16 – Jantar de artistas

Toda primeira terça-feira do mês, comecei a participar de um jantar com artistas latino americanos.  Quer dizer, começou com essa regra, mas não é tão rígido assim, também vão alguns espanhóis, além dos maridos ou esposas artistas.

 

A idéia não é isolar ninguém, mas a verdade é que quando você vem de fora fica meio perdido, e é um bom pretexto para encontrar gente que está ou esteve em uma situação parecida à sua. Todos nós questionamos na veia as próprias identidades culturais, elas nos batem na cara todos os dias. E de toda maneira, acho o trabalho do artista muito solitário, portanto é bom poder trocar idéias e experiências com outras pessoas. Acho uma forma interessante de ampliar a rede de contatos.

 

Enfim, cheguei indicada por outro amigo artista brasileiro e o primeiro encontro que fui, foi exatamente na semana da ARCO e um dia antes da inauguração da tal exposição onde fui curadora. Ou seja, estava super cansada e ocupada, nem fiquei até o fim do jantar.

 

Na segunda vez que fui convidada, estávamos de férias na Suíça. E a terceira vez foi ontem. Compareci.

 

Vou ser franca, estava na maior má vontade em ir, principalmente porque chegaria absolutamente sozinha, conhecendo pouca gente e só de vista. Meu único amigo brasileiro não ia. Estava ainda traumatizada com a ARCO, pensando se realmente devo seguir esse caminho.

 

Nesses momentos, me lembro do meu mentor artístico espiritual: Giacometti. Seu trabalho era um pouco sofrido, quase neurótico, uma vez lhe pergutaram porque ele expunha então, e ele respondeu: para mostrar que não tenho medo.

 

Nessas situações, quando me pergunto por que continuo? O que vou fazer lá? Por que não invento uma desculpa qualquer? É essa a resposta que me vem na cabeça, pois no mínimo, para mostrar que não tenho medo.

 

Tenho um tipo de disciplina mental que quando percebo estar fechada à alguma situação, respiro fundo e penso que posso tentar aceitar, recito meus mantras particulares e me disponho a aproveitar o melhor possível, de verdade e de coração aberto. Primeiro resmungo para burro, mas depois, pelo menos eu tento. Se fui convidada a qualquer coisa, deve haver algum motivo.

 

Na única vez que fui a esse jantar, havia sentado ao meu lado um artista que achei legal, sabia seu nome e me pareceu bem acessível. Ontem, logo que cheguei ao local marcado, o vi entrando alguns segundos na minha frente. Pensei, bom preságio, já tenho alguém para cumprimentar, conheço pelo menos uma pessoa. Pouco depois descobri que eu era a terceira a chegar, primeiro o organizador, que para alguns é um pouco intimidador, depois esse conhecido e em seguida euzinha. Foi bom, encarei logo a fera no começo e o tal organizador nem me pareceu tão intimidador assim, estava em uma situação parecida à minha, era de carne e osso e foi bem simpático.

 

Resolvi usar a estratégia mais velha e eficiente do mundo, sorri. Não foi difícil.

 

As pessoas foram chegando e fui fazendo novas amizades. Não dá para falar com todo mundo porque é uma mesa comprida, mas ao final, o grupo que estava na mesma área da mesa que eu, saiu para esticar um último drink. Imagina,  eu que nem queria ir, estava ali com novos amigos esticando a noite e me divertindo, típico. Foi ótimo!

 

É um alívio encontrar gente que compartilha angústias e dúvidas parecidas e assim mesmo insiste em buscar alternativas. A arte não vai acabar, assim como a vida também não. Nem falamos de arte o tempo inteiro.

 

Tenho planos de encontrar meus novos amigos, mas se não encontrar, tudo bem. Por uma noite lembrei que faço parte dessa raça de insanos e que as coisas chegam ao seu tempo.

 

Era uma pergunta natural a de quantos anos levávamos em Madri, de maneira que respondi várias vezes: três anos. Levo três anos aqui, três anos pode ser uma vida e três anos não é nada. Como de repente isso é só uma fração de tempo? Repetir isso tantas vezes me pareceu diminuir seu peso, sua intensidade.

 

Prova superada. Acho que estou onde deveria estar e ainda posso tanta coisa.

 

 

2 comentários em “16 – Jantar de artistas”

  1. Oi, Marlon! Que legal você por aqui! Viu só? Perdeu justo esse… heheheheh… Tem nada não, todo mês tem um.

    Besitos

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