ganhou status de estrela: o aniversário do meu digníssimo marido. Meio mundo sabe que ele não é chegado a comemorar nesse dia e levei anos para descobrir que substituindo uma palavrinha, ele era capaz de aceitar e se divertir. Então, não celebramos o aniversário do Luiz e sim, a feijoada do Luiz.

 

Portanto, em setembro, no sábado mais próximo do dia 6, realizamos a “Já Tradicional Feijoada do Luiz”. A data é ótima, porque há muita gente voltando de férias e é um bom momento para começar a nos reunir. Esse ano foi mais do que perfeito, porque dia 6 de setembro cai exatamente no sábado! Aviso divino!

 

Devido a disponibilidade de ingredientes e de espaço, infelizmente, não cabem todos que gostaríamos de convidar, o que é um pouco frustrante, mas por outro lado, não deixa de ser uma boa notícia. Chamamos sempre o máximo possível e a cada ano temos a sorte de poder incluir mais amigos. Aliás, de todas as tribos! Gosto de festa bem misturada. A maioria é de brasileiros, por uma questão de justiça, são os que mais sentem falta de um feijão caprichado, mas há muitos estrangeiros também.

 

Agora a parte prática, porque eu e uma sarna para se coçar somos eternos companheiros. Fui chamando deus e o mundo até que Luiz me perguntou algo como, você tem certeza que cabe esse povo todo que você está falando? E eu, claro… claro que não pensei nisso! Resolvi por a lista no papel e havia umas 50 pessoas! Ui! E quem vai cozinhar para cinquenta? Yo moi myself, quem mandou?

 

Não ligo para o trabalho, faço por etapas ao longo da semana, o problema é a responsabilidade! Nunca fiz feijoada para tanta gente! Bate um medo danado de não dar certo. Normalmente, sou mais tranquila com isso, porque com quem tenho intimidade para chamar em casa, também tenho para dizer, xi, queimou! Pedimos uma pizza? Entretanto, depois de toda essa expectativa, inclusive minha, para a bendita feijoada anual e a novela que é conseguir os ingredientes carinhosamente contrabandeados, como é que vou errar? Não dá, né? Os preparativos já começaram e estou tomando um cuidado do cão! Um pouco estressada pelas quantidades, mas no fundo, bem que gosto! E depois, ele merece.

 

Também é verdade que muitas amigas se ofereceram para ajudar, não aceitei porque não precisou, mas se precisar é bom saber que posso gritar. Conto com uma delas para algumas entradinhas e a sobremesa, menos detalhes para me preocupar.

 

Luiz buscou ontem as camisetas, porque desde o ano passado, fazemos o abadá. Não é que o negócio está ficando profissional?

 

Grandes possibilidades de rolar música ao vivo, a vantagem de ter amigos músicos. Fora o pessoal do coral e a mini escola de samba que temos na sala, o que me dá até medo do que pode acontecer. Por via das dúvidas, vizinhos convidados!

 

Bom, melhor Isaura voltar para a cozinha e se esmerar, que ainda falta muita coisa!

 

Lerê lerê lerê lerê lerê…

 

65 – Futebol totó

Não sei da onde saiu esse nome estranho, mas fui apresentada ao futebol de mesa como totó. Em São Paulo é pebolim, no sul do país é fla-flu e aqui na espanha é futbolín.

 

Quando éramos crianças, havia uma mesa dessas em casa. Acho que era do meu irmão, mas sempre gostei de jogar mais do que ele. Simplesmente era tarada pelo tal do futebol totó. Fazíamos campeonatos com os meninos da rua e modéstia às favas, era campeã. Na minha memória, era minha brincadeira favorita.

 

Para ser honesta, defesa nunca foi meu forte. Fazia se precisasse, sou jogadora de ataque e violenta.

 

Bom, o tempo passou e tive algumas poucas oportunidades de jogar. Mas a verdade é que logo depois das primeiras partidas, parecia que a mão voltava a funcionar, como andar de bicicleta. O que acho engraçado é que não sou uma pessoa de jogos, perco a atenção e a paciência com muita facilidade. Mas no totó, sei lá, me baixava um santo e para sair da mesa precisava ser arrastada! Absolutamente viciante.

 

Enfim, acredito que houvesse, pelo menos, uma dezena de anos que não encarava um futebol de mesa. Não me lembro porque o assunto começou, mas entre amigos, resolvemos buscar algum local onde pudéssemos jogar.

 

Através da internet, encontramos um lugar chamado Cervecería Salamanca e para lá fomos ontem, em cinco pessoas. Apesar de ser um bar, a frequência me parecia razoavelmente adolescente, muita fumaça de cigarro e uma música altíssima. Abstraí, queria mesmo era jogar.

 

Havia duas mesas. Uma delas a menina do balcão nos avisou que ficava a noite inteira ocupada. Aparentemente, estava o campeão europeu de futbolín. A outra, um grupo de garotos levou mais ou menos uma hora para liberar. Hora essa que esperei roendo as unhas. Chegou nossa vez, que suspense. Um dos amigos havia desistido e ficamos em dois casais.

 

A mesa era bem mais moderna da que jogava no meu tempo. Os bonecos de material plástico rígido, iluminação interna e um tipo de placa na altura dos olhos, na vertical do meio do campo, que não nos deixava ver o rosto dos adversários. Bom, vá lá, as coisas evoluem, teoricamente, deveria ser melhor para jogar.

 

Não era, pelo menos na minha opinião. Os anos foram implacáveis e não tive agilidade nem parecida aos bons tempos de jogadora. Frustrante, porque os bonecos nesse material travam um pouco a bola, você não conseguia dar tacadas muito fortes. Ainda por cima, um dos meninos que estava jogando antes, ficou sozinho no bar e pedia o tempo todo para jogar conosco ou dava palpites, obviamente não requisitados. Joguei contra ele um par de vezes, era um garoto, e provavelmente treinava com frequência. Deu um pouco de raiva porque pensava que já joguei muito melhor e que em outras ocasiões o teria posto para correr nos primeiros cinco minutos. Mas agora, era ele quem ganhava e era um chato!

 

Entretanto, um chato útil, porque também foi ele quem nos avisou que havia uma mesa “das antigas” em outro bar ali perto.

 

Decidimos ir embora, já meio cansados e porque não dizer, todos com cara de nádegas, meio frustrados por não conseguir jogar como se esperava. O desânimo coletivo paradoxalmente nos animou, o problema não era nosso, era da mesa, claro!

 

Na saída, resolvemos procurar o outro bar do totó antigo, ficava meio escondido, mas Luiz o encontrou. Um pub pequeno, com uma mesa no minúsculo andar de baixo, que não deveria ter mais do que 5 m2, e onde não havia ninguém. Ou seja, ficamos com nossa salinha privê e uma mesa good old fashion way, com jogadores de madeira. Para mim, o paraíso!

 

Suei como se estivesse praticando um esporte radical e bebi nada mais do que água, porque não queria me desconcentrar, além de uma sede mortal. Luiz, fiel com seu Jack Daniel’s, foi um cavalheiro e segurou a onda na defesa. Somos dois jogadores de ataque, mas ele quebra meu galho. O casal de amigos, se revezava entre ataque e defesa e foram partidas emocionantes e equilibradas. Bom assim, gosto de adversários que dão trabalho.

 

Não jogo mais um terço do que pude um dia, acho que nunca jogarei, mas aos poucos fui recuperando a mão. E aquele barulho da bola batendo na madeira, para mim é música. Não conheço uma maneira mais elegante de falar que a porrada que a gente dá na bola e o tá-tá que ela faz quando bate no gol adversário é algo que me tira do sério, no bom sentido, adrenalina na veia.

 

Foram mais de vinte partidas e quando Luiz parecia que ia derreter e o casal de amigos insinuou achar que era hora de ir, resolvi ser razoável e aceitar. Fomos felizes pela rua, apesar de reclamar de dor no pulso, no joelho, nas costas, doía tudo! Foi quando descobri que passava das 2:30hs da matina e que estávamos jogando a, pelo menos, umas quatro horas seguidas! Como assim? Já?

 

Hoje acordamos como um casal de velhinhos. Luiz colocando compressa de água quente no braço e eu me sentindo como se tivesse dançado a noite toda. Uma dor nas costas humilhante!

 

E o pior é que estou louca para voltar. Junkie total!

 

64 – O tenor da Renault

Algumas vezes, escuto da minha janela uma voz de tenor, cantando em italiano. Voz de ópera mesmo, o indivíduo canta bem. Sabia da onde vinha, de um prédio comercial baixo, que fica logo em frente do nosso edifício, e todos os dias solta cheiro de pintura automotiva.

 

Gosto de escutá-lo cantando, mas nunca o havia visto. Ele canta e eu continuo martelando o teclado, às vezes diminuo o ritmo para ouvir melhor. Em agosto, não o escutei mais. Fiquei na dúvida se ele estava de férias ou havia mudado de emprego.

 

Sou uma pessoa muito visual, portanto, escutava a voz e imaginava o cidadão. Forte, mais para barrigudo, por que toda vez que escutamos uma voz potente, imaginamos uma pessoa grande ou gorda? Alto, pele clara, deveria ser italiano, espanhol não canta em outro idioma normalmente, talvez meio calvo. Devia ser bem humorado, porque trabalhava cantando.

 

Bom, hoje a voz voltou e não aguentei a curiosidade, tô dizendo que ando uma cotilla. Uma janela do outro lado aberta, só podia ser de lá. Era. Óbvio que o cantor era totalmente diferente do que imaginei, alto, corpo normal, não era nem gordinho, moreno claro com bastante cabelo, razoavelmente jovem, uns 40 anos, pele mal tratada e de óculos. Não sei se o óculos era só para proteger enquanto ele fazia a lanternagem do carro. Usava um macacão da Renault, mas de paletó preto, diria que era o contador da empresa.

 

Deu uma vontade de brincar e começar a aplaudir. Mas fiquei com vergonha e com medo de ser mal interpretada, sei lá. Quando vi que ele iria virar, saí logo da varanda, acho que ele não me viu, mas provavelmente percebeu meu vulto, ou seja, que tinha público. Aí é que se empolgou!

 

Já inventei a história toda, é um imigrande italiano. Seus pais eram apaixonados por ópera e ele escutava desde criancinha. Entretanto, não teve condições econômicas de se dedicar a essa paixão pela música. Casou-se com uma espanhola e quando a primeira filha nasceu, foi trabalhar em oficinas mecânicas. Seu sonho é que um dia um produtor musical passe pela rua e descubra seu talento. Pronto!

 

Eu me divirto!

 

63 – Só eu não sabia!

Alguém já encheu o saco da Carla Bruni? Pois é, eu sim. Juro que não foi por despeito, realmente é uma mulher muito bonita, mas simplesmente não aguentava mais que a notícia política francesa se resumisse às carinhas e biquinhos infantis da mocinha em questão. Aquela cabecinha virada para o lado, tão frágil, me deu nos nervos!

 

Até que na semana passada, descobri o que o planeta já devia saber, ela canta uma música que adoro, Quelqu’Un M’A Dit. Não é que ache uma canção de outro mundo, mas é muito bonitinha, me lembra café-da-manhã ensolarado e com preguiça.

 

Pronto, já mudou minha impressão! Vai ver aquele pescoço pendendo eternamente é porque a coitada está com torcicolo. Depois, assim ela fica da altura do marido.

 

Enfim, brincadeiras à parte, ela ganhou vários pontos no meu conceito. Inclusive, ela deveria estar preocupadíssima com isso, né?

 

Só sei que a música não sai da minha cabeça e ando ouvindo cordas imaginárias, de preferência em violoncelo.

 

62 – O acidente

Já faz alguns dias, aqui só se fala no acidente do avião da Spanair. Não conhecia ninguém, o que em princípio me tirou a atenção do caso.

 

Entretanto, algumas mortes parecem comover mais que outras e isso não é uma crítica, é um fato. O país parou, todos os noticiários só falavam nisso e veja bem, estávamos em época de olimpíadas.

 

Vários amigos de outros países nos procuraram para saber se estávamos bem. E a verdade é que chegamos a pensar em viajar para o mesmo lugar, mas não fomos. Acredito que esse é o ponto, estávamos bem, não fomos, mas poderíamos ter ido. Talvez seja o que mobilize tanto as pessoas nesse tipo de acidente. Poderia ter sido conosco, poderíamos conhecer alguém, a empatia é imediata. O mundo é globalizado, todos viajamos para algum lugar ou conhecemos alguém que viaja.

 

A demanda por informações sobre esse caso era absurda. Teve rádio ligando para uma amiga ler o jornal daqui no ar no Brasil. Quer dizer, nenhuma novidade, simplesmente repetir o que já se sabia. E quando jornalista não tem novidades para contar, enrola com as mesmas bobagens horas seguidas. Até o vizinho do piloto que morava em outra cidade foi entrevistado, como se isso pudesse agregar algum fato relevante. Fora a exploração do sofrimento alheio, quanto mais se pudesse cutucar um parente desesperado, melhor o ângulo do choro para a câmera. Tenha santa paciência! Mas que falta de respeito.

 

Encarei três encrencas aéreas, um CB (cumulus nimbus ou algo assim), um urubu na turbina com pouso forçado e um pouso em final de furacão. Alguns podem dizer, caramba, mas que uruca! Na verdade, acho o contrário, continuo aqui, então devo ser vaso ruim. Não vou negar, me deu um medo danado de viajar de avião. Até que há uns dois anos, aproximadamente, meu medo acabou, como veio se foi, o que para um ser expatriado como eu, foi um tremendo alívio. Por isso, honestamente, quando escuto sobre acidentes aéreos reais ou em filme, troco de canal, não quero saber, não quero voltar a ter medo.

 

Sinto muito pelas pessoas que se foram, como sentiria por qualquer desconhecido que passou um mau pedaço. Não tenho nenhuma curiosidade pelos detalhes mórbidos, só presto atenção nas notícias dos sobreviventes, que felizmente houveram.

 

Acho importante se apurar os reais motivos e aprender com isso, diminuir a possibilidade que aconteça novamente. Ainda que às vezes, por mais duro que seja admitir, shit happens!

 

 

 

 

61 – Calmaria

Agosto tem sido um mês bastante calmo, sem grandes novidades nem muito o que contar. Aproveitei para descansar o máximo que pude, pois sabemos o que sempre costuma chegar após as calmarias. Tudo bem, nem toda tempestade é má, algumas nos divertem, outras nos distraem e há ainda as que nos afundam. Em todas, precisamos nos molhar. Tudo bem também, meu elemento sempre foi a água.

 

Algumas decisões tomadas. Falta uma certa coragem, mas um passo de cada vez e por enquanto vou caminhando mesmo sem grande valentia. Um pouco de solidão, pois há decisões que são só nossas e não se pode controlar todas as variáveis. Não controlo nem minhas vontades, que às vezes parecem vicerais, uma compulsão em tentar. O subjuntivo é bom para aguçar, mas preciso viver de indicativo, de pretéritos perfeitamente deixados para trás e de presente. Mas é o futuro que agora me chacoalha e não sei conviver muito tempo com o se. Nem quero aprender.

 

Setembro promete. Que venha o caos! Já ando mesmo com saudades.

 

“Ando tão à flor da pele, qualquer beijo de novela me faz chorar. Ando tão à flor da pele, que teu olhar “flor na janela” me faz morrer. Ando tão à flor da pele, que meu desejo se confunde com a vontade de não ser. Ando tão à flor da pele, que a minha pele tem fogo do juízo final…”

 

61 – La Virgen de la Paloma

Na sexta-feira, foi feriado, dia da Virgen de la Paloma. E quem é la Paloma? Bom, esse negócio de explicar santo é muito complicado. Teoricamente, a padroeira de Madri é Almudena, inclusive, é o nome que leva a catedral em frente ao Palácio Real. Mas também se venera São Isidro. Até aí, mais fácil, porque se diz que a padroeira é Almudena e o padroeiro é Isidro. E a Paloma, onde entra? Aparentemente, é a padroeira do coração.

 

Que me perdoem os devotos, mas não sou lá muito católica, muito menos politicamente correta. Portanto, imagino que seja algo como torcer para escola de samba, a gente torce pela nossa, mas sempre há algumas escolas a quem somos simpatizantes.

 

O que importa nesse momento é que espanhol adora uma festa de rua, e em função da Paloma, são três dias de comemoração no bairro de La Latina, um dos mais castiços da cidade. Parece uma super quermese, onde não se entende bem onde para a fé e começa a farra. Apesar de que esse conceito de mesclar o sagrado e o profano não é coisa só de espanhol.

 

No sábado bateu curiosidade de ver como estava a festa. Também já estava meio cansada de ficar em casa, queria passear e ver gente. A temperatura não podia estar melhor e fico louca para estar ao ar livre.

 

Começa com uma procissão, que não fomos, da imagem da santa, tudo com muito respeito. Essa imagem vai para a Plaza de la Paja e fica lá iluminada. A propósito, é onde fica a igreja de San Isidro. Acontece que, nessa mesma praça e seus arredores, rola a maior festança! Tem apresentações de Zarzuela, bancas de comidas e bebidas, pessoas em trajes típicos, enfim, tudo muito animado e que não lembra exatamente uma festa religiosa.

 

 

 

 

O público é bem diversificado. A maioria é gente jovem, mas se encontra com facilidade de todas as tribos, famílias, crianças, espanhóis, estrangeiros, turistas, idosos, mendigos, alternativos, todos na rua convivendo tranquilamente. Logo que chegamos, vimos algum movimento de carros de polícia, mas verdade seja dita, me pareceu tudo muito pacífico. Apesar das pessoas estarem bebendo, dançando e caminhando pela rua, não vi nada nem próximo a confusão.

 

 

Os trajes típicos são interessantes. Você encontra vários casais pela rua, o homem com um terninho e chapéu, a mulher com vestido e flor na cabeça. Estava louca para fotografá-los, mas não queria incomodar ninguém. Até que passou um casal de senhores guapísimos! Não resisti, tentando disfarçar, tirei uma foto meio de lado, meio de costas. Mas a senhora me viu e olhou para trás sorrindo. Bom, foi minha deixa para sorrir também e pedir com a cabeça se podia tirar outra foto. Ela rapidamente se ofereceu me chamando, venga a por una foto con los abuelitos, que así llevarás  una buena recordación de La Paloma! Pode haver algo mais simpático que isso? Pois tiramos fotos, Luiz e eu, de braços dados com eles.

 

 

 

Todos os bares da redondeza colocam balcões e mesinhas do lado de fora. Cada um tenta chamar mais atenção que o outro, com decorações diversas, envolvendo bandeirinhas, bolhas de sabão, luzes e música alta. 

 

 

 

A música é bem variada, desde tradicionais espanholas à eletrônica, tem de tudo e ao mesmo tempo. É um pouco de poluição sonora, os vizinhos não devem ficar muito felizes, mas convenhamos, uma vez ou outra não mata ninguém e é divertido.

 

Não é incomum ver sobre os bares lotados de gente bebendo álcool, a imagem da santa iluminada ou em destaque. Pode parecer contraditório, mas ainda que ache curioso, não me choca. Acho até que fala muito sobre a cultura local.

 

Paramos no Txakolí, uma taberna de pintxos vascos de nome para mim quase impronunciável. Pinchos são um tipo de aperitivo pequeno e individual, como torradas, sanduichinhos, coisas assim. Em euskera, língua falada no país vasco, se escreve pintxos. Essa taberna fica na Cava Baja e na minha opinião serve os melhores pintxos da cidade. O problema é que muitas outras pessoas sabem disso e você precisa praticamente se estapear no balcão para conseguir ser atendido. Entretanto, ontem, acredito que pela quantidade de opções, estava cheio mas não impossível. Justo em frente, havia na rua um DJ bastante jovem tocando música eletrônica. Acho que era onde havia a maior concentração de pessoas dançando.

 

Resolvemos voltar caminhando, o que adorei, ando sentindo muita falta das caminhadas, mas no verão complica um pouco. Em plena Puerta del Sol, descobrimos que era noite de eclipse. Minha digitalzinha não dá conta do recado, mas pelo menos consegui registrar o momento.

 

 

 

Boa parte do caminho, vim tomando um sorvete incomensurável e prestando atenção na evolução do eclipse. O sorvete, Luiz precisou terminar e o eclipse, precisei abandonar porque, vou logo entregando, ele pediu arrego da caminhada e me convenceu a pegar o metrô.

 

Chegamos em casa com a lua quase cheia novamente. O eclipse, ou quem sabe La Paloma, amenizaram seus efeitos. Passamos na frente dos bombeiros, que se encontravam todos do lado de fora batendo um papo animado. Aparentemente, foi uma noite calma.

 

 

60 – Quando pensamos que terça é sexta…

Plena terça-feira, aniversário de um amigo do clã dos imparáveis. Festa, claro! Mas na terça?

 

Bom, tudo bem que ando com uma preguiça daquelas, mas minha natureza sempre fala mais alto. Então vamos. Até porque, me disseram que era uma festinha super familiar.

 

O causo é que é uma família de porra-loucas animadésimos! Aí, já viu, né? Além do mais, sou uma pessoa muito educada e detesto recusar o que as pessoas me oferecem. Sou solidária, gosto de acompanhar. Acompanhei com cava, com cachaça, com whisky… Putz! Enfim, ainda bem que sou dura na queda e garanto que não paguei mico, pelo menos, não que me lembre. Melhor não pensar muito no assunto.

 

Um dos convidados é músico profissional e acabou rolando um violão com música ao vivo. E não, não estamos falando de te-amo-espanhola, foi mais para rock & roll mesmo. Daí, lá fui eu outra vez acompanhar, pura educação! Apareceu um livrinho com as músicas, não sei da onde, e lá íamos nós tentando cantar junto, naquela afinação clássica. Outros instrumentos foram se agregando, um ganzá e o cajón flamenco que levamos de presente de aniversário. Definitivamente, o vizinho dos nossos amigos é surdo ou muito gente boa.

 

Em resumo, divertidíssimo! Apenas um ligeiro probleminha básico, era terça-feira e não sexta! Ou seja, no dia seguinte, mais fácil perguntar quem não estava de ressaca. Acho que só Luiz, que bebeu refrigerante porque ia dirigir. É verdade que mal não acordei, entretanto, devo ter tomado uns cinco litros de água, sem parar. Já certos participantes do evento, que não conto nem que me cortem a cabeça, enfrentaram algumas dificuldades para trabalhar.

 

Consequentemente, todos vão descansar bastante o resto da semana, certo?

 

Mais ou menos, porque nessa sexta aqui é feriado. Logo, a quinta-feira equivale à sexta! Cassilda, essa semana os dias estão meio confusos! Enfim, lógico que vamos nos encontrar daqui a pouco. Minha dúvida é se levo meu tam tam. Será?

 

59 – A preguiça de verão

Sabe o que ando morrendo de vontade de fazer?

 

Nada.

 

Mas na-da, nadinha! Uma preguiça crônica. Acho que estou ganhando do Jack, ele se espalha para um lado e eu suspiro para o outro. Tudo que pude enrolar, enrolei, assumo.

 

E não é só para trabalho não, me chamam para coisas que gosto de fazer, do tipo, vamos para uma terraza em Lavapiés, e eu penso, para que? Vamos dançar não-sei-aonde? E eu, outra vez?

 

Só pode ser o calor infernal, devo estar com ensolação! Cada vez que ameaço por o nariz na rua, repenso se é realmente necessário. Bom, a não ser que seja para ir à piscina. Isso sim, fiz agosto inteiro. Estou neguinha, juro, como há muitos anos não fico. Não me lembro mais quando pude tomar sol tantos dias seguidos.

 

Vou passar o outono inteiro a base de creminhos tira manchas e sardas, paciência. Uma coisa de cada vez e estou adorando ser bronzeada. Quase esqueço como sou branquela de verdade.

 

Pelo menos, sinto menos fome, e consequentemente, a menor vontade de cozinhar.

 

Sinceramente, acho que é o calor. Ainda que ame o verão. Digo porque foi só a temperatura começar a cair, discretamente, mas está mais ameno de uns dias para cá, que instantaneamente, foi me dando mais vontade de fazer as coisas. Talvez deva seguir a filosofia do Garfield e ficar bem quetinha esperando essa vontade absurda passar.