É, assim desse jeito, tudo junto ao mesmo tempo, afinal é como tudo na minha vida!
Começando pelo concerto, fiquei sabendo que a Anitta faria um show em Londres! E sim, estou falando da funkeira carioca, a própria! E pode torcer o nariz à vontade, eu adoro, acho ela poderosa!
Convenci o pobre do Luiz a ir comigo. Nem foi tão difícil, tendo lugar para sentar, ar condicionado e bebida… ele topa quase tudo!
E como foi? Vamos lá, sendo preciosista, o som não estava dos melhores, o figurino poderia ser mais caprichado e a cenografia era fraca . Foi o que eu esperaria de um show de funk no Brasil. Entretanto, considerando que hoje ela é uma atração em turnê internacional, está na hora de investir mais na produção.
Dito isso, na prática, me diverti pacas! E digo mais, é raríssimo ver qualquer show na Europa onde as pessoas não estejam todas sentadas comportadas, principalmente em um teatro. Inclusive, se alguém levantar, as pessoas reclamam. Foi o primeiro concerto que fui por essas bandas de cá do oceano onde estavam absolutamente todos de pé dançando o tempo inteiro! Bom, todos menos meu marido, que era o único sentado com sua bebida, mas também não me perturbou. E, no fundo, mas bem lá no fundo, acho até que ele se divertiu também!
Antes, durante o “esquenta”, dois DJs começaram a animar o público. Segundo um deles, estilo “Rio Old School” e era mesmo! Assim que, quando entrou Anitta, já estava rolando um clima de festa no teatro. E acho que ela realmente comparece e não decepciona. Gosto muito da sua atitude e a considero uma feminista.
Não é música erudita, nem se propõe a ser. As letras não são sofisticadas ou filosóficas, e novamente, também não se propõem a ser. Para mim, é simplesmente uma batida boa para dançar e soltar a franga! E esse propósito é muito bem cumprido.
Beleza! Acabou o concerto e resolvemos comer alguma coisa antes de vir para casa. Já tinha bebido um par de whiskeys durante o show, estava bem animadinha, mas nada que não estivesse acostumada e, ainda assim, no jantar, só tomei água. Afinal, além de estarmos em plena terça-feira, estou dando esse detalhe pela sequência da história.
Voltamos para casa, tudo muito bom, tudo muito bem!
No meio da madrugada, por volta das três da matina, acordei com vontade de ir ao banheiro. Não estava me sentindo muito bem, algo tonta, achei que podia ser da bebida e o jantar estava me pesando um pouco. Mas nada que me chamasse tanta atenção. Por isso, não me preocupou, só pensei, faço meu pipi rapidinho e volto para dormir. Levantei rápido e fui.
Estou acostumada a levantar durante à noite. Nem acendo as luzes, faço tudo no piloto automático.
No banheiro comecei a passar mal de verdade, uma sensação de mal estar como se fosse vomitar, mas não estava exatamente enjoada. Pensei, vou lavar o rosto antes de ir para cama para ver se melhoro. Mas de pé, nem consegui abrir a torneira da pia. Percebi que piorava exponencialmente e decidi voltar logo para cama. Só que não deu tempo. Apaguei completamente ali mesmo. Desmaiei.
Eu nunca desmaiei antes na minha vida, não tinha ideia que isso poderia acontecer nem qual era a sensação. Mas foi como se tivesse tomado anestesia geral. Lembro do que descrevi acima e lembro de acordar ao ouvir a voz do Luiz me chamando. Abri os olhos no chão, sem ter certeza de onde estava e ver seu rosto assustado. Extendi a mão para ele.
Foi tudo muito rápido, questão de segundos. Pela versão do Luiz, ele ouviu o barulho forte vindo do banheiro, me chamou e eu não respondi. Ele foi atrás de mim e quando chegou na porta eu já estava abrindo os olhos e com a mão pedindo ajuda para levantar.
Não senti nada, mas durante a queda, bati forte com a parte de trás da cabeça e me abriu um corte. Ficou manchado de sangue onde caí e Luiz viu.
Cheguei na cama bastante tonta e suando muito. Ele acha que tive alguma queda de pressão. Honestamente, não tenho ideia, mas acho que faz sentido.
Ele começou a perguntar se queria ir para um hospital e a dizer que minha cabeça estava sangrando. Sinceramente, eu mal escutava, só me preocupei em dizer para ele: Luiz, eu não caí, eu desmaiei. Porque não sabia o que poderia acontecer e achei que ele poderia precisar dessa informação.
Em meus pensamentos, no primeiro momento o corte da cabeça não me preocupou, o desmaio sim. Comecei a pensar tudo que precisava checar em mim. Tive um pai com todos os problemas do mundo e eu tinha um check list do que precisávamos checar eventualmente.
Então, primeiro fiz o movimento do sorriso com a boca. Quem sofre um derrame não consegue sorrir. Derrame não era. Lembrei o número da minha identidade e data de nascimento. A memória não estava afetada. Meus braços não estavam dormentes e não tinha dor no peito. Não era coração. Minhas frases saíam com lógica, eu não trocava as palavras, meu corpo obedecia os movimentos, provavelmente não era AVC… e fui me auto diagnosticando. Ok, aparentemente não tenho nenhum dano neurológico.
A partir daí, comecei a prestar mais atenção ao que Luiz falava e ele, durante esse período, teve a ideia de pegar um pouco de papel higiênico branco para estancar o sangue. E também foi uma forma de literalmente me mostrar que estava sangrando ainda, porque meu cabelo é escuro e absorvia boa parte do líquido, não dava para saber bem o que tinha acontecido. Minha cabeça até doía um pouco, mas com toda a adrenalina, não fazia muita diferença.
Comecei a me preocupar com a pancada. Será que era seguro dormir? Fiquei bolada e resolvi ouvir o Luiz. Também havia melhorado a sensação de mal estar e era mais fácil levantar.
Lá fomos nós para a emergência do hospital!
Resumo da ópera, realmente não parecia haver nenhum dano neurológico e não dava para ter certeza do que havia se passado. A queda de pressão era uma das possibilidades. Provavelmente, foi um evento isolado. O médico não achou necessário fazer uma ressonância, porque não bati a cabeça e desmaiei, foi ao contrário. Além dos meus reflexos estarem normais. Mas o corte na cabeça precisava ser costurado. Na verdade, optamos por usar um tipo de cola cirúrgica ao invés de dar pontos. O médico orientou ao Luiz o que ele deveria reparar em mim nas próximas horas, já que eu mesma poderia não notar se fosse algo mais grave, e nos liberou.
Saí de lá pela manhã, dia claro, com a cabeça literalmente colada.
Daria um jantar nessa mesma noite, pensei em manter porque estava tudo engrenado. Para mim, se estava resolvido era que eu já estava boa, pronto, sem drama! Mas considerando que não havia dormido nada e não sabia bem como o corpo iria reagir, adiei o jantar para o dia seguinte.
Foi bom, porque durante o dia me caiu a ficha do que havia passado. Não tive maiores consequências. Adianto que ficou tudo bem, felizmente. Mas me dei conta de todos os riscos e de tudo que poderia haver acontecido.
Quantas histórias havia escutado de gente que caiu no banheiro, bateu a cabeça e morreu? Diversas! Isso quando não havia algum dano cerebral. Porque tudo em um banheiro é duro e se já é complicado você cair consciente, imagina sem nenhuma defesa! Você não põe a mão para proteger, você não desvia a cabeça… fica completamente vulnerável.
Uns centímetros um pouco para lá ou para cá, alguns segundos antes ou depois… e seu destino está traçado, é simples assim! Definitivamente, ou tenho muita sorte, ou sou muito protegida, ou minha cabeça é muito dura! Por outro lado, mais maluca do que sou, difícil ficar! Então, tudo bem, mas foi um susto da porra!
Difícil não te fazer repensar o quanto a vida é efêmera. E o que deveria ter sido apenas uma “bobagem”de um tombo, me afetou mais do que eu esperava. Realmente, senti medo de me levantar durante à noite por alguns dias.
Depois voltei à rotina. Mas admito que, mesmo tendo passado alguns meses, o local ainda é um pouco sensível e sinto um tipo de “dor fantasma”. Às vezes, é como se estivesse doendo no local, mas passo a mão na cabeça e não sinto nada. Deve passar em algum momento.
Bom, na semana seguinte ao desmaio, veio uma amiga da Alemanha nos visitar, nossa madrinha de casamento, que conheço desde os tempos de solteira. A gente recebe muitas visitas e muitos hóspedes, mas como estou falando de coisas esquisitas, quero contar um evento muito curioso que aconteceu durante a sua visita. Entre o evento da cabeça quebrada e a chegada dela, estava pensando a semana inteira em uma outra amiga que faleceu há muitos anos, se suicidou. É uma história longa e complicada, mas a memória dela me volta de tempos em tempos por razões que nem quero explicar agora, mas enfim, apesar das minhas crenças e descrenças, todo mundo fala tanta coisa ruim sobre quem se suicida… que era inegável para eu pensar se ela estaria bem.
As duas se conheceram e foram muito presentes na minha “vida de solteira”. Mas isso não significa que a gente fique tocando sempre nesse assunto, afinal, fará pouco menos de uns 30 anos que isso aconteceu.
A primeira vez que encontrei minha amiga que faleceu foi em um réveillon, em Búzios. Foi amizade à primeira vista, instantânea! Tudo bem, eu faço amizades de infância em 15 minutos… é verdade… mas nesse caso, a gente realmente se entendeu muito bem, não éramos tão parecidas, mas nos complementávamos, nos entendíamos, tínhamos problemas parecidos… e um tipo de sintonia que eu costumava chamar de “efeito catalizador de merdas”! Tudo que uma sugeria, por mais absurdo que fosse, a outra sempre, mas sempre, topava! Bora? Bora!
Nessa noite de Ano Novo, encontramos na areia da praia uma garrafa fechada de vodka Smirnoff, reza a lenda que em uma macumba. Veja bem, a gente era meio dura nessa época, estudantes, começando a trabalhar, a gente fazia vaquinha para comprar Kovak! Imagina se a gente ia ficar de mimimi para tomar uma Smirnoff na faixa! A gente nem quis saber, pedimos licença para os santos e matamos a bebida sem pensar duas vezes!
Foi um ano muito legal! As portas começaram a se abrir, a vida melhorou! Foi o ano, inclusive, que conheci o Luiz. E sempre brincávamos que o segredo daquele ano foi a tal vodka de macumba que a gente tomou!
E contei esse caso para dizer que em uma das noites que saímos com a amiga visitante da Alemanha, do nada ela lembrou da outra amiga durante a conversa. E falei, que engraçado e que coincidência, pensei nela essa semana passada toda! Muito louco, né?
Pois é, passamos uma noite ótima, divertida, ouvindo música ao vivo no Nightjar, um bar pequeno que adoro com uma história de clandestinidade no passado, quando os donos fabricavam (e contrabandeavam) sua própria bebida. Até hoje, não há um letreiro, é uma porta discreta, entre dois pontos comerciais.
Quando fomos embora, pela hora resolvemos pedir um carro e ficamos ao lado da porta para aguardar. Nesse minuto que a gente saiu e Luiz pegou o celular para chamar o Uber, minha amiga e eu olhamos para o lado e, bem no chão da calçada, uma garrafa vazia… de vodka Smirnoff!
Qual a probabilidade de aparecer em Londres uma garrafa de vodka e dessa mesma marca na calçada, em frente ao bar que saímos e acabamos de falar no assunto? Foi de arrepiar!
Não sabemos e nunca saberemos o real motivo da extrema coincidência, mas para nós, ou principalmente para mim, foi um momento tão bacana. Como uma resposta que estava tudo bem e que ia ficar tudo bem.
Dia seguinte, festa de inauguração do apartamento novo, meu endereço #46! De cabeça quebrada mesmo, com hóspede da vez e com futura hóspede, com amigos novos e antigos, entre memórias e possibilidades, esquisitices e normalidades… como a vida costuma ser, pelo menos a nossa.
E ficou tudo bem.