6 – O melhor carnaval fora do Brasil

Finalmente, um carnaval do qual não posso reclamar, pelo contrário, faz tempo que não me divirto tanto. Ainda bem, porque depois foi tanta pauleira de trabalho que se estivesse de mau humor acho que teria matado uns três! Mas uma coisa de cada vez e vamos começar pela parte boa. 

O pré-carnaval já era um bom presságio e nos deixou em clima de festa e de saudade do Brasil, mas uma saudade gostosa, sem tristeza. Acho que ajudou muito estarmos em um grupo animado e também muito afim de se acabar na avenida. 

Sim, porque aqui não tem sambódromo, mas com boa vontade a gente improvisa. Houve um tipo de desfile de países latinos que saía do parque do Retiro em direção à Puerta de Alcala, passava pelo Paseo de Recoletos e finalizava na Plaza de Colón. É  um bom trecho, talvez uns 3 km.  

Pois, por que não? No sábado, nos encontramos no Kabocla, para aquecimento, e nos unimos ao bloco. Compramos algumas fantasias como, perucas, chifrinhos, instrumentos de brinquedo, máscaras, coisas simples e engraçadas. Saímos, aquele bando de fantasiados no metrô para o parque do Retiro.  

Claro que ninguém lembrou de marcar um ponto de encontro e foi absolutamente irritante conseguir juntar todo mundo outra vez em um só grupo. Pode dizer, só podia ser brasileiro, né? É verdade, éramos o bloco mais desorganizado de todos, porém também o mais simpático e que agitava o pessoal em volta. Era gente filmando, fotografando, um sucesso! Ainda bem que estávamos disfarçados, porque sabe-se lá onde fui aparecer de cabelo azul e chifrinho, bom, pior o Luiz que estava com uma peruca ruiva! 

Levamos cachaça, whisky, batidas, um festival etílico. Acho que fazia uns 5 graus e a gente suando a camisa. 

Agora a parte mais divertida, o bloco tinha uma pequena bateria, que até mandava bem na batucada, mas ninguém puxava os sambas, era só instrumental. Imagina, a gente com o grupo do coral, todo mundo louco para soltar a franga cantando e íamos só passear pela avenida? Nem a pau Juvenal! Saímos nós a puxar as músicas e o povo em volta acompanhando! Já posso acrescentar na listas de coisas-que-fiz-na-vida que puxei samba na avenida (ninguém precisa saber que avenida foi). Também não era a única que fazia isso, e essa é uma coisa legal nesse grupo de amigos, todo mundo topa tudo e incentiva, assim que cada um que lembrava de alguma música que se parecesse remotamente com o que estavam batucando, a gente acompanhava na maior euforia. Fizemos, na turma do fundão, a ala da velha guarda e, além de toda essa fofoca, íamos acenando para a multidão em volta. Nós tínhamos até público! 

Quando acabou o desfile, perto da minha casa, fomos rápido para fazer um intervalo biológico e encher as garrafinhas de bebida novamente. Outro detalhe, usamos o metrô para ganhar tempo, e obviamente, fomos cantando nos vagões. Ou seja, também posso dizer que já cantei no metrô de Madri, pena que ninguém deu nem uma moedinha para a gente, ainda que alguns turistas tirassem fotos.  

Seguimos de volta para o Kabocla, e acredito que bem um terço do bar era de gente conhecida, ou pelo assim me sentia, de maneira que parecia uma festa em família. Lá terminamos a noite, com várias histórias divertidas que só saberá quem ali esteve.  

No domingo, sosseguei o faixo, porque a semana prometia ser feroz e foi. Na quarta-feira de cinzas foi a inauguração da exposição que fui curadora e tudo aconteceu. Mas tudo bem, na sexta-feira, seguinte ao carnaval, tinha festa na Sala Caracol, do enterro dos ossos. Juro que estava só o pó e ameacei não ir. Luiz também com preguiça. Mas o pessoal é tão legal e tão animado, que não tive coragem de deixar passar. Demos uma descansadinha de nada e partimos para o golpe de misericórdia.  

Quem está na chuva é para se molhar, né não? Preciso garantir a minha fama de “a imparável”, como me chama Luiz. Então tá, caí no whiskão que insistia em brotar na minha frente, culpa da minha amiga Alcione que ria da minha cara dizendo, e isso porque a bichinha estava cansada!  

Resumo da ópera, até no palco a gente subiu para dançar, sério, que mico! É verdade que fui literalmente guinchada lá para cima, não queria subir nem morta, mas não tive alternativa. Eu, essa mulata globeleza, sambando no palco da Sala Caracol! Putz, grilo! 

Detalhe engraçado, antes disso, quando começou o show da batucada, a organizadora da festa agradeceu algumas presenças na casa. Entre os agradecimentos, a presença do Coral Dumbaiê no recinto! Ou seja, nosso modesto coral amador, é quase o mais ilustre desconhecido de Madri!  

Como se fosse pouco, de lá, seguimos para o El Junco, para finalizar à noite. Voltamos para casa caminhando. Foi o melhor carnaval que passei fora do Brasil, e melhor até que os de São Paulo. Luiz suspirando aliviado com aquela cara de até-que-enfim-essa-mulher-vai-sossegar!  

Chegamos em casa quase de manhã. Juro que no dia seguinte estava nova em folha, leve e feliz.

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