50 anos, saúde!

Fiz 50 anos de idade. Soa mais assustador do que realmente é, ainda que não vou negar, tenha seu peso. E é óbvio que eu não seria eu mesma se não quisesse celebrar a data à altura!

O mais coerente seria fazer um festão daqueles! Só tinha um probleminha, nós já fizemos um festão daqueles esse ano, o de Bodas de Prata. Sem querer chorar miséria, porque nunca farei isso na vida, dois grandes eventos em um ano custariam mais do que o programado no nosso orçamento. E, considerando que nossos amigos e familiares estão espalhados pelo mundo, acredito que também para eles.

Beleza, a festa fica para outra ocasião. Por exemplo, posso fazer a festa dos 51, aliás, uma boa ideia!

Tem uma piadinha do mineiro que a gente sempre usa em casa como piada interna. O mineirinho encontrou a lâmpada… esfregou… saiu o gênio e concedeu três pedidos. O primeiro pedido, mineirinho pensou… pensou… já sei! Quero um queijo! O gênio achou o pedido meio simples, mas enfim, concedeu e o mineirinho adorou! O gênio perguntou, e seu segundo pedido? Mineirinho pensou… pensou… quero outro queijo! O gênio perguntou, tem certeza? Posso realizar qualquer desejo! Você quer só um… queijo? E o mineirinho, meio tímido, disse sim com a cabeça. Perfeito! O gênio fez surgir um queijo ainda maior e mais gostoso! Pronto, agora seu terceiro e último pedido, o que você quer? Mineirinho pensou… pensou… coçou a cabeça… tá bom, eu quero a Gisele Bündchen apaixonada por mim! O gênio ficou intrigado, e disse a ele, ok, posso realizar, mas só por curiosidade, seus pedidos foram tão diferentes… por que você pediu a paixão da Gisele agora? Mineirinho meio sem graça, se encolheu e disse… eu queria mesmo era outro queijo… mas deu uma vergonha do senhor…

Então, cada vez que a gente tem várias opções e quer algo bem básico ou repetir algum programa, a gente sempre fala um para o outro… eu queria mesmo era um queijo!

Muito bem, então, voltando ao aniversário, ainda que não fosse um super festão, celebrar eu queria e precisava ser algo especial, de preferência, também simbólico. Perfeito, então vamos viajar! Pensei literalmente nos quatro cantos do mundo! Lugares exóticos… desconhecidos… aventuras… para onde raios eu queria viajar? Qual seria o país perfeito e tão diferente para essa ocasião?

Pensei… pensei… Luiz, quer saber, eu quero mesmo é um queijo! Vamos para a França comer muito bem e tomar todas?

Para quem mora no Brasil, talvez ir a França seja complicado e caro, mas para a gente que mora em Londres, é um voo quase que de ponte áerea. E para ser bastante sincera, era para onde eu queria ir.

Já faz um tempo, Luiz teve um cliente em Épernay, uma cidadezinha francesa bem charmosa, conhecida como a capital da Champagne (ok, há controvérsias, alguns defendem que é Reims… mas tudo bem!). Ficamos de ir juntos até lá em algum momento.

Na hora de decidir para que região viajaríamos, pensei, que bebida poderia ser mais apropriada para uma celebração em grande estilo? Champagne, é logico! Poderia haver lugar mais simbólico do que justo a capital geradora da tal divina bebida? Pois decidido, Épernay e arredores!

Adianto que não poderia haver escolha melhor! Foi um escândalo de bom! Uma semana inteira comendo divinamente e tomando champagne da melhor qualidade! Já se passou uns dois meses dessa viagem e parte da experiência ainda segue (literalmente) em meus quadris, mas está valendo! Porque cada vez que me lembro, minha boca saliva e tenho vontade de sorrir!

Então, começamos pelo princípio, tomamos um avião de Londres até Paris, onde alugamos um carro e dirigimos cerca de 160Km a nordeste, até Épernay. Chegamos na cidade no limite da hora do jantar e, admito, um pouco cansada. Mas feliz e disposta a iniciar os trabalhos, era a véspera do meu aniversário, o último antes de entrar na seguinte década para mim e para o mundo!

Ficamos hospedados no Hotel La Villa Eugène , que por sinal, adorei! Mas na chegada, só tivemos tempo de fazer o check in, largar as malas e correr para algum restaurante antes que fechassem todos!

Fomos jantar na Brasserie de la Banque, um lugar muito simpático, situado em uma antiga sede bancária, despojado e com a maior carta de champagnes que havia visto até o momento! Como não tinha a menor ideia do que optar e queria sair do lugar comum, pedi orientação ao maître, que nos sugeriu uma garrafa que, por coincidência, levava o nome do meu irmão. Perfeito! Aviso divino! Preço super acessível e excelente!

Voltamos para o hotel, agora alimentados e com um pouco mais de calma. Queria que chegasse logo o dia seguinte, 09/11/2019, oficialmente meu aniversário de 50 anos!

Comecei o dia feliz e muito bem acompanhada!

La Villa Eugène

Nosso hotel ficava exatamente na Avenue de Champagne, onde são sediadas as principais casas produtoras da bebida local. Além do mais, a cidade não é tão grande e podíamos fazer a maior parte dos passeios a pé mesmo. Aliás, considerando nosso teor alcoólico, era melhor não dirigir!

Como atividade do dia, elegi uma visita à casa da Moet & Chandon, obviamente, com direito a degustação! O ideal é que você compre com antecedência os ingressos para sua visita por internet. Como tudo nosso é decidido de última hora, pedimos ajuda à recepcionista do hotel, que foi bastante solícita e telefonou diretamente para lá.

Recomendo fortemente a visita! Aprendi um monte de coisas sobre a história da champagne, sobre a marca, sobre o processo, sobre armazenagem… passei, inclusive, a valorizar mais ainda a bebida. Digamos, que aumentou meu respeito. Além do que, é toda uma experiência você se meter por aqueles túneis intermináveis, que mais lembram uma sociedade secreta. Aviso que a temperatura é constante de 10 o.C, independente da estação do ano, ou seja, leva um casaquinho, ok?

Bom, como acho que já ficou bastante claro, foi uma viagem gastronômica, logo, os assuntos desse texto serão basicamente sobre comida e bebida! Quando disse lá atrás que queria viajar para comer muito bem e tomar todas não era apenas uma figura de linguagem.

Portanto, na sequência, o esperado jantar comemorativo dos 50! A escolha foi o restaurante Le Royal, que possui uma estrela Michelin e é localizado no Royal Champagne Hotel & Spa. E foi um escândalo de bom! O salão tem uma elegância discreta, simplesmente chic! Um olhar um pouco mais treinado irá perceber que tudo está pensado em detalhes, desde a escolha da louça, ao espaço entre as mesas, a decoração, as toalhas e os guardanapos bem passados… tudo em equilíbrio e correto! Serviço impecável e, ao mesmo tempo, simpático.

Nós escolhemos o “menu découverte”, ou seja, era um menu às cegas, o Chef decide e Bianquita obedece! Fizemos a mesma opção em relação à harmonização dos vinhos. Também já fui logo fazendo amizade com o garçon e sommelier porque assim fica melhor a experiência.

Como previsto, estava tudo maravilhoso! Como única observação, achei que o Chef foi pouco ousado. Entendo que um Michelin não tem margem de erro, mas para clientes que escolhem um menu surpresa e dizem que não tem absolutamente restrição alguma, acho que ele teria liberdade para arriscar um pouco mais. Dito isso, não tenho nada a reclamar. Tudo foi absurdamente perfeito, lindo, equilibrado e delicioso!

Estava onde queria estar, sem concessões, bem na minha própria pele e com a melhor companhia possível! Foi um dia completamente feliz!

E era só o início da viagem… porque ainda tenho mais para engordar… digo, contar!

No dia seguinte, começamos a explorar os arredores. Não tínhamos nada muito definido, então, saí buscando nomes que parecessem charmosos, encontrei uma cidadezinha chamada Châlons-en-Champagne e me pareceu que, com um nome desses, só poderia ser chic! Na verdade, não era nada demais, mas o passeio até lá até que compensou.

A parte engraçada é que paramos para almoçar em um dos poucos restaurantes abertos, tinha uma boa rotatividade e estava cheio de gente que parecia local. Ficava numa praça que deveria ser a principal da cidade, com casas muito tortas, que lembravam um desenho animado. Até aí, beleza!

Gosto de arriscar na comida e não tenho muita frescura para experimentar coisas consideradas estranhas. A linguiça típica dessa região é a Andouillette, que dentre sua composição, leva intestino de porco. Eu, metida a valente, pedi a especialidade da região, né? O garçon virou para mim com aquele olhar de desdém e me perguntou se eu sabia o que estava pedindo. Você acha que tinha alguma chance de eu dar meu braço a torcer?

Fiz a cara que era a coisa mais óbvia do mundo e aí é que resolvi pedir mesmo a tal da Andouillette (e não, claro que não tinha certeza do que era feita nem havia comido antes). Ficamos Luiz e eu rindo, imaginando que porcaria ia chegar para eu comer e eu já avisando que ia morrer dura, mas não ia perder a pose.

Pois bem, a aparência não é terrível, parece mesmo uma linguiça, o problema é o aroma… putz! Não me fiz de rogada, comi assim mesmo e quando o garçon passava por mim ou me olhava, ainda fazia aquela cara de “hummm, que delícia…”. Ele deve estar achando que sou louca até hoje! Mas foi divertido!

Mudamos de cidade e, consequentemente, também de hotel. Fomos para o Château d’Etoges, classificado como monumento histórico, construído em princípios do século XVII. Todo um charme, quarto enorme, atendimento prestativo e um excelente restaurante. Ficamos em uma suíte que levava meu nome, Chambre Blanche. Sério, me senti uma rainha no meu castelo!

Nosso seguinte passeio foi para Reims, a cidade é normal, nada que chamasse tanta atenção, mas nosso objetivo principal era visitar a Casa Veuve Clicquot. Você deve comprar as entradas antecipadamente para a visita com direito à degustação e precisa confirmar que tem mais de 18 anos para entrar no website.

Eu nem deveria contar, mas vamos lá que os micos de viagem também são importantes! Com toda essa vida de princesa, comendo feito uma louca refugiada e bebendo todos os dias sem dó nem piedade, claro que à essa altura eu havia acordado completamente desarranjada! Desconfio que a “Andoillette” teve algo a ver com isso. E, como não poderia deixar de ser, com os ingressos para a visita da Veuve Clicquot já comprados!

Daí, o que uma pessoa sensata faria? Ficaria sossegada no hotel para não correr riscos e não tomaria álcool pelo menos nesse dia, certo? O problema é que… eu não sou uma pessoa sensata! E não ia perder essa visita nem a pau! Resolvi arriscar, jejuei desde o café, tomando água sem parar, fiz cursinho de planta toda a manhã, não almocei, comi umas torradinhas e Luiz ainda conseguiu ter a brilhante ideia de comprar um Imodium na farmácia da esquina (olha que providencial, no hotel no meio do nada, numa cidadezinha minúscula, tinha uma farmácia a 20 metros). E assim, pegamos a estrada em direção a Reims!

Chegamos um pouco cedo, o que foi até legal, porque há uma sala de espera com uma mesa de futebol totó e eu amo jogar! E vamos combinar, até jogar totó na Veuve Clicquot soa mais elegante, né? Enfim, visita recomendadíssima e adorei conhecer um pouco mais da história da champagne. Para quem não sabe, “veuve” significa viúva em francês e a bebida leva o nome exatamente da viúva do Clicquot, uma mulher extraordinária e muito à frente do seu tempo, responsável por fazer a casa se consolidar como marca importante.

Como era de se esperar, terminamos com uma degustação!

Degustação na Casa Veuve Clicquot

Não vou deixar a história anterior em suspense. Não passei mal e nenhum acidente, graças a nossa senhora dos alcoólicos desesperados! E provavelmente, também ao santo Imodium!

Mas admito que minhas risadas foram bastante cuidadosas e que a champagne depois do dia praticamente em jejum subiu que foi uma maravilha! Tudo bem, sobrevivemos!

Seguindo a viagem, deixamos a região e fomos para Rouen, que tem um lado um pouco sinistro, onde Joana D’Arc foi queimada. Entretanto, não deixa de fazer parte da história e, apesar disso, a verdade é que a cidade é muito bonitinha.

Ficamos hospedados no Hôtel Littéraire Gustave Flaubert, agora num esquema mais tranquilo, bom custo vs. benefício, bem localizado, limpo e atendimento bem simpático. Você precisa tomar cuidado se ficar hospedado no centro da cidade, porque o acesso a carros é restrito e as multas podem ser altas. E esse hotel, oferece a possibilidade de estacionamento.

Quanto ao jantar, preciso confessar que tudo que eu queria à noite era tomar uma sopinha com água! Não estava passando mal nem nada, mas até para os abusos há um limite, juro que o corpo reclamou! Um diazinho só de recuperação não foi mal.

De Rouen, tomamos rumo a Paris, mas sem pressa, aproveitamos para curtir o outono visto da estrada e queria parar em Giverny para almoçar.

Giverny fica na região da Normandia, Claude Monet viveu e trabalhou lá de 1883 até sua morte, em 1923. Infelizmente, não era a melhor época para se visitar, porque o Museu dos Impressionistas estava fechado, ficará para outra visita. Havíamos nos programado para almoçar no Ancien Hôtel Baudy, frequentado por Renoir, Rodin, Sisley, entre outros, mas também estava fechado, uma pena! Ainda que cheguei a ficar contente só pela oportunidade de passar na sua porta e cumprimentar seus fantasmas!

E, finalmente, o último destino dessa viagem: Paris!

Não tem jeito, sou a-pai-xo-na-da por essa cidade! Quando vejo a torre Eiffel apontar pela janela do carro, alguma coisa acontece no meu coração… é até covardia!

Faltava a última chutada de balde da viagem, uma que já venho negociando com Luiz há anos e nada dele se animar a ir, dessa vez não tinha desculpa, para fechar essa viagem com chave de ouro eu tinha porque tinha que comer o pato prensado no Tour D’Argent!

Reza a lenda que o restaurante funciona no mesmo local desde 1582 e chegou a ser frequentado por Henrique IV. O carro chefe da casa é o pato prensado, hoje servido em dois tipos de cocção. Em 1890, Frédéric Delair teve a brilhante ideia de numerar os patos consumidos por seus clientes, uma jogada de marketing sensacional! Até hoje, ao pedir tal iguaria, você recebe um cartão com o número do seu pato consumido!

Mas vamos desde o início, o restaurante funciona no sexto andar do edifício localizado na 15, Quai de la Tournelle, com vistas para o Sena. Você é recebido no primeiro andar, onde há uma lojinha com produtos da marca e espera para ser encaminhado pelo elevador por onde só sobe os integrantes de cada mesa por vez. A decoração, na minha opinião, está um pouco decadente, mas ainda guarda algo de elegância e a vista, definitivamente, rouba a cena. O número de garçons é bastante grande, considerando a média européia, o que demonstra prestígio.

Recebemos a carta de vinhos, que juro, parecia mais uma bíblia! Acho que nunca havia visto uma carta tão extensa! A adega deles é impressionante. Achamos mais fácil pedir recomendação ao sommelier, que foi bem simpático.

Mas vamos ao que interessa, e o pato? Era isso tudo mesmo? Pois sim, era. Nos apresentam nosso pato inteiro, ele é destrinchado em nossa presença para ser finalizado em duas maneiras. A primeira com o molho derivado do suco retirado com a prensa dos ossos e a segunda grelhado. Tudo perfeito!

Assim chegou ao fim nossa viagem! Toda uma semana de celebrações! Feliz por estar viva, por ter quem amar e por me sentir querida, com saúde para me exceder, com liberdade para exagerar e com gente bacana para compartilhar!

Pronto! Agora eu podia voltar para casa, aproveitei cada segundo, até a última gota. Não faltou nada! Não sobrou nada!

Preciso resolver problemas diariamente, tenho um monte de defeitos, muitas coisas queria ou posso ainda mudar, mas o importante é que sigo aqui. Sigo aqui. Às vezes, um pouco envergada, mas inteira e aberta para a segunda metade do meu primeiro século.

Fiz 50 anos! Francamente, acho que mereci meu conto de fadas particular. Sabia que um dia acabaria, sei que um dia acabará, mas hoje não.

Saúde!

2 comentários em “50 anos, saúde!”

  1. Esse aniversário sem festa foi bem diferente para os teus padrões, mas essa viagem é simplesmente uma demonstração perfeita do que você gosta e te dá prazer. Já tivemos também a nossa experiência com a Andouillette. Jamais esquecerei aquele odor 🤢🥴

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