Já tive fases diferentes em relação à escrita, às vezes, escrevo compulsivamente, outras preciso dar um tempo, que nunca é tão longo. Afinal, como sempre costumo dizer, escrever tem sido minha terapia mais eficiente nos últimos anos. Mas agora estou numa fase que não sei exatamente o que há, porque não me falta inspiração ou histórias, na verdade, não me faltam nem mesmo problemas, mas falta vontade de sentar e contar o que sinto.
Chato, porque ando mesmo é de saco cheio de um monte de coisas e desabafar com o “papel” não seria nada mau. O difícil é saber por onde começar, porque não sei se quero abrir essa caixa de pandora. Mas sei que ela está lá e é preciso digeri-la.
Tudo começou com uma enorme insatisfação em relação ao meu país de origem, sim, o Brasil. E o que isso tem a ver com as calças? Pois tudo, e só agora a ficha está começando a me cair.
Tenho costume de dizer que posso morar em qualquer lugar, é uma questão de haver uma oportunidade. Levo mais de 10 anos fora do Brasil e é comum a mesma pergunta me ser repetida: e você não quer voltar? Acho que a gente nunca realmente volta, porque tudo muda, mas me concentro no fato de ir morar novamente no Brasil.
Pois muito bem, até o ano passado, era uma possibilidade como as outras, havendo boa oportunidade, por que não? Houve um momento, há uns três ou quatro anos, que cheguei a sentir vontade de ir. Foi mais ou menos quando se iniciou a “pacificação” das favelas do Rio e a cidade estava desbundantemente linda! Ou talvez, fossem meus olhos, mas juro que fiquei tentada. Acho que porque foi a única vez que, pelo menos o Rio, parecia haver melhorado um pouquinho. Só parecia, mas enfim, naquele momento, cheguei a acreditar.
Os amigos chamando, a imprensa dizendo que o país estava “bombando”, tudo parecia ir a favor. Fiquei contente e com uma ponta de esperança, mas entre nós, meu pé estava bem atrás. Não via essa situação tão positiva, na verdade, o cenário não me parecia nada bom.
Posso entrar em mil questões políticas, o que francamente, estou sem a menor paciência agora, mas havia um ponto que sempre bati e sigo batendo como um dos principais: a corrupção do país foi institucionalizada!
Sentia dizer isso num vazio e nas vezes que ainda tive um mínimo de vontade de entrar nessa discussão, vinha sempre o irritante argumento que hoje em dia é quase capaz de me fazer perder uma amizade: mas não foi sempre assim?
Não, eu acho que não.
Corrupção sempre existiu e sempre existirá, mas nunca percebi viver em um país onde ela fosse INSTITUCIONALIZADA. Parecida ao modelo russo, que acho que é para onde o Brasil caminha. Terra de ninguém.
Essa coisa “malufista” do rouba, mas faz, que o PT condenou tanto no discurso e agora dissemina aos sete ventos.
É o único partido corrompido? Também acho que não, mas foi o primeiro que vivenciei cravar a máxima de que os fins justificam os meios. E nos últimos 10 anos, é o que está no poder e com a maioria na câmara e senado em alianças, portanto, sujeito a maior parte das críticas.
Eu não acho que qualquer fim justifique qualquer meio. E o favorecimento dos seus é gritantemente visível. Além do que, não vejo nenhum avanço significativo para o país. Algum benefício social, é verdade, mas a um custo estúpido e não sustentável.
E se olharmos para o lado, se não for quem está no poder agora, quem seria? E já nem vou mais para o discurso de direita e esquerda, coisa que não vejo clara no Brasil há anos! É uma única massa misturada, beneficiando seu pequeno grupo. Conheço gente, teoricamente bem informada, que nem se importa se houve ou não corrupção, só importa de que lado foi! Se foi do lado “oposto” é um absurdo, se foi do “seu” lado, só pode ser intriga da mídia! Fala sério! Bandido é bandido de qualquer lado! Às vezes, a discussão beira as raias do ridículo quando você aponta um roubo e ao invés de concordar que é absurdo, o cidadão te responde algo como: ah, mas beltrano roubou muito mais! Alguém se dá conta que isso não está certo? O fato de alguém estar “mais errado” não justifica ninguém! Estão todos errados! E estão contra nós, as pessoas de bem! As pessoas que trabalham, honestas, que pagam seus impostos, que respeitam os direitos alheios e que se não concordam com alguma falcatrua, se transformam em elite burguesa ou socialista de botequim, dependendo de quem se queixe. Sei, sei…
Existe gente reacionária? Claro que sim! Existe gente mais preocupada em meter o bedelho na vida alheia do que cuidar da sua? Óbvio! O ponto é que essas pessoas continuam sendo vistas como erradas, ainda não se “institucionalizou” como um fim que justifica os meios. O que, infelizmente, pode mudar em breve. A bandalha geral costuma trazer à tona a repressão moral. E já se nota essa reação, principalmente, com a força que ganhou a bancada evangélica. Nada contra nenhuma religião, nada mesmo! Mas tudo contra a religião ditando política!
E assim, la nave va…
Já era! Não vejo nada próximo a uma melhoria na minha geração. Não digo nem solução, mas alguma melhoria significativa. Desesperança total!
Meu blog nunca foi político. Tenho minhas opiniões, só não costumo manifestá-las aqui, não é meu foco. Por isso, não vou entrar em maiores discussões políticas nesse momento. Mas precisava dar essa introdução para chegar onde preciso.
E o que quero dizer é que, pela primeira vez desde que saí do Brasil, não quero voltar de jeito nenhum! E o impacto desse sentimento tem sido uma das sensações mais difíceis desde então.
Estou com isso martelando na cabeça desde o início do ano, querendo e não querendo falar ou pensar a respeito, porque me remete mais uma vez à questão da identidade, que já me deu bastante pano para a manga nos últimos anos.
Há alguns meses, quando vi uma multidão ir para as ruas protestar e dizer “chega” (e tive o privilégio de estar no Rio nesse momento), me reascendeu um fiozinho de esperança. Sim, é possível que não estivesse claro para todos sobre o que estavam protestando, mas era mais do que óbvio que existia uma sensação de insatisfação generalizada, algo como: não, a gente não acha que está tudo bem! E não, não era por vinte centavos!
Da mesma forma que tive o prazer de estar presente no momento acima, tive o desprazer de também estar em 7 de setembro, quando outra grande mobilização estava marcada. Vi por toda a semana anterior a mídia mostrando cenas dos “vândalos” perigosíssimos, que todos nós sabemos que foram infiltrados para assustar o pessoal do bem. Controle pelo medo, já vi esse filme.
Sim, eu sei que há muito mais envolvido, uma pena, mas também não tenho vontade de discutir a respeito, porque não preciso convencer ninguém. Novamente, estou simplesmente pintando o cenário que foi se moldando ao meu redor.
Para mim, foi como uma pá de cal em qualquer esperança que o país tivesse algum caminho melhor. Francamente, espero estar errada, mas não acredito mais. Não acredito de jeito nenhum. Eu não tenho vergonha de ser brasileira (ou o que me sobrou disso), mas tenho muita vergonha do que andam fazendo com meu país de origem.
E como sou de extremos, de sim ou não, de certo ou errado, de quero ou não quero, cheguei à conclusão que precisava me posicionar. Não sou capaz de mudar nada no Brasil, não tenho voz nem vontade, portanto, por que me importar tanto com isso? Se nada vai mudar, mudo eu, mudei eu.
E me dói muito assumir que não quero mais morar ali, independente da proposta que houvesse, não faço mais a menor questão de ser brasileira e não me identifico. O país que lá está não é mais o meu país. Fico triste em saber que entristecerei gente muito querida ao dizer isso, principalmente minha família, mas muito mais triste ficaria eu se fosse obrigada a voltar. A única razão pela qual vou de visita, e irei quantas vezes forem necessárias, são as pessoas, minha família e meus amigos. Meus pais seguem envelhecendo, a mãe do Luiz anda precisando de maiores cuidados e não tenho resposta sobre como vamos lidar com essas questões no futuro. Só posso tentar fazer o melhor possível.
Assumir isso para mim mesma é bastante duro, mas precisava escrever para realizar. Entubar!
Não acho que seja uma decisão definitiva, porque nunca sabemos que necessidades teremos e o que seremos obrigados a aceitar. Mas é como penso hoje.
Estive no Brasil por seis semanas. Bastante tempo, entre Rio e São Paulo. Luiz foi a trabalho e fui atrás. Acho que as coisas acontecem quando devem e talvez eu precisasse estar lá por esse período para entender como isso vinha me martirizando nos últimos meses.
Houve um lado muito bacana que foi poder estar mais de duas semanas direto na casa dos meus pais. E pouco mais de três semanas em São Paulo, onde havia morado por dez anos, antes de sair pelo mundo.
Foi impagável poder dar mais atenção à minha mãe e aproveitar sua companhia em atividades rotineiras, conviver com meu pai e suas rabugices, saber sobre o casamento do meu irmão e vê-lo feliz, ver minha sogra melhor e reagindo, rever primos, encontrar amigos e filhos de amigos, enjoar de comer pão de queijo, lembrar o sabor de carne boa, encher a lata nos botecos cariocas, jantar nos divinos restaurantes paulistas, encontrar amigos do colégio, lembrar que sei dirigir e me sentir poderosa por estacionar de baliza na primeira tentativa, escutar amigos músicos, encontrar a “Diretoria”, receber visitas, visitar, tomar sol na piscina, caminhar no calçadão, ter amigos que saem de casa ou de outras cidades para te encontrar, ter vontade de ir para outras cidades rever amigos, relembrar antigos caminhos e descobrir novos, me sentir mais alta que a média das pessoas em volta, achar que nem preciso emagrecer, cortar o cabelo e fazer escova na minha cabeleireira favorita, andar de camiseta na rua sentindo a brisa da praia, saber os nomes dos garçons, ter sempre uma casa oferecida para dormir, rever amigos que conheci em países diferentes e me sentir em um universo paralelo como se fosse ontem, cantar música ruim sem me importar e ainda decorar a coreografia, bater perna no Rio Sul, comer feijoada olhando para o mar ouvindo música boa, tomar água de côco geladinha, beber sucos naturais realmente naturais… e tantas coisas que me fazem guardar um vínculo e não querer sair correndo sem olhar para trás.
Na última noite, depois de jantar com amigos, voltei para casa chorando. A bebida me caiu mal, não devo beber quando estou triste, mas não sabia que estava. É que pelo caminho me bateu a consciência de que estou condenada a viver com saudade sempre, de carregá-la nas veias. Não há mais lugar no mundo onde eu possa viver sem ela. Eu sei que é o preço, mas naquela noite me pareceu tão injusto. Contraditoriamente, também me deu raiva de sentir tanta saudade, de ainda gostar tanto de um lugar que não é mais meu e nunca será, porque eu já não sou.
E agora que está dito e assumido, não posso dizer que estou feliz, mas aliviada. De certa forma, ainda me resta o privilégio da escolha. Talvez agora pare de tossir com esse sapo entalado na garganta. Tentar ressurgir das cinzas uma vez mais e esperar que possa renascer melhor.
Amiga, vc e o Luis serão sempre pessoas muito especiais na minha vida, e tenho certeza, na de muita gente… não se preocupe! Iremos atrás de vc onde vc estiver e quando precisar, aqui estaremos, de braços e corações abertos… seja no Brasil, na Espanha, na Inglaterra ou na Conchinchina!!! Te amo muito!!!
É exatamente assim que eu também me sinto. As quase 6 semanas que passei agora no Rio foram maravilhosas pois pude experimentar como é viver de novo o dia-a-dia lá sem estar de férias. Mas antes de voltar bateu a certeza de que a saudade iria voltar a tomar conta de mim. Mas eu também tenho a certeza que não quero viver em um país que não me respeita como cidadão e onde os meus direitos não valem nada. Onde incompetência é tratada com impunidade ao invés de punição. Na Europa você aprende que tem direitos. No Brasil nem sequer sonhava que direito do cidadão é algo real e que deve ser e é respeitado. Aqui a imprensa atua como orgão questionador da politica. Aqui a opinião pública faz diferença nas decisões que são tomadas pelos políticos. No Brasil ouvindo os noticiários sobre os erros absurdos na logística da visita do Papa não conseguia mais aceitar sem indignação que os nossos políticos nos envergonham internacionalmente e não há consequências. Hoje me envergonho do meu país porque aprendi que tenho direitos e não sou simplesmente mera espectadora como sempre me senti antes de sair do Brasil. Te entendo e também me sinto triste. A sociedade passiva e a corrupção institucionalizada me roubam o direito de viver feliz no meu país e me condenam a viver longe e carregando essa saudade dolorosa da familia, dos amigos, da vida cotidiana, das paisagens do lugar onde nasci e cresci. Talvez assim se sintam os exilados. Talvez a vivência dos nossos direitos nos tenha transformado em exilados da era moderna.
Na sociedade que depois de tantos anos de ditadura e de uma “democracia corrupta e impune” temos vândalos e saqueadores que só buscam o próprio benefício. Simplesmente espelho da atmosfera individualista que nos tornamos. Sejam os vândalos plantados ou não, sua ação simplesmente mostra a cara da sociedade brasileira.
Querida Bianca:
Ate escrevendo uma cena triste , tu consegues ser engraçada “eu não sabia que tava triste”, só um ave Phenix mesmo 🙂 Enfim, infelizmente faz parte, nada e perfeito, agarramos algo com a mão, e com a outra abrimos. Já passei por isso, queria não sentir saudade, porque me dava dor de coração por sentir tanta! Então ocupava a mente com outra coisa, não escutava mais música brasileira ou outras q me lembravam o passado, centrei que ” my home is where my heart is” minha Casa e onde meu coracao estar. Como a minha mãe diz, os filhos Sao como passarinhos, precisam conhecer novos horizontes, outros sao mais felizes no ninho, mas outros tambem podem ser felizes fora dele. Fica bem. Love xxx
Lindo Bi!!Parabéns…
Querida amiga, mesmo distante tanto tempo, sua caixa de Pandora e a dos Brasileiros! Triste!!! Mas… so de ler seus ” escritos” me matam as saudades e me fazem entrar em meu imaginario! Enquanto voce pensa em voltar, eu fico imaginado uma maneira de ir para dar mais oportunidades para Mariana!
Beijos, besitos and… kisses !!
Esse assunto é mesmo muito espinhoso e renderia horas… Mas entrei aqui às 05:15 da manhã pra dizer que fazia tempo que não lia com prazer. Obrigada por compartilhar.
Beijos!