125 – O mural de fotos

Há bastante tempo, nem me lembro quando, mas ainda no Brasil, tínhamos um mural de fotos com amigos. Tentei ter fotos onde, pelo menos uma vez, todos os nossos amigos pudessem aparecer. Reuni também vários momentos especiais junto com Luiz, com nossas famílias e nossos gatos. 

Era divertido ver as pessoas chegando e se procurando no mural, e sempre se achavam. Na minha cabeça era uma forma de dizer que eram bem vindas, que faziam parte da nossa história. E funcionava para mim também, era um conforto lembrar que alguma coisa deveria ter feito certo para conhecer pessoas assim. Esse mural nos acompanhou pelo mundo e era de grande ajuda nos momentos de angústia, funcionou como um amuleto.  

Em Atlanta, onde fizemos muitos amigos, tiramos várias fotos com a intenção de completar o mural. Aqui em Madri, ocorreu o mesmo, outras fotos de mais amigos queridos, com lugar reservado na minha grande placa de cortiça. 

Entretanto, nenhuma foto foi adicionada. Sempre havia um motivo. Não havia baixado as fotos para o computador ainda, não tinha papel fotográfico, a impressora pifou… Até o dia em que não havia nenhuma desculpa e fui encarar meu painel que há algum tempo me incomodava e não entendia. Engraçado como, sem perceber,  fui mudando ele de lugar até ficar praticamente escondido em um corredor. 

Busquei explicações racionais. Devia ser porque havia amigos que se separaram, amigos que adoeceram, familiares que morreram, como era grande a minha cozinha, como estava magrinha, como gostava desse restaurante, dessa casa, dessa piscina e por aí vai. Mas a verdade mesmo é que meu mural de lembranças se transformou em um enorme mural de saudades. Demorava muito para que alguém se encontrasse nele, e quando se encontravam, também já não eram mais os mesmos, como não sou mais a mesma. 

Tive uma sensação quase indígena e primitiva, em que as fotos aprisionavam nossos espíritos e agora precisamos todos voar em outros patamares. Continuam queridos e continuam bem vindos, mas estavam fora de contexto. 

Pensei que esperto era meu gato, fotos e imagens de espelhos nada significam para ele porque não possuem cheiro.  

No meu ritual particular, desfiz o mural e guardei as fotos com o carinho do passado. Estamos agora todos livres para sermos o que quisermos. Talvez um dia construa um outro, com velhos e recentes amigos, mas com um significado diferente e fotos novas.

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