100 – A número 100!

Caramba, e chegou a crônica número 100!  

Se ainda não falei, deu para perceber que adoro símbolos e rituais. Minha vida é dividida em ciclos, mais longos ou mais curtos, que preciso terminar e começar outro novo. 

Para alguns amigos já contei como iniciou essa história de escrever crônicas, mas agora com essa vida “pública”, conto para todos. Comecei escrevendo para mim mesma como um registro do que acontecia em Madri, que na realidade era pano de fundo para uma maneira de olhar as coisas. Era quase como um diário. Daí Luiz ficou curioso e pediu para ler. Deixei meio sem graça, apesar de não haver nenhum segredo. Ele gostou tanto que me incentivou a publicar um blog. Quase morri de vergonha, pois sempre foi muito difícil me expor, mas topei até porque era difícil. Na minha cabeça, como preciso de um limite, pensava, vou tentar chegar na número 100. E aqui estamos, nem acredito! 

Achava que quando chegasse esse momento teria cumprido minha missão, mas a verdade é que estou totalmente viciada e não sei mais não escrever. O grau de constrangimento que sentia no início é proporcional à delícia de possuir um canal de expressão. Poder compartilhar experiências é tudo de bom. 

Porém, preciso fechar um ciclo e iniciar outro, é a minha natureza. E por um acaso feliz, hoje inicio outro ciclo na minha vida. 

Hoje foi o primeiro dia do meu master em arte contemporânea, equivale a uma pós-graduação no Brasil. Cerca de quinze anos após a Academia, volto para faculdade. Outra área, outro país e a mesma ansiedade. É como entrar na montanha-russa, naquela sensação de segundos antes de iniciar o trajeto. Estou lá porque quero, mas sempre nesse momento me pergunto se deveria estar ali. 

Pois sim, deveria. 

Estamos onde deveríamos e nos cabe a responsabilidade de fazer isso valer a pena. 

Hoje muitas idéias contraditórias passaram pela minha cabeça. Por um lado, estava aliviada de finalmente me sentir começando algo, tendo um plano de gente normal. Por outro, me sentia presa, é difícil para mim pensar no prazo de um ano. Aprendi a sobreviver no caos e é nesse caos que me diferencio. Tive a alegria de perceber a oportunidade de concretizar projetos e ao mesmo tempo o medo de precisar confrontar minha própria incompetência. Por que ainda é tão difícil crescer?

Termino com meu mandra de cabeceira, que me resgata dos momentos de angústia, não necessariamente maus. É meu grito de guerra, meu amuleto para recomeçar. 

“Se eu me demorar demais olhando Paysage aux oiseaux jaunes, de Klee, nunca mais poderei voltar atrás. Coragem e covardia são um jogo que se joga a cada instante. Assusta a visão talvez irremediável e que talvez seja a da liberdade. O hábito de olhar através das grades da prisão, o conforto de segurar com as duas mãos as barras, enquanto olho. A prisão é a segurança, as barras o apoio para as mãos. Então reconheço que a liberdade é só para muito poucos. De novo coragem e covardia se jogaram: minha coragem, inteiramente possível, me amedronta. Pois sei que minha coragem é possível. Começo então a pensar que entre os loucos há os que não são loucos. É que a possibilidade, que é verdadeiramente realizada, não é para ser entendida. E à medida que a pessoa quiser explicar, ela estará perdendo a coragem, ela já estará pedindo; Paysage aux oiseaux jaunes não pede. Pelo menos calculo o que seria a liberdade. E é isso que torna intolerável a segurança das grades; o conforto dessa prisão me bate na cara. Tudo que eu tenho aguentado – só para não ser livre…”  (livro “Para não esquecer” de Clarice Lispector)

101 – Espabila Favila que te come el oso!

Há uma expressão em espanhol que acho sensacional: espabila Favila que te come el oso! Explicando por partes, “espabilar” é algo como prestar atenção, ficar atento; “Favila” é um nome próprio; e “que te come el oso” é que te come o urso. Ou seja, fica esperto Favila senão o urso te come! Na versão tupiniquim, “dá mole que jacaré abraça”! 

O mais engraçado dessa expressão é sua origem. Por volta do ano 600, houve um rei godo, o tal do Favila,  assassinado em seu próprio castelo. A versão oficial é que um urso havia comido o rei (dentro do castelo!). Percebe-se que a cara-de-pau política não é nada atual. 

Como às vezes a expressão fica um pouco grande, também se escuta a versão resumida “espabila Favila…”; ou com uma voz mais grave e um olhar de canto o “espabilate”, que soa como “espabilatêêê”. E com sotaque do sul, sai algo como “rpabilatê”. 

Fico doida para falar isso para alguém, mas ainda não consegui encaixar em nenhuma frase com segurança. O jeito é quando encontro uma pessoa-rolha imaginar que estou falando para ela “espabilatêêê” e sonhar que ela vai dizer “perdón” e sair da minha frente. Bom, nunca acontece, mas pelo menos não fico de mau humor atrás das rolhas. 

A primeira vez que escutei isso foi com um casal de amigos espanhóis muito legais. É que fizemos uma festinha aqui em casa e eles não puderam vir. Daí se ofereceram para, no fim de semana seguinte, nos levar a qualquer lugar que quiséssemos conhecer em um raio de 200km de Madri. Fomos até Almagro, parando um pouco pelo caminho. Lá em Almagro, alguém ficou de bobeira na frente dele com o carro e ele soltou o tal do “espabila Favila que te come el oso”. E eu, o que? Estava acostumada ao “me cago en la leche”, mas essa era novidade para mim! 

Ele me explicou a historinha que achei genial e, desde então, tento falar também, mas nunca tenho uma chance. Então, só para matar a vontade, vai escrevendo mesmo:  

¡Espabila Fabila que te come el oso!

102 – Começar de novo…

Eu e minha boca grande! A gente precisa ter muito cuidado com o que deseja! Porque acontece! 

Não estava falando tanto sobre começar um ciclo novo, de novos olhares e tal? Pois é, então não seja por isso, lá vamos nós começar outra vez! 

Alugamos esse nosso apartamento por um ano, acho que contei isso lá atrás. A verdade é que naquele momento um ano nos parecia uma vida, mas passou num piscar de olhos.  

Havia a possibilidade da dona do apartamento precisar morar fora de Madri e, automaticamente, renovaríamos o contrato, bom para ela e para nós. Claro que isso não aconteceu, o quer dizer que lá vamos nós, os caracóis alucinados, com a casa nas costas de novo! 

Enfim, recebemos a notícia com um certo desânimo. Dá cansaço só de imaginar a trabalheira. Olho para meu gato com aquela cara de Garfield e o imagino dizer “joder!”.Mas como diz o ditado, o que não tem remédio…  

Uma coisa está mais fácil, minha noção de espaço mudou e consegui me acostumar a lugares menores. Os apartamentos mais centrais na Europa são sempre muito pequenos e no início dava cabeçadas pela casa. Agora acho até grande. Engraçado que temos poucos armários e minhas coisas que pareciam poucas quando saímos do Brasil, ou melhor, o mínimo que poderia trazer, aqui me parecem um exagero. Chego ao absurdo de gostar quando quebra um copo porque rapidamente associo a mais espaço no armário ou menos coisa para carregar! 

Iniciamos a busca, que não é nada fácil, mas temos um certo know-how e estamos tentando nos animar. Quem sabe ainda vamos para um lugar melhor, não? Um ano depois, estamos nós novamente caminhando pelas ruas e procurando placas de “alquiller” pelas portarias dos edifícios. 

Hoje, voltando para casa, percebi o quanto a rua onde moramos se tornou familiar. Sei a ordem das lojas e os cheiros quando passo na frente delas; conheço boa parte dos cachorros que passeiam pelas calçadas; reconheço os dois pedintes cativos da rua, uma senhora que se veste sempre de preto e um senhor com uma deficiência em um dos pés que desaparece no inverno; sei em que parte o asfalto está quebrado e preciso me cuidar para não torcer o pé; passo sempre rindo na frente da loja onde compramos o sofá-cama, aquele que viemos carregando na cabeça até o apartamento; sei como a rua fica arborizada e também quando as folhas caem; sei qual o caixa eletrônico onde não pago taxa de administração; sei onde é melhor pegar taxi e para que lado devo ir; sei onde comprar flores e onde encontro o “champú en seco” mais barato; sei um monte de coisas. Talvez seja a hora de saber outro lugar. 

103 – Um show quase bom e a língua sem palavras que queria dominar

Fomos ao show de um conhecidíssimo bailarino flamenco, que queria ver há algum tempo. Não quero dizer o nome dele, pois apesar de sua apresentação ter sido impecável, o som estava péssimo e houve uma série de problemas que prejudicaram o espetáculo como um todo. Uma pena! Fora o fato que seu ego subiu um pouco a cabeça e, como se diz aqui, estava um tanto creído. 

Mas vamos lá, de tudo se tira algo de interessante e tirei duas coisas. A primeira foi seu domínio do corpo, a total consciência de cada músculo e de cada movimento, como se fosse uma máquina azeitada, uma engrenagem complexa onde tudo funciona. Impressionante! A segunda, foi em relação a qualidade dos músicos, a capacidade de um instrumento retorcer meu estômago. No fundo, essas duas coisas me falam de uma só, da possibilidade de expressão sem palavras. 

Tinha muita vontade de dominar uma linguagem que não necessitasse palavras. De certa forma, faço isso com a arte, mas queria mais, ainda acho meu alcance muito pequeno. Acredito que com o corpo, como no caso da dança, e com a música, essa comunicação é mais direta e universal.  

Quando vejo alguém que possui esse talento da expressão corporal, tenho vontade de chorar de tão forte que me bate. E não é incomum que eu veja cores ao escutar um instrumento que me emocione.  

Queria muito ter esse poder.

Não é à toa que nosso amigo dançarino flamenco estava tão creído, ele conhece o poder que tem. Tudo bem que a arrogância canibaliza esse dom, mas que se dane, quando ele dança é poderoso e se acabou! Não há discussão.

104 – Como é duro ser intelectual!

Quando era pequena, boa parte dos meus amiguinhos tinham medo de escuro, de lagartixas, de monstros e de fantasmas. Eu tinha medo de ser burra.  

Uma vez, quando me recusava a cortar o cabelo, minha mãe e minha avó vieram com uma história de que o cabelo grande pesava na cabeça e deixava a gente mais burra. Convenhamos, que sacanagem, né? Lembro de escutar aquela conversa com muita desconfiança que estavam me enganando, mas o pânico de ficar burra era maior e acabei fazendo papel de besta, pois cortei a porcaria do cabelo. Essa é minha primeira memória concreta de medo. 

Fui criada em Brasília, uma perfeita fábrica de intelectuais. Não estou falando mal da cidade, que gosto muito, mas como qualquer lugar, tem seus pontos positivos e negativos. Acho até que de maneira geral as pessoas são muito injustas com Brasília, mas hoje precisarei ser crítica também. É um lugar frequentemente chamado de “Ilha da Fantasia”,  que me soava um pouco absurdo quando morava lá, mas ficou muito claro quando vi de fora, com uma certa distância. A verdade é que Brasília, talvez por sua distância física e a forma como foi concebida, recebe o mundo através de filtros. É um “Castelo de Versailles” contemporâneo, situado uma montanha antes do “Castelo de Kafka”. Você até chega nele, mas não sem se macular e se emaranhar num sistema burocrático.   

Além do mais, todo aquele planejamento, realmente facilita sua vida, é corfortável e você tem mais tempo. Com mais tempo você pode, por exemplo, pensar mais, ler mais, estudar outros idiomas… Posso afirmar que boa parte das pessoas mais cultas que conheci foi em Brasília. Adicionalmente, a possibilidade de viver em um mundo razoavelmente idealizado, dá um prato cheio para ser um teórico, um intelectual de verdade. 

Passei minha adolescência buscando os livros e os filmes corretos, e me sentindo muito inteligente com isso. Nos meus sonhos mais secretos, queria ser uma intelectual. 

Quando fui morar no Rio de Janeiro, com quase dezoito anos, tomei um banho frio de realidade. Meu mundo teórico foi para o saco! E achei que ser intelectual era um porre! Eu era, e sou, a burguesa que reneguei tanto. Como também não falava alemão, resolvi que essa história de filosofar não era para mim. Parti para vida, para o trabalho e para os prazeres. 

Sem demagogia, tinha e tenho consciência da minha responsabilidade social e, na medida do possível, tento fazer ao menos o meu papel. Mas também tive que confrontar minha hipocrisia em achar muito cômodo ser a favor de um movimento de pessoas sem terra quando se tratava de uma fazenda no cu do judas, mas era assustadora a imagem dele batendo na minha porta. E uma hora bateu. Acusar policiais de massacres injustos me faz sentir redimida, mas a verdade é que se a arma estivesse na minha mão, será que não atiraria também? Conheci pobres indolentes e ricos trabalhadores, não digo que seja a regra, mas não houve como não redimensionar meus valores. Era fácil julgar um mundo do qual eu não fazia parte. Mas ao mesmo tempo, como poderíamos simplesmente nos conformar com o que existe? 

Há muitos anos deixei uma parte dessas questões de lado e resolvi viver e pronto. Agora, por coincidência ou porque não há alternativa, isso me bate na cara novamente. A volta à vida acadêmica me fez confrontar velhos demônios.  

Tenho uma professora que, a primeira vista, me parece uma mulher fabulosa, uma intelectual no melhor sentido da palavra. Daquelas que você escuta falando e pensa, queria ser assim quando crescesse. Para isso, só me falta ler uns 25 mil livros, 3 milhões de artigos, entendê-los, compará-los e buscar suas relações com fatos reais ao longo da história. Puta merda, como é difícil ser intelectual! Acho que não tenho competência nem paciência para todo esse trabalho! Mas como tapar os ouvidos e resistir a chance de tentar? E por que resisto tanto?

A verdade é que agora sinto muita falta do meu mundo filtrado, teórico e inteligente. Estar nele não fazia o mundo melhor, mas o fazia melhor para mim. Sinto uma saudade enorme do meu otimismo, de acreditar que faria diferença e que havia algo muito importante e um lugar muito especial me esperando. É egoísmo e não me importa, até porque é impossível, não será realizado. Invertendo meu passado, agora tenho muito medo de virar intelectual, talvez o bom mesmo seja ser burra. 

105 – O primeiro aniversário de casamento em Madri

Hoje é 18 de março de 2006, e fazemos aniversário de doze anos de casados. E sim, claro que tem festinha! Sempre comemoramos essa data, mas nos dois últimos anos foi meio complicado. Em um deles estávamos de mudança para Atlanta, dentro do avião acima do oceano, e no outro, em países diferentes, providenciando a mudança seguinte aqui para Madri. 

Acredido que as pessoas devam se casar pelos motivos certos. Nós casamos porque eu ia trocar de carro. Juro! Muito simples, juntei dinheiro para vender meu carro e comprar um melhor. Daí, sabia que Luiz também tinha uma reserva, mas nenhum plano para ela. Pensei, quer saber, por que ao invés de comprar outro carro, não juntamos esse dinheiro e compramos um apartamento pequeno para a gente? Luiz adorou a idéia e passamos a buscar imóveis. 

A verdade é que, mesmo juntando nossas economias, só dava para comprar uma kitinete porcaria, que atualmente se chama de maneira mais elegante: studio. Chegamos a conclusão que não nos adaptaríamos a nada tão pequeno e Luiz me perguntou se achava que meus pais poderiam nos ajudar. E eu, você acha que meu pai, conservador, iria ajudar a comprar um apartamento para a gente morar junto? Se ainda fosse para casar… E ele, muito prático, então por que a gente não casa? 

… e assim, já se vão doze anos! Posso contar essa história agora, pois o tempo nos deu credibilidade e tornou tudo muito divertido. Mas, honestamente, nunca fui capaz de entender quem pediu a mão de quem em casamento. 

O fato é que, desde muito cedo em nosso namoro, tínhamos essa sensação que ficaríamos juntos. Não era uma coisa conversada em palavras, era simplesmente uma consequência natural. Assim que, quando decidimos casar, achamos que era só ir até um cartório e formalizar. 

Foi a vez da minha mãe saltar dois metros de altura: como assim casar no cartório? E a festa?  

Sou a única filha mulher, tenho apenas um irmão mais novo. Casar sem uma comemoração era para eles a morte lenta e dolorosa, mas não entendia isso naquele momento. 

Lembro quando o Luiz perguntou a minha mãe por que ela não usava o dinheiro da festa para colocar armários no apartamento novo. E ela respondeu: você acha que vou colocar o dinheiro da MINHA festa em armários? Ele veio me contar rindo, sua mãe disse que a festa é dela, eu é que não falo mais nada! 

Bom, para apaziguar os ânimos, topamos fazer uma festinha íntima, só para a família, chamando a juíza para nos casar na casa dos pais do Luiz, em Teresópolis. Muito bem, quando se começou a fazer as contas de quem era “só a família”, chegaram a um número próximo aos cinqüenta. Minha mãe achou que era um número meio grande para fazer em Teresópolis e pensou em alugar um local. E aí, já que iria alugar um local, quem aluga para cinqüenta, aluga para cem… 

Foi quando comecei a entender e perceber a agonia que era para meus pais, principalmente para minha mãe, o fato de nós não ligarmos para uma festa de casamento. Então, nesse momento, perguntei a ela se era tão importante assim que a gente fizesse uma festa maior. E ela me respondeu que sim. Daí eu disse que tudo bem, só tinha um problema, nessa época eu morava na ponte aérea, trabalhando em São Paulo e voltando para o Rio nos fins de semana. Não tinha a menor condição de organizar ou me preocupar com uma festa de casamento. Prometi a ela que eu e Luiz apareceríamos no dia, mas que ela precisaria decidir e contratar tudo! Pois acho que era exatamente o que ela queria ouvir. 

No fim das contas, foram convidadas trezentas pessoas. Nos informaram que era normal uma falta de aproximadamente 20% dos convidados, o que não aconteceu. Foram a festa trezentos e trinta convidados, ou seja, não só não faltaram os 20%, como vieram 10% a mais! 

Mas quer saber de uma coisa? A-do-rei! Se não tivesse feito a festa, não teria me arrependido, pois não conheceria a delícia que foi. A verdade é que se tornou um dos dias mais felizes da minha vida e essa memória me emociona até hoje. Aprendi a importância dos rituais de passagem e como uma felicidade se potencializa quando dividida com pessoas queridas. 

A partir daí, sempre que possível, comemoramos o dia com uma festa.  

Esse ano, por não gostar do número 12, resolvi contratacar a urucubaca com muita energia e pensamento positivo. O tema da festa é branco, inspirado no Ano Novo. Serviremos bebidas brancas, com destaque para a Cava, espumante espanhol. A maior parte das comidinhas incluem a cor branca e um toque afrodisíaco. O legal é que dessa vez Luiz me ajudou a fazer a comida da festa, o que acabou dando mais significado ainda. 

E assim celebramos doze anos, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença. O futuro, quem pode saber? Sei do que passou e já foi com dinheiro e sem dinheiro, com emprego e sem emprego, com casa e sem casa, sabe-se lá em que país, com amigos reais e virtuais, com um felino a tiracolo, discutindo nos caminhos, mas sempre chegando juntos aos lugares. Em todos esses dias, felizes ou não, dividimos a mesma cama. E o frio ou o calor da noite se encarregou em colocar a vida sob a real perspectiva e os problemas do seu devido tamanho.  

Não tenho paciência para ver novelas e reclamo dos previsíveis filmes americanos, mas a verdade é que gosto de seus finais piegas e onde tudo dá certo. Gosto das novelas que terminam mostrando um casamento que será feliz para sempre, e ainda me arrepio no fácil final clássico de filme americano, quando o mocinho estende a mão e convida a protagonista para dançar. E que assim seja!

The end. 

106 – Afinal, e como foi a festa?

Ótima festa de aniversário de casamento! Tudo bem que minha opinião é suspeita, mas me diverti muitíssimo e espero que nossos convidados também. Estávamos em dezoito pessoas e, como sempre, nossos animados amigos levantam o astral de qualquer reunião. 

Dessa vez, não tivemos convidados espanhóis, pois aqui foi um fim de semana que imenda em feriado, e quase todos viajaram para as fallas, em Valência. Por isso, até ficamos na dúvida em fazer a tal festa com o medo que não houvesse ninguém na cidade. Mas no fim tudo deu certo. 

Para os gulosos e curiosos em relação à comida, servimos uma série de canapés que Luiz e eu inventamos. Fizemos de camembert cremoso, ovo de codorna e caviar; emmental cremoso com geléia de frutas vermelhas e nozes; anchovas com cenoura; e queijo, ovo de codorna e anchovas. Além disso, fiz uns enroladinhos de salmão defumado com queijo camembert, amarradinhos com cebolinha; damascos recheados de creme de yogurt e amendoin; tâmaras recheadas com camembert cremoso e nozes; blinis de peixes defumados; salpicão de frango; e salada de cogumelos ao armagnac. Um casal de amigos trouxe umas empanadas de carne e de milho. Tudo iluminado com velas e regado a muita cava e vinho branco. 

Eu já gosto de uma produção! Gasto um certo tempo planejando tudo e pensando nos detalhes. Assim, meu trabalho é todo antes, durante a festa me divirto como uma visita. E a verdade é que nem o trabalho que tenho antes me incomoda. Curto ficar imaginando quem gosta do que, como deixar a casa mais bonita e funcional, do que as pessoas vão precisar, que música combina com o clima etc. Dessa maneira, posso aproveitar a presença das pessoas e não ficar como uma louca de um lado para o outro apagando incêndios. E aproveitei! 

Acho que incomodamos um pouco os vizinhos com o som, mas considerando que vamos mudar daqui mesmo, paciência! Além do mais era sábado e até agora ninguém reclamou. Deu até para dançarmos um pouco, ao som da Madonna e da Fernanda Abreu.

Enfim, acho que entramos com o pé direito na nossa adolescência matrimonial. E como tudo passou tão rápido! Mas, segundo a sabedoria popular, passa rápido quando a gente se diverte…   

107 – Renovar a porcaria da identidade

Pelo título da crônica, acho que dá para perceber a irritação que isso me provoca! 

Parece que foi ontem, mas já faz um ano que estamos aqui e isso quer dizer que é hora de renovar meu NIE, a carteira de identidade espanhola. Funciona da seguinte maneira, a primeira permissão de residência é válida por um ano, a segunda por mais dois anos, a terceira por mais dois anos também e, completando esses cinco anos, você já pode ter a carteira definitiva. Quer dizer, pelo menos em teoria, porque sempre descobrimos alguma novidade no caminho, mas em princípio é assim. Em cada uma dessas etapas, você passa por todo um processo super burocrático para ter seu visto de residência novamente aprovado e renovar seu NIE. 

Passamos por um processo similar duas vezes nos EUA e agora estamos na segunda vez aqui na Espanha. Isso quer dizer que, em um prazo de dois anos, tive que provar que eu sou eu mesma quatro vezes! Pois que desculpem meu francês, mas é foda! E nessas horas só mesmo um bom palavrão para desabafar. 

E como nada chega sozinho, veio junto com nossa próxima mudança de casa e com o início da pós-graduação em arte contemporânea. Muito bem, com a mudança, por mais que esteja acostumada e tenha atalhos muito convenientes, a verdade é que sempre me tira um pouco o chão e me força a uma certa reconstrução. O curso, além de estar me consumindo tempo e esforço, tem me feito questionar todos os dias se sou mesmo uma artista, se estou no caminho certo. Tudo isso aliado à troca de “identidade” e a necessidade de me provar o tempo todo é um prato cheio para loucura!  

Não enlouqueci ainda, ou pelo menos não totalmente, mas ando com os nervos a flor da pele. E já caí umas duas vezes no choro por pura exaustão, nem consigo me lembrar exatamente o motivo. Daqueles choros que é por nada e por tudo ao mesmo tempo. Mas a verdade é que achei bom, porque a calma e a segurança que tenho levado os problemas ultimamente não é normal, mais parecia calmaria antes da tempestade. Melhor que saia em pequenos desabafos antes que pule no pescoço de alguém! 

Por outro lado, também há algumas possibilidades positivas. Nessa minha primeira permissão de residência, não podia trabalhar no país, meu visto era atrelado totalmente ao do Luiz. Nos EUA era a mesma coisa, até pior porque não havia a chance de mudar essa situação. Aparentemente, porque certeza já não tenho de nada, essa nova permissão de residência para os próximos dois anos me dará o direito a trabalhar. E isso faz toda diferença do mundo. É uma linhazinha escrita no meu NIE permitindo uma atividade remunerada, nem sei se terei emprego, mas isso ajudaria muito a me sentir uma cidadã e não um apêndice.

Enfim, dias melhores virão! Não estou pessimista, só cansada mesmo. De qualquer forma, pelo menos chegou a primavera e já vejo os brotinhos verdes nas árvores que ainda parecem meio mortas. Pensando melhor, agora parecem meio vivas, e isso também faz muita diferença. 

108 – A super poderosa primavera

Dia 21 de março, oficialmente, iniciou a primavera. É verdade que o inverno está fazendo a maior força para permanecer um pouco mais, para a alegria do Luiz que adora o frio. 

Na semana retrasada até deu para sair uns dois dias de camiseta e foi uma delícia sentir o vento fresco na pele e um calorzinho gostoso, que nem fazia suar. Mas logo depois entrou uma frente fria novamente que ainda se prolonga e que torço para acabar logo.  

Tem também uma chuvinha fina meio chata, mas fundamental, pois ano passado foi muito seco e aprendi a valorizar mais a água. Infelizmente, meu cabelo não concorda com esse ponto de vista e sou obrigada a andar de casaco de capuz, já que não tenho paciência para carregar guarda-chuva. Bem feito para mim, que sempre digo que se uma pessoa tem mais de doze anos fica ridícula com casaco de capuz, mas convenhamos, na chuva é realmente muito prático. 

O que importa é que a primavera está aí, é inegável! Pode até esfriar um pouco, mas a luz é outra, o astral é outro. O dias estão, pouco a pouco, se esticando e já anoitece mais tarde. Adoro esses dias compridos que espantam fantasmas! 

Encontramos nosso novo apartamento e, se tudo der certo, mudaremos no dia 06 de abril. Olha as coincidências outra vez! Além de ser o dia do aniversário do meu irmão, o que me facilita para lembrar da data, foi exatamente o dia que chegamos em Madri. Mudaremos no dia que completaremos um ano de vida aqui. A propósito, será meu trigésimo primeiro endereço. 

E o que o novo apartamento tem com a primavera? Ele tem uma varanda bem pequenininha, mas que posso encher de flores e plantas. E mal posso esperar para fazê-lo. Além de duas janelas com floreiras, sendo uma na cozinha, na qual quero plantar ervas para usar na comida. Isso sem falar no Jack que deve estar louco por uma brisa fresca e um solzinho ao ar livre.

Acho que vou gostar de lá, depois eu conto. 

109 – A burocracia espanhola

Aos que pensam que só no Brasil há essa “burrocracia” absurda, vou logo avisando, eles tiveram professores! Entre eles, seguramente os espanhóis! 

A última que nos aprontaram é impagável! Em função da renovação da nossa documentação e por meu visto ser atrelado ao do Luiz, precisamos comprovar que somos casados. Até aí, tudo normal. Na primeira vez que entramos com o processo, entre os milhões de documentos exigidos, apresentamos a certidão de casamento, devidamente homologada pelo ministério das relações exteriores e o consulado espanhol no Brasil. Muito bem, agora além desse documento, precisamos apresentar uma declaração juramentada que afirme algo como “sim, sim, continuamos casados!”. A certidão de casamento não basta! 

E claro que isso não chega assim tão explicado, não é mesmo? Primeiro nos pediram para solicitar esse documento no consulado brasileiro aqui em Madri. Depois de perder uma manhã na fila do consulado, eles me informaram que não dão esse certificado. Daí consultamos a advogada e perguntamos se não poderíamos fazer uma declaração no notario (cartório) e anexá-la à certidão de casamento. Ela confirmou e lá fomos nós catar o tal do notario que fez a declaração, mas levou três dias! Um dia fomos até lá solicitá-la, no outro dia voltamos para assinar os papéis e obviamente havia um erro de ortografia, e portanto nada nos foi entregue por causa de uma porcaria de um “n” a menos.  Finalmente pudemos retirar o documento no terceiro dia.  

E isso é só um dos documentos a serem apresentados. Acho que já deu para cansar só de ouvir e nem vou contar dos outros!

Mas essa da gente ter que apresentar uma certidão anexada a um certificado que confirme a mesma informação da certidão é o cúmulo, vai? Arrego! 

110 – Música boa outra vez, nem acredito!

Encontramos outro lugar para bater cartão na noite madrileña. Foi indicado por um casal de amigos brasileiros que gostamos muito.  

É verdade que o nome nos foi dado como “el jungo”, “el jungle” ou algo assim, em frente à estação Alonso Martinez. Foi divertido ouvir o Luiz pronunciar esses nomes com vários sotaques diferentes para o motorista de taxi que o escutava como quem escutava grego. No fim chegamos e o nome é “El Junco”, pronunciado el runco. 

É um bar com música ao vivo, normalmente jazz ou algo do gênero. Após o show, entra o DJ com repertório variado, que inclui músicas brasileiras, algumas que nunca ouvi antes, mas me soam familiares. O lugar tem um jeitão underground com o público meio alternativo, apesar de se encontrar quase todas as tribos. Como todos os bons lugares de madri é esfumaçadérrimo, mas isso não tem como fugir. O jeito é tomar um whiskão, soltar a franga e relaxar. 

E o principal: a música é realmente ótima! Sei que parece exagero, mas encontrar boa música na noite aqui não é tarefa simples. Eu já abstraí, como já contei antes, danço e canto as tais músicas basura amarradona, porém não resta dúvida que o ouvido continua agradecendo algo de qualidade. 

O DJ nem sempre é o mesmo, mas todos são bons, apesar de serem meio estranhos. Da última vez, juro que o cidadão tinha a maior cara de açougueiro! Passei a chamá-lo de “the butcher”. Nunca iria acreditar se o conhecesse durante o dia e ele me dissesse que era DJ, no máximo seria um padeiro portuga, com aquelas costeletas à moda antiga. 

O importante é que quando vamos ao El Junco estamos acompanhados de amigos legais e acho que isso também influencia muito. Tem vezes que chego super cansada, achando que não vou dar conta, daí bebo um pouquinho, converso um pouquinho e quando percebo estou alucinada dançando até de manhã. Foi de lá que saímos uma vez famintos e desesperados por um hamburguer. Isso é uma realidade em Madri, os lugares para dançar nunca servem absolutamente nada para comer, só bebida. 

Outra vantagem do lugar é que é razoavelmente perto de casa. Dá para caminhar na volta quando não achamos taxi ou o metrô ainda não voltou a funcionar. Acho até bom vir pelo caminho tomando um ar fresco. Quer dizer, eu e o casal de amigos que costuma voltar conosco, porque Luiz costuma reclamar que é longe.

No dia seguinte, sempre tenho um pouco de ressaca de cigarro alheio e tenho que por a roupa para lavar correndo. Mas quer saber, também sempre acho que valeu à pena.  

111 – A crônica que deveria ter censurado

Nesse momento, se não escrevo, explodo. E nem me resta mais a feliz alternativa de fingir que nada posso fazer. É difícil sobreviver ao encontro com o real, e por isso já passei algumas vezes. 

Há algum tempo atrás vi o filme “Matrix” e me pareceu bom, mas ao mesmo tempo comercial demais. Depois, pouco a pouco, você vai se abstraindo dos efeitos especiais e do romance que nada tem a ver com o conceito da obra, é uma mera distração. Quem sabe um disfarce para possibilitar o acesso à toda aquela informação. E digo isso porque cada vez mais tenho a sensação que me desconectaram ou desconectei a tomada da cabeça. E o que me pareceu um momento de lucidez e uma grande vantagem, tem se transformado em meu inferno! A realidade às vezes parece insuportável. 

Meu refúgio quase seguro, a arte, tem se mostrado mais importante no discurso que na prática. Na realidade, se parece mais e mais ao mesmo mundo de negócios que conheço bem e que precisei renegar para prosseguir. E que ingenuidade a minha em crer que haveria um lugar diferente no mesmo espaço. O único espaço que posso idealizar é minha cabeça, mas aparentemente nem isso posso mais.  

Como o poder vai se concentrando na mão de quem controla conceitos corretos, os conecta com um discurso coerente e nos impõe goela a baixo. Na maior parte das vezes, isso nem é percebido, pois o que analisamos são os fragmentos de verdade e não o resultado dessa conexão. Simplesmente acreditamos que várias pequenas verdades juntas se transformam naturalmente em uma verdade maior. Estamos perdendo a capacidade de ver a vida real de maneira ampla. O discurso é muito mais razoável e digerível.  

É muito mais fácil viver entre o imaginário e o simbólico, na verdade, é necessário. Mas onde fazer o corte do que realmente sou e do que quero ser? 

Cassilda! É essa crise de identidade que vira e mexe vem tirando meu chão. Lá vem minha próxima crise existencial. Estava demorando.

112 – A mudança para o apartamento da Calle Montesa

Com a cabeça e a casa viradas pelo avesso, um dia antes da mudança achei que ia surtar! Para complicar um pouco mais, ainda foi o dia de apresentar meu trabalho na pós-graduação, o que em outras palavras é o mesmo que me apresentar. Mais uma vez tendo que provar quem sou e esperar a aceitação, quando na verdade estava com vontade de mandar tudo às favas. Mais uma vez tendo que me reinventar e me reconstruir. Enfim, sobrevivi. 

Em casa, Luiz me puxou para conversar e finalmente consegui desabafar um pouco e ver as coisas com mais clareza. Acho que meus problemas são reais, mas estavam mal dimensionados, precisei da ajuda dele para colocá-los no seu devido tamanho antes de começar a resolvê-los. Além do mais, é sempre muito bom saber que tenho um super parceiro ao meu lado. 

No dia seguinte, tudo começou a mudar. Literalmente. 

Contratamos uma empresa de mudanças que chegou pontual às 8:30 da matina. Eles sempre entram como furacões e encaixotam sua vida em minutos. Estou acostumada, isso não me incomoda, já sei tudo que preciso preparar com antecedência para me facilitar depois na arrumação. Aqui, normalmente são imigrantes que fazem o serviço, polacos, romenos, equatorianos… Um deles tinha cara de mafioso russo, dava medo, mas os outros todos eram simpáticos. O polaco estava doido para conversar sobre o Brasil, havia visto um programa na TV e tinha muita curiosidade sobre a cachaça. Aliás, horas mais tarde, quando a mudança terminou, demos a ele uma garrafa que foi retribuída com um sorriso nos indicando que valeu muito mais que a gorjeta. A propósito, gorjeta aqui chama propina. 

Dessa vez, nossa mudança não foi tirada pela janela. Os móveis foram pelas escadas e as caixas pelos mínimos elevadores, ridiculamente pequenos. Mas o pior, ou melhor, é que eles fazem tudo rápido e sem reclamar, também estão acostumados.  

Deixamos nossa cama de casal no apartamento antigo, era uma cama americana muito grande para os padrões europeus e aproveitamos a mudança como pretexto para comprar uma nova. 

Com esse povo todo em casa, Luiz recebeu uma ligação com ótimas notícias do seu trabalho. A empresa onde trabalha foi comprada há alguns meses atrás e essa é sempre uma situação preocupante, pois a gente se sente meio vulnerável. Dessa vez, tanto ele quanto eu, tivemos a intuição que ele deveria ficar e ver o que aconteceria. Nesse dia da mudança ele soube que não só teria emprego, como estará responsável por outras regiões. Ele merece, trabalha para burro e é super competente. Claro que isso deu uma tremenda levantada no astral e ajudou a entrar com o pé direito na nova fase. 

Aqui, as empresas de mudança reservam na prefeitura as vagas na frente do prédio para poderem realizar seu trabalho. Acontece que tem sempre um engraçadinho que resolve se fazer de desentendido e estacionar assim mesmo. Na outra mudança aconteceu isso e nessa não foi diferente. De manhã cedo, no primeiro apartamento, não houve nenhum problema, mas no meio do dia, trazendo os móveis para cá, algum esperto tirou a faixa de proteção das vagas e estavam todas ocupadas. Perdeu-se quase duas horas para chamar a polícia, rebocar os carros e estacionar o caminhão para começar a descarregar. 

Nesse período, ligamos para meu irmão para desejar feliz aniversário. Dia 06 de abril, exatamente o dia em que chegamos na Espanha há um ano atrás. Mudamos no mesmíssimo dia. 

Por volta de 19:00 horas, estávamos no nosso novo lar… com 98 caixas de papelão e outra vez sem cama! Voltamos ao antigo apartamento para buscar o Jack e, logo na entrada, ao ver tudo vazio, senti que não era mais minha casa. Mesmo tendo sido feliz ali, não mantenho nenhum laço às coisas, era só um lugar por um ano. Que venham os próximos e que sejam felizes! 

Aqui, nosso felino gordo ficou perdidinho da Silva! Mudanças são difíceis para os animais. Mas como também temos prática nesse assunto, arrumamos rapidamente seus objetos de conforto e, aos poucos, ele foi cheirando tudo e se pondo mais à vontade. Ele gostou. No dia seguinte já passeava curioso pela casa. 

Mudamos estratégicamente um pouco antes da semana santa. Tive uma semana inteirinha de feriado da faculdade e, consequentemente, mais tempo para arrumar a casa. Consegui arrumar quase tudo. Durante o dia abria e arrumava as caixas e, à noite, Luiz levava aquele monte de lixo e papelão para baixo.  

Improvisei uma cama de casal no chão, usando os dois colchões do sofá cama de hóspedes. Ficou super aconchegante, com jeito japonês, o que acabou confirmando como seria nossa futura cama. 

Adorei o apartamento novo! É um duplex pequeno, mas muito charmoso e com muita luz. Sol em casa aqui é um luxo que eu e Jack estamos desfrutando com muito prazer. No andar de baixo ficam a sala, a cozinha, o quarto de hóspedes/escritório e um banheiro. No andar de cima, um mezanino, fica nosso quarto com outro banheiro. Tem uma varandinha onde já coloquei umas plantas, mas preciso arrumar melhor. As coisas do atelier ficaram bem apertadas embaixo da escada e talvez tenha que usar a mesa de jantar para trabalhar, nem tudo é perfeito, mas também não dá para reclamar. 

O chato é que a Internet está super improvisada, além de termos ficado sem ela alguns dias. E eu, uma super viciada na rede, tenho que escrever e checar minhas mensagens toda torta em um laptop na sala, o que ainda é melhor que buscar um lugar público. Os serviços aqui são uma bela bosta, tudo demora.

Foi uma semana trabalhosa, entretanto tranquila. Arrumar a casa me ajuda a organizar as idéias. Acho que sou mesmo pião de obra, viu?  

113 – Picnic no Retiro

No sábado, dois dias depois da mudança, ainda tínhamos algumas coisas pessoais no antigo apartamento para buscar. Para fazer tudo em uma única viagem, pedimos ajuda de um casal de amigos que mora perto e estamos sempre juntos.  

Como já havia conseguido arrumar a cozinha, fizemos a inauguração extra-oficial com eles, abrindo uma garrafa de cava para comemorar. Claro, no meio de um monte de caixas de papelão! 

Eles sugeriram que, no dia seguinte, domingão, a gente fizesse um picnic no parque do Retiro. Adorei, queria fazer isso antes, só estava esperando o tempo melhorar. E o tempo colaborou.  

O bom de morar em um país estrangeiro é que a gente tem coragem de fazer algumas coisas que morreria de vergonha no nosso próprio país. Uma boa “farofa”, por exemplo. Se bem que, cá entre nós, foi uma farofa razoavelmente chic. Bem, quer dizer, meio chic, porque começou por chegarmos ao parque com um carrinho de feira para levar as coisas. Idéia do meu prático e desencanado marido. Imagina se a gente toparia pagar o mico de chegar no Brasil para um picnic, trazendo a comida e a bebida em um carrinho de feira? Nunca!  

Escolhemos ficar perto do laguinho, segundo minha amiga, para termos uma vista do “mar”. Ela levou uma toalha enorme e umas cangas, onde nos sentamos e colocamos toda a comida. Sabe que ficou bonito? Levei vinho branco, mas por precaução coloquei em uma garrafa térmica para disfarçar. Depois de burra velha fico me preocupando com essas besteiras! 

O dia estava simplesmente maravilhoso e agradável! Fazia muito tempo que não relaxava tanto e tenho certeza que foi o sentimento geral. Adorei ver as árvores verdes novamente e ouvir os tambores no ar. Sentia saudade desse som tribal. 

Um pouco depois que estávamos lá, chegou um outro casal de amigos dos nossos amigos. E, logo em seguida, esses amigos dos amigos chamaram outro casal. No fim da história, estávamos em quatro casais largados na grama curtindo a primavera. 

Muito bem, os dois últimos casais acabaram trazendo mais vinho, apesar da gente não ter certeza se era permitido álcool ou garrafas no parque. Em volta da gente foram se juntando outros grupos, alguns só para tomar sol, outros bebendo alguma coisa, jogando malabares, jogando capoeira, brincando com o cachorro ou simplesmente morgando na grama. 

Um dos amigos viu um grupo de policiais chegando e, na dúvida, achou que era melhor escondermos as garrafas. Não deu outra, os policiais foram direto no grupo da frente porque tinham garrafas de cerveja. Foram educados com eles, mas pediram documentação e tudo. Era um grupo de brasileiros, vimos seus passaportes verdes.

Tiveram que se desfazer da cerveja e das garrafas e ficou um clima um pouco tenso, mas não deu maiores problemas. 

Daí ficamos nós, oito adultos caretas que não tinham feito absolutamente nada demais, tentando se comportar naturalmente para os policiais não virem checar nossa farofa. Para ser sincera, não fiquei preocupada, até achei meio divertido. A verdade é que havia três advogados entre nossos amigos com a consciência pesada porque podiam estar cometendo algo fora da lei. No fim das contas, os policiais nem nos deram bola. Claro, todo mundo com a maior cara de CDF, imagina!  

Quando os policiais se foram, nos vangloriamos da nossa façanha meio ilegal. E como marginais perigosíssimos que somos, recolhemos todo lixo antes de ir embora, deixando o lugar impecável.

Repetiremos com certeza, dessa vez com o vinho em garrafas térmicas! Mas definitivamente, sem esquecer o carrinho de feira e quem sabe até leve meu tambor. 

114 – As compras

Durante o feriado da semana santa estava em plena crise alérgica. É que minha resistência baixou e não sei se peguei gripe junto ou foi só alergia, sei lá, sei que passei mal para burro! 

Mesmo assim, a idéia de arrumar a casa nova foi me animando e bem ou mal, levantava e fazia as coisas do mesmo jeito. Ao longo da semana fui melhorando. 

Num desses dias, difíceis de levantar, me ligou uma amiga me chamando para dar uma volta e fazer  umas compritas. Como estava meio enjoada, chamei ela para comer lá em casa mesmo e aproveitar para conhecer o apartamento novo. E ela veio. 

Fomos conversando e fui melhorando. Cheguei a conclusão que um arzinho fresco me faria bem. A verdade é que achei que ela queria companhia para sair um pouco e tentei me animar. E acabou que foi bom para mim, acho que me faltava um pouco de consumismo na veia. 

Não sou uma pessoa naturalmente consumista. Por isso, quando resolvo comprar alguma coisa também não me sinto culpada nem preciso ficar me controlando. Mas quando cheguei em Madri e quis sair para comprar algumas roupas senti uma coisa engraçada, me faltava aquela “amiga de compras”. Sabe aquela amiga que sai com você para bater perna, daí você vê alguma coisa que gostou e diz: puxa, queria experimentar essa blusa, mas estou com uma preguiça… E ela te responde: ah, mas você precisa experimentar, olha que linda… e o preço está ótimo! 

Pois se me faltava a amiga de compras, não faltou mais. Meia dúzia de blusinhas lindas e de ótimo preço depois, estava com o humor e a saúde bem melhores. E os homens ainda dizem que é difícil fazer uma mulher feliz! Que bobagem, é tão fácil!

115 – Mantendo a tradição

Exatamente como no endereço anterior, uma semana após a nossa mudança, recebemos os primeiros hóspedes, um casal de amigos que mora na Inglaterra. Dessa vez, até que foi mais tranquilo, pois o apartamento já estava razoavelmente arrumado. Quer dizer, para mim, tanto faz, não me incomodo em receber as pessoas com a casa cheia de caixas de papelão, mas acredito que para os nossos hóspedes deva ser mais confortável chegar em uma casa arrumada. 

O único problema, é que estávamos usando os colchões do sofá-cama como nossa cama de casal. Logo, tivemos que pedir emprestado dois colchonetes para eles dormirem. Se no apartamento passado, tivemos que carregar um sofá-cama na cabeça para ter onde dormir, dessa vez, apenas foi necessário que Luiz carregasse dois colchonetes pela rua para nossas visitas. No fim, acho que deu certo. Também foi bom que a gente fez logo o test drive dos hóspedes para ver o que precisávamos acertar. No início de maio chega o próximo casal visitante, do Brasil. Se eles tiverem sorte, terá chegado nossa cama, comprada na semana passada, e eles terão up grade na hospedagem. 

Compramos uma cama de estilo japonês, ou seja, aquele tatami baixinho com o futon em cima. Nos deram um prazo de aproximadamente quinze dias para entregá-la, espero que se cumpra, pois estou doida para deixar o quarto arrumado também. Combina muito com o espaço, pois dormimos no mezanino que possui uma parte do teto rebaixada. Desse modo, a cama se encaixa quase como um ninho e fica muito aconchegante. Ainda por cima, tem uma janela no teto e adoro acordar olhando o céu.  

Consegui instalar uma tela protetora bem discreta na varandinha, assim meu felino gordo pode tomar seu solzinho e fico tranquila. O gato mais mimado do mundo está adorando o apartamento novo, encontrou vários esconderijos e fica para cima e para baixo na escada. 

Também consegui decorar o número novo de telefone e quase não me lembro mais do antigo. Eu mesma me surpreendo com a velocidade em que troco de canal.  

Enfim, as coisas vão seguindo seu curso. Agora falta algumas festinhas para assegurar a boa energia e o alto astral do recinto. Estou doida para fazer a inauguração!

116 – A vida pós feriado

A volta às aulas foi mais tranquila do que imaginei. Acredito que a semana de férias recarregou minhas baterias e revi as prioridades. Muita água ainda vai rolar, mas é muito bom quando a gente consegue ir passo a passo, tentando não se atropelar.  

O mundo ainda me parece difícil, mas não impossível. Acho que isso quer dizer que meu otimisto está tentando se recuperar. De qualquer maneira, quem é o louco que está sempre triste ou sempre feliz? Todos temos lados bons e maus e experimentamos altos e baixos, por tanto, no mínimo, posso me identificar com a raça humana e isso já é um começo. 

Ainda é cedo para dizer, mas os novos professores me agradaram e comecei a sentir um interesse maior pelas aulas. Era a sensação que esperava ter no início do curso e não tive. Dessa vez, não precisei fazer tanta força para gostar. Começo a acreditar que continuo artista, mas me falta a resposta do porquê. É que esse porquê muda sempre e, às vezes, custo a entender que preciso perguntar outra vez. Ontem entendi, preciso de novas respostas: por que? Para que?

117 – Meus amigos de Brasília

No fim de 2004, ainda morando em Atlanta, comecei a encontrar, pela internet, alguns amigos do passado. Navegando pelo orkut, encontrei o colégio onde estudei mais tempo, a Escola Paroquial Santo Antônio, em Brasília. É difícil acreditar, mas eu, uma ateísta convicta, estudei boa parte da minha vida em colégios ou faculdades católicas. 

Nesse colégio, estudei da primeira à oitava série, de 1976 a 1983. Acredito que boa parte dos meus valores foram aprendidos ou fortalecidos ali, mas só agora posso ter a consciência de como estou tão igual em muitos pontos e tão diferente em outros. 

Mas voltando à história, tudo começou achando uns dois ou três ex-alunos pelo orkut. A conversa e o interesse foram crescendo e um desses ex-alunos teve a brilhante idéia de fazer um grupo de discussão só nosso no yahoo. O que acontece é que sempre tem alguém que manteve contato com alguém, que por sua vez manteve contato com outros e assim por diante. Resultado, em um ano e pouco que esse reencontro iniciou, já somos um grupo de quase cinqüenta ex-alunos. 

A grande maioria permanece em Brasília, mas muitos, como eu, se espalharam pelo Brasil ou pelo mundo. Não importa, para mim, são meus amigos de Brasília. É a memória e a referência que tenho. E só há muito pouco tempo entendi como é importante para mim ter essa memória e esses amigos. 

Acho que devido a tantas mudanças, não tinha amigos de infância. Tenho muitos amigos queridos, mas tinha um pouco de vontade, meio dissimulada, de apresentar alguém como: “esse é fulano, a gente se conhece desde nem me lembro quando…estudamos juntos…” 

Na verdade, não sei se a culpa é das mudanças, muita gente vive na mesma cidade a vida toda e também perde os contatos de infância. Mas enfim, essa é a minha desculpa. 

De qualquer forma, para mim tem sido muito importante esse resgate do passado. É como uma prova arqueológica que existi, pois deixei alguma impressão. Ou melhor, existimos, pois todos eles também haviam me deixado impressões que, pouco a pouco, vão me voltando à memória. 

A velocidade com que nos unimos me impressionou. É difícil explicar a cumplicidade que surgiu muito rapidamente entre boa parte desses ex-alunos. Alguns de nós já éramos amigos no colégio, mas entre outros, existia muito pouco contato e até mesmo algumas desavenças eventuais, que hoje o passado transformou em coisa de criança. Isso é muito louco, pois com a maior parte só falo via internet, e mesmo assim, fico feliz quando eles estão felizes, sofro quando eles tem problemas e tenho orgulho do que eles realizam. E tenho muita saudade de quem não tive saudade nenhuma por tantos anos. 

No último fim de semana, 15 de abril de 2006, foi o encontro de 23 anos de formados, em Brasília. Não fui, mas fiquei babando daqui. Eles se encontraram no nosso antigo colégio, tiveram o privilégio de entrar nas salas e procurar as carteiras (mesas de estudantes) onde sentavam. Tentei me lembrar onde me sentava, mas nem sempre era no mesmo lugar. Depois eles seguiram para a chácara de uma das ex-alunas e fizeram uma festa, com direito a assistir o filme da nossa formatura.  

Não pude estar presente, mas pensei nisso o dia todo. Fiquei imaginando quem ia, o que iria falar etc. E quando as fotos chegaram, quase podia me imaginar nelas. O encontro dos 25 anos já foi cogitado e nesse vou nem que vaca tussa!

Somos uma tribo. Temos o poder de voltar no tempo, resolver o passado. Seguimos um pacto não negociado, mas totalmente subentendido: decidimos que somos amigos, para o que der e vier, e pronto! 

118 – Dia da preguiça, do granizo e da janela

Sabadão de preguiça, parecia até domingo. Se já é complicado levantar quando tenho o que fazer, imagina sem nenhum compromisso e com aquele céu super nublado. 

Nem era resquício da balada, que adiamos. Um casal veio jantar conosco na noite anterior, com a promessa de sairmos logo em seguida para encontrar outros amigos na Posada de las ánimas. Duas garrafas de um delicioso grand cru depois e um jantar meio improvisado, que modéstia às favas estava bem gostoso, claro que baixou a lombeira geral. A balada podia esperar a próxima noite livre. 

No dia seguinte, recebi a mordomia do café na cama, o luxo que mais adoro no planeta! Daí é que não dava vontade de sair mesmo. 

Ando caseira. Acho que estou curtindo o apartamento novo, sei lá, talvez sejam os dias chuvosos. Mas está sendo bom para descansar um pouco. Tomar um vinhozinho com Luiz ou com alguns amigos em casa, ou na casa deles, tem me parecido um programão. 

Enfim, quando tomei coragem de por o nariz na tela do computador, comecei a escutar um barulho diferente de chuva, barulho de umas pedrinhas. Luiz falou do andar de cima, está chovendo granizo!  

Fomos para a janela da sala por curiosidade e a chuva de granizos engrossou. Por alguns segundos, a rua ficou branquinha como se fosse neve. Fotografei, mas não aparece bem as pedrinhas de gelo. 

Quando levantei a vista, percebi que tinha gente por praticamente todas as janelas. Meu impulso foi de me afastar um pouco do vidro, pois estava de pijamas. Depois notei que todos estavam de pijamas, iguais a mim. Ou seja, éramos um bando de preguiçosos, morgando em casa, curiosos na janela. 

No prédio da frente, alguns andares abaixo, havia um casal de crianças, daquelas com olhar de moleque, que não sabiam se olhavam a chuva ou as janelas. Acenei para elas, que se acabaram de rir acenando para mim de volta. Por que criança acha tão divertido dar tchau para estranhos? 

Em poucos minutos, a chuva acabou e o céu abriu com sol. Parecia outro dia. Saímos das janelas e da farra coletiva, e cada um voltou para sua própria preguiça. 

119 – Baladeira que se preze…

Muito bem, disse que andava caseira, não que era caseira, certo? Porque baladeira que se preze cai na tentação na primeira oportunidade.

No mesmo sábado do granizo e da preguiça, fomos jantar com um casal de amigos brasileiros, o que em princípio seria um programinha light.  Jantar super gostoso, vinhosinho que adoro, bom papo, boa música e tal. Por volta da meia noite nos despedimos e seguimos em direção à casa.

No taxi, recados no celular de Luiz para passarmos na casa de outro casal de amigos que moram perto da gente. Por que não? Partimos nós para a segunda etapa da noite. Chegamos lá, onde nossos amigos brasileiros recebiam outros amigos portugueses e chilenos. Nesse momento, todo o vinho já tinha sido devidamente evaporado e uma garrafa de whisky, que iniciou a noite cheia, agonizava seus últimos goles. 

O papo foi empolgando, a música aumentando… e, aparentemente, um vizinho se irritando. Umas duas e meia da madrugada, bate na porta a polícia. Achei um certo exagero, realmente estávamos fazendo barulho, mas com certeza se alguém houvesse se manifestado ou pedido, baixaríamos o tom na mesma hora, foi distração mesmo. Enfim, os policiais foram educados e francamente, nem cheguei a ficar nervosa, quem gosta de uma boa farra e nunca vivenciou essa cena da polícia batendo na porta? Estou ficando experiente, ou em outras palavras, muito cara-de-pau.  

A cena não deixou de ser um pouco engraçada. Toca a campanhia, minha amiga “lararilarará” atende o interfone e ninguém responde. Ela vira para mim e diz algo como, é esse pessoal tocando embaixo para deixar propaganda no correio. E eu, mas às duas da manhã? Na dúvida, resolvi olhar pelo olho mágico na porta. Eram dois homens do tamanho de um armário, com uniforme preto de faixa amarela no peito: ops! Voltei para ela e disse baixo, é a polícia, abre que vou avisar o povo. Ela achou que eu estivesse brincando, mas mesmo assim tentou parecer o mais careta possível e foi abrir a porta. Enquanto ia avisar os meninos para eles já irem baixando o som, só escutava minha amiga falando para os guardas: adelante! Eles não queriam entrar, só pedir para baixar o som. De qualquer maneira, a festa acabou.  

Ou melhor, acabou essa etapa, pois como contei diversas vezes, a noite em Madri vai crescendo, uma coisa emenda na outra e quando nos damos conta estamos franzindo a testa com o sol batendo no rosto.  

Bom, não chegamos a tanto, mas também não nos demos por vencidos e partimos todos para o “El Junco”, como já de costume. Três da matina e fila na porta, amo essa cidade! Até que a fila andou rápido, demos sorte porque, alguns minutos depois, a fila se multiplicou atrás da gente. Estávamos em um grupo de umas nove pessoas. 

Nessa noite, comandavam a música, um DJ parecido com o Lobão na fase cabelo comprido e outro com a maior pinta de CDF. Ambos inspiradíssimos, me acabei de dançar. Estava sentindo falta da minha aeróbica semanal.

Por mim, acho que seria um dos dias que só sairia de lá varrida e com as luzes acesas, mas no domingão tínhamos uma feijoada na casa de uma amiga e aí a briga é feia. A feijoada ganhou é claro, e fomos embora por volta das quatro e meia. Até chegar em casa, tomar banho, encinerar a roupa fedida a cigarro e deitar, eram quase cinco e meia. Fiz as contas de quanto tempo me restava de sono e torci para não acordar de ressaca no dia seguinte, afinal de contas, uma feijuca animal me aguardava! Dormi bem.